Calendrag 22 expõe arte drag e debate questões sociais

Calendrag 22: em Brasília, publicação expõe drag e questões sociais

Por Flávia Quirino/ Brasil de Fato

O calendário drag já se tornou uma no cenário cultural e em sua 5ª edição traz como tema o nacional. As artistas drag queens convidadas posaram para fotos inspiradas em filmes nacionais como “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, “O Beijo da Mulher Aranha”, “Bacurau”, “Central do ” e “Terra em Transe”.
Realizada pelo Distrito Drag, um coletivo de artistas transformistas do Distrito Federal, o Calendrag 2022 foi lançado na noite de quarta-feira, 10, no Cine Brasília, em um evento que celebrou a , a arte transformista e exaltou o cinema nacional.
“A gente acredita que o calendário não pode ser um simples anuário com fotografias sobre beleza. A beleza é um dos fundamentos da arte drag e nesse sentido a escolha de um tema para cada ano, significa trazer uma reflexão não só para quem faz o calendário drag, como as as drag queens e fotógrafos, mas também incidir na sociedade com alguns temas que consideramos importantes”, aponta a drag queen Ruth Venceremos, que assina a direção geral do Calendrag 2022.
Segundo a organização, a escolha do tema vem da atual realidade brasileira. O coletivo quis destacar que o Brasil passa por um período político de ataques às liberdades individuais e às conquistas coletivas, de desmonte e de censura, o que pede ações de resistência criativa.
“Tendo em vista o ataque que a tem tido nesse desgoverno, trazer o tema do cinema como eixo fundamental do Calendário Drag é para gente retomar a importância da produção nacional, reafirmar o cinema com essa dimensão que constrói nossa como brasileiro”, aponta Ruth Venceremos.
Desde a primeira edição, em 2018, o Distrito Drag convida para o calendário artistas de destaque tanto do DF quanto nacionalmente. Marcinha do Corintho, figura histórica da cultura LGBTI+, a apresentadora Íkaro Kadoshi e a drag ativista Rita von Hunty, que estampa a capa da publicação, são convidadas deste ano.

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A drag queen Rita von Hunty é capa do Calendrag 2022. / Divulgação

Além delas, estão presentes nos ensaios do Calendrag as artistas Baby Brasil, Brenda Max, Cassandra Morgan, Dionísio Viva, Linda Brondi, Mabel Molotov, Nágila Goldstar, Natasha Voxx, Organzza, Sereia Punk, Shihara, Simone Demoqueen Lafond e Tiffany.
“Tenho 26 anos de drag e em 2021 participar de um projeto como esse é muito importante, porque antes a gente não tinha essa visibilidade”, destaca a drag queen Linda Brondi, que fez a releitura de O Beijo da Mulher Aranha (1985) no calendário e estampa o mês de julho.
Linda Brondi é uma drag criada pelo fotógrafo André Gagliardo, que neste anuário, além de participar como artista, também atuou como fotógrafo e assina a Direção de Arte Calendrag 2022. “A gente existe há muito tempo, quando comecei nos anos 90 ouvia histórias da década de 70 e 80, mas não existia esse registro como temos agora, as coisas se perderam no tempo, têm poucos registros, e estamos em um momento que daqui a 20 anos as pessoas saberão o que estava acontecendo e isso pra mim é uma das coisas mais bacanas do Calendrag”, ressalta Gagliardo.

Apoio

Durante o lançamento do anuário, além do colorido, da alegria e das performances das drag queens, a plateia também era formada por pessoas aliadas da cultura drag, da comunidade LGBTI+. “É bem interessante ver as pessoas sendo elas mesmas, transformando a arte. E é muito lindo acompanhar esse , que é exuberante, colorido, é uma arte e que a gente tem que dar valor”, contou Caroline Benincasa, que foi prestigiar e apoiar o trabalho da drag queen Tiffany, personagem criada por seu irmão Igor Benincasa.
“Tive a honra de ser convidado pelo Distrito Drag para participar do Calendrag 2022. Um projeto lindo, que tem como objetivo dar visibilidade à arte drag e trazer questões políticas e sociais relevantes. É um grande dia para minha carreira artística, estou emocionado e super ansioso”, disse Igor, em sua rede social. Tifffany, a Drag Cênica, estampa o mês de junho em referência ao filme DZI Croquettes (2009).

Diversidade

Em 2020, a drag queen Lee Brandão também participou do Calendrag. “É um espaço importante para mostrar a diversidade das artes, quão versáteis as artistas podem ser. Eu fiquei muito feliz quando fui convidada em 2019 e principalmente, de ser a primeira pessoa com deficiência que ocupou o espaço, que engrandece tanto a nossa arte”, destacou.
Além de exaltar e promover a arte drag, o calendário cumpre uma função social. Os recursos arrecadados com a venda da nova edição serão destinados para duas entidades de apoio à comunidade LGBTI, a Casa Akotirene, um quilombo urbano que promove atividades de formação e inclusão em Ceilândia (DF), e a Casa Neon Cunha, que promove ações para contribuir com a autonomia de LGBTIs em São Bernardo do Campo (SP), no Grande ABC Paulista.
As vendas online do anuário serão feitas pelo site da Editora Expressão Popular.
Este artigo não representa a opinião da Revista Xapuri e é de responsabilidade da autora.
Calendrag

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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