Ser um professor universitário do tipo zebra gorda leva algum tempo…

Ser um universitário do tipo zebra gorda leva algum

Por Marcio Markendorf

Em média, um desta estuda cerca de 4 anos em um curso de graduação, mais 6 anos em cursos de pós-graduação.

Nesse meio tempo, as zebras, para engordarem, pastam pelos campos de da subsistência da pesquisa. Elas escrevem artigos, elaboram resenhas, apresentam comunicações, dão palestras, ministram minicursos/oficinas. Muitas vezes de graça, a convite de outros amigos, também zebras, ainda magras, em busca de melhorar o currículo e as listras.

E depois, para alcançar o status de gorda, primeiro a zebra precisa ser aprovada em um concurso, o que não é muito fácil. Pode levar 4 a 5 concursos para isso acontecer. E, ora, verdade seja dita, não tem concurso todo ano, não é o tipo de concurso de beleza. E dentre as escolhas possíveis, a zebra às vezes precisa ir tentar a vida lá no interior (onde só os médicos cubanos foram).

E, depois que a zebra entra em uma pública, tem avaliação contínua de rendimento. Uma zebra gorda, só é gorda, porque precisa assumir “40 horas” de exclusiva à pesquisa, ao ensino, à extensão, à administração. E vamos colocar entre muitas aspas 40 horas porque toda zebra sabe que isso é conversa para boi dormir: toda zebra, para dar conta de tudo que lhe dão, trabalha muito mais do que 40 horas, sacrificando muitas das vezes seus momentos de lazer, finais de semana, feriados, férias, família. Afinal, a zebra precisa produzir, produzir, produzir… só assim pode, porventura, ganhar uma promoção ou progressão…e ficar “gorda” (o que é um termo bem contraditório para tudo o que uma zebra faz na vida e o que ela sacrifica para ser zebra).

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Foto por Tra Nguyen em Unsplash

Talvez muitos não saibam, mas para uma zebra apresentar um em um evento de referência, tipo ABRAZEBRA, é preciso desembolsar um valor relativamente alto. Contando com anuidade, taxa de inscrição, transporte, hospedagem e ….dá um valor bastante expressivo.

Ah, sim, as universidades até podem dar um auxílio financeiro. Uma vez por ano. E veja bem: auxílio (não dos numerosos, vultosos e extravagantes auxílios de políticos, esses sim bem gordos, muito desproporcionais em relação às zebras, razão para que eu afirme que as zebras, perto dos políticos, são tão mirradas que dá até uma dó profunda).
Vamos lembrar que as agências de fomento que avaliam a gordura das zebras exigem padrões muito altos, o que leva até a estafa mental dos animaizinhos.

E por falar em dó e saúde, não exatamente nesta ordem, é digno de nota o sentimento com o qual as zebras são agraciadas na .

Dia desses estava no médico veterinário e fui questionado se, por eu ser uma zebra, eu gostava de sofrer. Vejam só: a condição de zebra é vista sob a ótica do sofrimento existencial, algo que serve de gracejo até para os médicos (cujas profissões se devem… às zebras).

Obviamente que não é somente assim que os outros vêem as zebras. Muitas vezes é com hostilidade, como se esses pobres equídeos fossem inimigos terríveis, doutrinadores e comunistas.

Bem, não quero puxar o pasto para meu lado, mas ter um pensamento de esquerda não me torna comunista nem petista (esse é o julgamento de outros equídeos, como os jumentos, animais que, infelizmente, até chegam a presidir um país). Pelo contrário, me torna mais zebrino (ou humano, como queiram).

E, falando nisso, nem todas as zebras são iguais, mas procuramos manter o respeito e a dignidade. Ao menos não ficamos escrevendo merdas ou dando declarações idem como outros equídeos, os asnos. Alguns desses, tristemente, chegam a ser ministros.

Marcio Markendorf é Professor na empresa Universidade Federal de Santa Catarina,  Doutor em Teoria da Literatura pela UFSC e gerencia o Projeto Cinema Mundo/UFSC e Núcleo Literatual

Fonte: Facebook

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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