França insubmissa: a fraternidade é vermelha
A vitória das forças políticas unidas na Nova Frente Popular no último dia 4 de julho salvou a França do desastre da hegemonia do fascismo no parlamento nacional.
Por Maria Luiza Franco Busse
A Nova Frente Popular formada pelos partidos França Insubmissa, Comunista, Socialista e Os Verdes, obteve 182 cadeiras, deixando os fascistas em terceiro lugar com 143 assentos. Os demais couberam ao Juntos, partido da direita liberal do presidente Emmanuel Macron que obteve 168, aos Republicanos, com 45, e a outros pequenos partidos que somaram 39.
Afastado o perigo iminente, agora é do jogo a disputa interna para formar a maioria de 289 deputados necessária para aprovar o programa de bem-estar social que levou os franceses às urnas, em registro histórico de participação de 67% de eleitores num segundo turno em mais de 40 anos.
Jean-Luc Mélenchon, fundador e presidente da França Insubmissa, comemorou a resistência dos franceses com uma declaração de amor de emocionar a França nacionalista dos partisans e de todas e todos que lutaram contra a barbárie nazista que meteu a bota no solo francês. “On est chez nous!” – Estamos em casa!
O patriotismo francês esteve presente em grande parte das falas de Mélenchon. Pode um comunista, que é internacionalista, ser, ao mesmo tempo, patriota? A pergunta foi feita e seguida da resposta, por Mao Tsé-Tung. “Não só pode, como deve”, afirmou o Timoneiro, ao observar as condições históricas que o levaram a essa consideração:
“(…) Existe o ‘patriotismo’ dos agressores japoneses e de Hitler e existe o nosso patriotismo. (…) Nós, os comunistas chineses, devemos combinar o patriotismo com o internacionalismo. Somos ao mesmo tempo internacionalistas e patriotas e nosso lema é ‘lutar contra o agressor em defesa da pátria‘.
(…)[a] Guerra da Resistencia [é]um dever inadiável(…) e só alcançando a libertação nacional será possível que o proletariado e todo o povo trabalhador conquistem sua própria emancipação. A vitória da China e a derrota dos imperialistas (…) constituirão uma ajuda para os povos dos demais países. (…) ações patrióticas são todas justas e longe de infringir o internacionalismo(…).”
Mélenchon não chegou a cantar Le temps de cerises – A época da cereja –, mas disse um verso em que o sol volta a brilhar na “sua França”, ou seja, a França que mais uma vez entendeu a importância de se unir para lutar contra o verdadeiro inimigo.
Em 2015, um ano antes de fundar a França Insubmissa, Mélenchon lançou o livro O arenque de Bismarck, denúncia da política econômica que a Alemanha, o país mais rico da Europa, estava praticando e contaminando o continente.
“Além do Reno nasceu um monstro, filho da economia financeira descontrolada e de um país entregue a ela. Esse casamento está em vias de fazer da Europa sua imagem e semelhança. O veneno alemão é o ópio dos ricos. Mudar nossas vidas e mudar a Alemanha é o mesmo empenho. Temos que levar isso a cabo antes que seja demasiado tarde” – escreveu.
A perspectiva de um tempo ensolarado e com cerejeiras em flor devolveu gosto e luminosidade ao ambiente desumano e malvado das políticas neoliberais que promoveram o desencanto do mundo, terreno fértil para o crescimento e expansão do parasita nazifascista.
E o renascer do encantamento, sem ilusões, não é pouca coisa.
Maria Luiza Franco Busse – Jornalista e Semióloga. Matéria publicada originalmente no Brasil 247.