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Apenas um terço dos rios

“CADÊ OS RIOS DE CURSO LIVRE E SAUDÁVEL?”

Apenas um terço dos rios do mundo permanece como “rio de curso livre”, íntegro e saudável

Estudo mostra que apenas um terço dos rios do mundo permanece como “rio de curso livre”, íntegro e saudável

Pesquisa inédita feita pelo WWF e parceiros mapeia, pela primeira vez, o status de conservação de 246 grandes rios de todo o planeta. Alguns Achados: Apenas 37% dos rios do mundo não têm prejuízos causados por poluição, hidrelétricas ou estrada; Nos últimos cinquenta anos, populações de vertebrados que dependem de bacias de água doce foram reduzidas em até 83%; Existem hoje cerca de 60 mil hidrelétricas no mundo inteiro, com mais 3,7 mil planejadas ou em construção para os próximos anos.

Apenas um terço – cerca de 37% – dos 246 grandes rios do mundo ainda pode ser considerado um “rio de curso livre”, que é o status de conservação em que mais oferece benefícios ambientais e serviços ecossistêmicos, mostra um estudo publicado nesta quinta-feira, dia 9, na revista científica Nature.   

Esse estudo, feito por um grupo de 34 cientistas do WWF, da McGill University, do Canadá, e de outras instituições, é resultado de um trabalho de compilação e organização de dados e informações que vem sendo feito desde 2015.

 Foram analisados aproximadamente 12 milhões de quilômetros de rios de todo o mundo, construindo o primeiro mapeamento a respeito do local e extensão dos grandes rios de curso livre existentes no planeta.

 Entre outros achados, os pesquisadores detectaram: apenas 21 dos 91 grandes rios do mundo –com mais de 1 mil quilômetros de extensão- que correm para o oceano mantém uma conexão direta de sua nascente até o mar.

 Além disso, a maior parte dos rios de curso livre remanescentes estão localizados em regiões específicas, como o Ártico, a Bacia Amazônica e a Bacia do Congo.

 Importância dos rios

 Um “rio de curso livre” é um rio no qual as funções e serviços ecossistêmicos não foram afetados por mudanças em sua conectividade (como com a construção de hidrelétricas ou com a exploração mineral) e preservam suas características naturais de vazão, biodiversidade e qualidade de água. Via de regra, eles são considerados rios “íntegros” e “saudáveis”.

Rios íntegros fornecem estoques pesqueiros que promovem a segurança alimentar de milhões de pessoas, transportam sedimentos que mantém os deltas dos rios acima do nível do mar, mitigam os impactos de secas e alagações extremas, evitam a erosão e possibilitam a existência de flora e fauna saudáveis. 

 Interromper a conectividade dos rios diminui, ou por vezes até elimina, esses serviços ecossistêmicos. Proteger os rios de curso livre remanescentes é crucial também para manter a biodiversidades dos rios de água doce.

 O Relatório Planeta Vivo 2018, mostrou que, das 16.704 espécies analisadas em todo o planeta, os vertebrados que vivem nas bacias de rios de água doce sofreram o mais vertiginoso declínio dos últimos 50 anos, com redução de até 83% de suas populações desde 1970.

 Descobertas

 Atualmente, as hidrelétricas e seus reservatórios são algumas das piores ameaças aos grandes rios, reduzindo drasticamente os diversos benefícios que eles fornecem para as pessoas e a natureza ao redor do globo.

 O estudo mostra que existem cerca de 60 mil hidrelétricas no mundo e mais 3,7 mil delas estão planejadas ou em construção. Normalmente, elas são planejadas e construídas uma a uma, o que dificulta a avaliação dos impactos acumulados que elas trazem a uma bacia hidrográfica.

 Contribuição brasileira

 Uma das autoras do estudo é a especialista de conservação do WWF-Brasil e Doutora em Ecologia Paula Hanna Valdujo. De acordo com ela, o WWF-Brasil apoiou o refinamento dos conceitos do estudo apresentado hoje a partir de sua experiência em bacias na Amazônia e no Pantanal.

 “Nós auxiliamos no desenvolvimento de um protocolo para identificar o que seria um rio de curso de livre. Analisamos as cargas de sedimento e poluição para saber se eram excessivas ou não, a existência de hidrelétricas e barramentos e a existência de estradas que interferissem ou não no fluxo dos rios. Nosso conhecimento ajudou a elaborar o modelo que está sendo apresentado”, explicou.

 Alto Paraguai e Amazônia

 A cientista afirmou ainda que, de maneira geral, foram identificados poucos rios íntegros e saudáveis também no Brasil. “A maior parte dos nossos rios estão fragmentados ou têm sua vazão regulada por reservatórios de hidrelétricas. Muitos sofrem o impacto do desmatamento e da ocupação de suas margens com pastagens, mineração e plantações, que aumentam a quantidade de poluentes e sedimentos e afetam a qualidade da água e a saúde do ecossistema”, afirmou Paula.

 Atualmente, o WWF-Brasil se dedica a aplicar o modelo deste estudo para fazer uma análise mais profunda da bacia Amazônica e da bacia do Alto Paraguai. “Este primeiro estudo é global, então você não consegue entrar muito nos detalhes de cada bacia hidrográfica. O que estamos fazendo agora é um estudo mais focado e que nos permite ver com mais detalhes uma região específica”, explicou Paula.

 Ameaça ao turismo

 Ambas as regiões estão altamente ameaçadas por iniciativas que comprometem a vazão natural dos rios. Na bacia do Tapajós, na Amazônia, existem mais de 100 projetos hidrelétricos de pequeno ou grande porte, que ameaçam a integridade dos rios.

 Tais projetos podem trazer graves consequências para as espécies de peixes que se reproduzem nas lagoas que se formam nas margens dos rios e para os peixes que vivem nas corredeiras. Além disso, eles também impedem a migração de espécies importantes para a pesca, que sustenta as comunidades ribeirinhas.

 A regulação da vazão dos rios que formam o Tapajós ameaça ainda a existência de um dos mais importantes pontos turísticos da Amazônia, que são as praias de Alter do Chão.

 Ausência de avaliações

 No Alto Paraguai, o problema é a instalação de pequenas centrais hidrelétricas – que ameaçam tanto os rios barrados, em função do isolamento, quanto o regime de inundações do Pantanal, que depende dos pulsos naturais de seca e cheias dos rios. Além de perda de conectividade, a interrupção dos fluxos naturais dos rios ameaça todo o ecossistema que existe abaixo, na Planície Pantaneira.

 A ausência de avaliações ambientais estratégicas, que levem em consideração o impacto cumulativo de múltiplos empreendimentos nas bacias, assim como a transferência da responsabilidade do licenciamento dos órgãos federais para os estaduais, dificulta ainda mais o planejamento adequado para a manutenção dos poucos trechos remanescentes de rios livres no país.

Fonte: Aviv Comunicação

"CADÊ OS RIOS DE CURSO LIVRE E SAUDÁVEL?"
Canteiro de Obras – Sinop. Foto: Bruno Cardoso/ICV – via Amazônia Real

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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