Cultivo de cana de açúcar pode colocar a Amazônia em colapso

Cultivo de cana de açúcar pode colocar a em colapso, alertam especialistas

Projeto de lei em trâmite no Congresso quer liberar cultivo nas áreas do bioma Cerrado e dos campos gerais na , o que atualmente é proibido

Por Silane Souza (AM)

O cultivo de cana-de-açúcar na Amazônia, como prevê o Projeto de Lei do Senado (PLS) 626/2011, cuja votação em plenário foi adiada na última terça-feira (27), pode provocar efeitos catastróficos sobre a floresta amazônica, a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos da América do Sul e a própria produtividade agrícola do Brasil. O alerta é de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC) que publicaram, nesta semana, um artigo sobre o tema na revista científica Science.

O Ph.D. em Mudanças Globais e Amazônico Philip Fearnside, que assinou o artigo juntamente com o doutorando em Ecologia Lucas Ferrante, classifica a situação como “grave” porque abre mais uma porta para o desmatamento na Amazônia. Conforme ele, a cana provoca desflorestamento direto e ao substituir as pastagens, supostamente em áreas “alteradas”, como indica o PLS, vai permitir que a pecuária, principal atividade que faz uso dessa área desmatada, vá para outro lugar.
 
“E geralmente o que acontece é que o fazendeiro vende a e compra uma área maior de floresta, que é mais barata. Então vai estimular o desmatamento, coisa que já foi mostrada estatisticamente no caso da soja. A mesma coisa será feito a cana-de-açúcar”, aponta Philip Fearnside, integrante do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), que recebeu o prêmio Nobel da Paz em 2007.

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Philip Fearnside é Ph.D em Mudanças Globais e Desenvolvimento Amazônico. Foto: Antônio Lima

O desmatamento por sua vez, avisa Fearnside, traz diversos impactos sobre o clima, que não se referem apenas ao efeito estufa que afeta o Brasil e outros países, mas também ao regime de chuva. “Vai diminuir a quantidade de vapor que é transportado da Amazônia para o resto do Brasil e países vizinhos. A Argentina está mais preocupada que o próprio Brasil. Se desmata aqui vai diminuir a chuva lá, assim como em São Paulo, lugares que já estão com falta de água”, afirma.

 
No artigo publicado na Science, os pesquisadores evidenciam que a floresta amazônica desempenha um papel importante no clima da América do Sul, com contribuições substanciais de precipitação para a agricultura no sudeste do Brasil. Em médio e longo prazo, a perda florestal ameaçaria a própria produção agrícola e de biocombustíveis do País, sendo a área com maior produção agrícola localizada no Sul e Sudeste, que depende do vapor de água da região amazônica.
 
O doutorando em Ecologia Lucas Ferrante revela que a ideia do artigo foi justamente a de alertar a sociedade sobre o impacto que a autorização do cultivo de cana-de-açúcar pode causar para a América Latina como um todo. “A médio ou longo prazo seria interessante a própria bancada ruralista se conscientizar do papel da Amazônia, principalmente os ruralista do Sul e Sudeste, que são dependentes da quantidade de água que a Amazônia proporciona para as ções”, destaca.

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Lucas Ferrante é doutorando em Ecologia no estuda do
impacto da mudança climática sobre biodiversidade. Foto: Antônio Lima
‘Não vai diminuir a pobreza’
No artigo publicado na Science, os pesquisadores Fearnside e Ferrante salientam que os políticos e as instituições nacionais e internacionais que financiam grandes empresas agrícolas não devem ser enganados pelo “doce sabor”  de uma nova fronteira agrícola a ser explorada.
Eles defendem orientação pela necessidade de evitar a perda da biodiversidade da Amazônia, do patrimônio genético e dos valiosos serviços ecossistêmicos, incluindo a regulamentação climática para a área com a maior população e produção agrícola da América do Sul.
Philip Fearnside afirma que os argumentos defendidos no projeto estão completamente “furados”. “Isso de que vai sustentar a população amazônica, diminuir a pobreza, etc e tal, não procede porque a cana vai expulsando os pequenos agricultores. Normalmente onde isso entra o efeito é negativo. E a mão de obra geralmente é migratória, tem até condições de trabalhos escravos”.
Impacto negativo não se limita às áreas cultivadas
A vegetação da Amazônia varia de densas a áreas de savana. As florestas da região e sua biodiversidade são vulneráveis ao avanço contínuo das mudanças no uso da terra para agricultura e pecuária, de acordo com os pesquisadores Philip Fearnside e Lucas Ferrante.
No Brasil, o cultivo de cana-de-açúcar é atualmente proibido nos biomas do Pantanal e Amazônia. A cana-de-açúcar está entre as culturas com os maiores aumentos de produção na última década, e o Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar do mundo, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
As plantações de cana estão projetadas para aumentar devido à demanda por biocombustíveis. Cientista já têm demonstrado que as plantações de cana-de-açúcar ameaçam a biodiversidade, com seus efeitos se estendendo além das áreas cultivadas até as florestas adjacentes.
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Uma das técnicas para a colheita da cana utiliza o para a queima das palhas. Foto: Rogério Paiva/MPT
Lucas Ferrante disse que estudou, no ano passado, o impacto da cana-de-açúcar na mata atlântica e verificou que este é um dos cultivos mais nocivos para a estrutura da floresta e para a biodiversidade quando comparado a outros cultivos que havia na região. Isso porque a plantação provoca um efeito, conhecido como efeito de borda, que se estende além da floresta.
“Pode impactar até vários quilômetros para dentro da floresta. Então o dano não seria apenas na área cultivada. Iria se estender para área adjacente de floresta também. O dano seria muito maior do que realmente se pensa”, ressaltou.
Petição online como pressão
O Instituto Socioambiental (ISA) criou uma petição online – Amazônia Sem Cana – para pressionar o presidente da República, Michel Temer (MDB), e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), para que o PLS 626/2011 não seja aprovado. Para os interessados, o documento pode ser assinado no site da organização: www.socioambiental.org. A meta é atingir um milhão de assinaturas.
Mobilização de entidades contra o PLS
No último dia 26, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, da qual faz parte a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única), divulgou um comunicado no qual reafirmou sua posição contrária a aprovação do projeto que permite o plantio de cana na Amazônia.  “Os biocombustíveis e açúcar brasileiros não são associados a esse desmatamento. O PLS 626/2011 pode manchar essa reputação e colocar em risco os mercados já conquistados e o valor dos produtos brasileiros”, diz parte do texto.
No mesmo dia, 32 entidades, entre as quais Greenpeace, WWF-Brasil, SOS Mata Atlântica, Observatório do Clima e Instituto Socioambiental (ISA), divulgaram uma nota de repúdio ao PLS 626/2011. De acordo com elas, o projeto pode significar uma nova pressão sobre a floresta resultando em mais desmatamento e degradação e também ameaça o próprio setor produtivo, já que se aprovado pode acarretar em “dano de imagem difícil de reparar num período crítico para o sucesso do etanol”.
Autor e previsões
O Projeto de Lei do Senado (PLS) 626/2011 é de autoria do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA). O texto em tramitação  autoriza o plantio de cana-de-açúcar em áreas já alteradas e nas áreas do bioma Cerrado e dos campos gerais situadas na Amazônia Legal. A possibilidade de plantio nessas áreas foi extinta por um decreto de 2009, que estabeleceu o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar.
Publicado originalmente no site www.acritica. com, por Silane Souza


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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