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CERRADO: O QUE FAZER PARA DEFENDER O QUE AINDA RESTA?

CERRADO: O QUE FAZER PARA DEFENDER O QUE AINDA RESTA?

CERRADO: O QUE FAZER PARA DEFENDER O QUE AINDA RESTA?

O que resta dos biomas brasileiros? O que resta da Amazônia, do Pantanal, da Caatinga, do Cerrado? Com ênfase no que é e no que será, queremos trazer aqui uma reflexão para pensarmos o que fazer “pra defender o que ainda resta” das nossas florestas, nascentes, riachos, rios, fauna e flora

Por Iolanda Rocha 

Segundo dados do IBGE, temos o seguinte cenário em relação aos grandes biomas brasileiros: a área desflorestada na Amazônia se aproxima hoje dos 20% da área florestal original do bioma; por sua vez da Mata Atlântica, restam apenas 12%; da área total do Pampa, 46%; do Cerrado, 51%; da Caatinga, 54%; do Pantanal, 85%. Entretanto, a maior expansão recente do desmatamento tem se  concentrado no Cerrado e na Amazônia.  

De acordo com os dados atuais do MAPBIOMAS, o Brasil perdeu 8.558.237 hectares de vegetação nativa nos últimos cinco anos, sendo que os dois maiores biomas – Amazônia e Cerrado – somam 85% da área desmatada no país. Em 2019, o Cerrado ultrapassou a Amazônia em termos de área desmatada. A região conhecida como MATOPIBA – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – respondeu por quase metade de toda a perda de vegetação nativa no país em 2023.

O bioma Cerrado localizado a partir do centro do Brasil, presente em vários estados e em praticamente todas as regiões, do Centro-Oeste ao Norte ao Nordeste, Sul e Sudeste, sofre com a exploração das suas terras, com a destruição dos rios, da fauna, da flora, das comunidades tradicionais e dos povos originários. 

Nos últimos anos, estamos presenciando a destruição desse importante bioma, visto que se tira a vegetação nativa, uma das maiores biodiversidades do planeta, para dar lugar à monocultura da soja e à criação de gado para exportação. Os correntões do agronegócio saem destruindo toda a vegetação natural, as árvores pequenas e de grande porte, e matando juntamente as águas das nascentes, dos córregos e dos rios, que nos últimos anos vêm  desaparecendo, dando lugar a um clima favorável à seca e às mudanças climáticas, que já ameaçam e destroem comunidades do campo e  cidades inteiras, ora com seca prolongada, ora com chuvas excessivas. 

Para falarmos do desmatamento do bioma Cerrado é preciso entender a distribuição de terras no Brasil. O território brasileiro foi fatiado e entregue aos estrangeiros desde os anos remotos do século XVI. Como se não bastasse a oferta e promoção das nossas terras, criou-se a Lei de Terras de 1850, que serviu para legitimar e documentar a entrega das terras invadidas com o consentimento do Estado. 

Os trabalhadores do campo, indígenas, as comunidades tradicionais que vivem aqui desde o início dessa história, mal contada nos livros didáticos, resistiram e lutaram para que esta terra continuasse sendo uma terra “gigante pela própria natureza” e que abrigasse os seus filhos e filhas como uma boa mátria. 

Como se não bastassem as Sesmarias, a Lei de Terras, o latifúndio invasor juntou-se ao golpe civil-militar de 1964, e junto com o Estado, a mídia e os militares aperfeiçoaram a grilagem de terras no Brasil. 

O Golpe perdurou por vinte e um anos, retirando direitos, tomando as terras de quem nela trabalha e tira o seu sustento, entregando o país aos estrangeiros, torturando e matando quem se levantasse contra a ditadura das elites brasileiras. 

Foi nesse contexto que avançou a destruição dos biomas brasileiros, que vêm sofrendo devido à ganância e à aquisição desordenada de terras por estrangeiros. Os grandes invasores de terras no Brasil, inicialmente conhecidos como produtores rurais, depois latifundiários e agora empresários do agronegócio, sempre visaram o lucro fácil, com a exploração da força, da mão de obra da classe trabalhadora, e a extração sem limites dos bens naturais. 

Em se tratando da destruição dos biomas, importante ressaltar que, devido à expansão do agronegócio e ao alto investimento dos estrangeiros no território brasileiro, o Brasil tornou-se o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Esse fato não acontece isoladamente. Ao passo que aumentou a plantação de soja, milho e cana-de-açúcar para exportação, reduziu-se a plantação de feijão e arroz, alimentação básica da nação brasileira, o que compromete a segurança e a soberania alimentar.

Além do desmatamento, do uso indiscriminado dos agrotóxicos, estamos convivendo nos últimos dias com uma nuvem de fumaça provocada pelos interesses do agronegócio, que ateia fogo para provocar um caos no país. Os empresários do agronegócio sabem  que esse caos provocado repercute na vida e qualidade de vida dos povos do campo e da cidade. Precisa-se saber se os investidores no agrobusiness têm a consciência de que essa forma de exploração não tardará para a terra dar sinais de exaustão.

Diante de inúmeros fatos evidenciados que levam o país e o planeta ao caos climático, ao comprometimento alimentar e que ameaçam a soberania nacional, existem alternativas viáveis para a sobrevivência. É preciso garantir o direito dos camponeses e camponesas de permanecerem nas terras, é preciso que se efetive a reforma agrária com incentivos à agroecologia e à agricultura familiar. 

“Pra defender o que ainda resta” dos nossos biomas, em especial do Cerrado, é necessária e urgente a aprovação de uma lei que proíba qualquer tipo de destruição nos biomas brasileiros. É preciso estabelecer uma meta de Desmatamento Zero.  É necessário ouvir os povos das florestas para implantação de políticas públicas coerentes com a necessidade dos povos e a preservação dos biomas.

Iolanda Lula 1 e1682624332475Iolanda Rocha Educadora Socioambientalista. Ecofeminista. Mestranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural. Conselheira da Revista Xapuri

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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