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Sisteminha Embrapa adaptado em Flores de Goiás

Sisteminha Embrapa adaptado em Flores de Goiás

Para a maioria das mais de 500 famílias do Projeto de Assentamento São Vicente (P. A. São Vicente), localizado cerca de 40 km depois da cidade de Flores de Goiás, em terra quente e , a paisagem semiárida torna tudo mais difícil nesta época do ano. Não para a família Caetano. Ali, como que quase por milagre, a mesa é farta, o cenário tem tinturas de verde, o clima refresca um pouco, o quintal se borda de movimento, e a vida, mesmo com seus perrengues, corre alegre, serena e feliz…

Karla e Flávio Caetano, ele lavrador, ela aprendiz de lavradora, professora, palestrante e estudante do curso de Licenciatura em no Campo – de Brasília (UnB), moram com os filhos adolescentes Ângela e Davi em uma casa bem simples, sem reboco e sem Rede Globo, no lote 26, na quadra 09 do Eixo 03 do P. A. São Vicente. Ali, depois da descoberta e da implantação do que chamam de “Sisteminha Embrapa Adaptado”, a família celebra um ano de mesa farta, com verdura orgânica e peixe fresco no tanque do quintal.

Junto com o peixe, servido duas vezes por semana em pratos bonitos e criativos que Karla vai inventando e adaptando com o que tem na horta, vem a verdura fresquinha do SAF (Sistema Agroflorestal Familiar) implantado ao lado do tanque, além de uma infinidade de “experimentos” – economia de água, reciclagem, minhocário, técnicas de proteção do solo, produção de mel, pequena criação de galinhas e ovelhas – que vão mudando a paisagem local e, por extensão, a qualidade de vida da família e da comunidade.

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Karla conta que o “Sisteminha Embrapa” foi encontrado por Flávio na internet em um momento crítico, quando os dois buscavam formas sustentáveis para permanecer na terra.

O Sisteminha, criado pelo professor Luiz Carlos Guilherme e sua equipe na Embrapa Meio-Norte como um “desagravo à fome”, busca integrar – a partir da produção de peixe em um tanque barato e fácil de fazer – outras atividades produtivas consorciadas em cerca de 500 m² de área.

O tanque dos Caetano custou cerca de R$ 600, com a mão de obra deles, excluindo parte da matéria prima, que já existia na propriedade.

No caso de Karla e Flávio, o tanque foi feito com paredes externas de taipa, ancoradas em varas de taboca, amarradas com “corda” de garrafa pet, feita por eles mesmos.  O tanque comporta cerca de 300 alevinos que, ao final de cinco meses, podem gerar 150 kg de peixe fresco. “No nosso caso, a conta não é essa, porque vamos usando o peixe na nossa dieta ao longo do crescimento dele, a partir dos três meses, então não chegamos aos 150 kg, mas também não faltou peixe na nossa mesa, e chegamos a pescar exemplares de até um quilo e meio!”, explica Karla.

Na prática, o que Karla e Flávio vêm fazendo é adaptar, para a realidade de Flores de Goiás, o Sistema Integrado Alternativo para a Produção de Alimentos, conhecido como Sisteminha Embrapa, desde 2011 instalado na Embrapa Meio-Norte UEP Parnaíba como unidade demonstrativa para o treinamento de produtores familiares. A este processo, por eles chamado de “Sisteminha Adaptado em São Vicente”, os Caetano dão visibilidade por meio da publicação de vídeos em seu canal do YouTube “Dona Kaetana”, e da manutenção da página de Karla Caetano no Facebook, “Sisteminha Embrapa adaptado em São Vicente.”

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Na comunidade, Karla e Flávio vão insistindo em, pelo exemplo, romper desânimos e quebrar resistências culturais arraigadas entre um forte, mas que por séculos viveu sempre sem alternativas, convivendo com a miséria e a enorme dependência do mercado.

Na Internet, tanto em seu canal do YouTube, “Dona Kaetana”, quanto na página do Facebook. “Sisteminha Embrapa adaptado em São Vicente”, a moça morena dos sertões de Flores de Goiás publica vídeos curtos e didáticos contando cada passo do projeto e falando “do que deu certo e do que não deu”, para que outras famílias “não incorram nos mesmos erros e obtenham melhores resultados”.

Em consequência, outros sisteminhas já começam a surgir na paisagem comunitária, como o da amiga Sirlene, que inovou com o uso da tecnologia “bambu-cimento” na produção do tanque e retribui com belos pés de alface vindos da água regada com o que é reciclado do tanque.  E já faz que o quintal dos Caetano deixou de ser só deles.

Ali, são frequentes as visitas de moradores de outros assentamentos da região, de pessoas apaixonadas pela , de técnicos de entidades públicas e empresas privadas e, mais recentemente, de políticos da região, como o presidente da Câmara de Vereadores e o prefeito da vizinha cidade de Posse, que chegaram, há poucas semanas, acompanhados do próprio prefeito do município de Flores de Goiás que, segundo os Caetano, ainda não conhecia o Sisteminha adaptado em seu município.

Texto: Zezé Weiss – Fotos: Karla Caetano. Matéria publicada originalmente em junho de 2017. 


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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