Desde tempos imemoriais, o povo indígena Guajajara/Tentehar habita as matas do que hoje se conhece como Terra Indígena Arariboia, no Maranhão. Depois de mais de 400 anos de resistência, com muita coragem, muita determinação e muita luta, os Guajajara/Tentehar conseguiram manter sua história, sua cultura, suas belas e milenares tradições.
Por Zezé Weiss
Guerreira como seu povo, a líder indígena Sonia Bone Guajajara, 40 e poucos anos, casada, mãe de três filhos – Mahkai, Yaponã e Y’wara, acadêmica graduada em Letras e pós-graduada em Educação Especial pela Universidade Estadual do Maranhão, traduz o espírito de resistência dos Guajajara/Tentehar: Sonia é hoje uma das lideranças mais expressivas do movimento indígena brasileiro.
À frente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, onde exerce a função de coordenadora-executiva, Soninha, como é chamada por seus “parentes” indígenas e por suas amizades no Brasil e mundo afora, gosta do que faz. Ela entende seu trabalho como missão e, com a mesma paixão e carinho, cuida tanto das questões locais do seu povo, no Maranhão, quanto das grandes causas nacionais dos povos indígenas.
Acostumada a travar grandes embates tanto em nível nacional quanto internacional, Sonia se fortalece nos inúmeros desafios que sempre enfrenta. Sua fala expressa isso com extrema clareza:
“É muito difícil ser indígena hoje e mais difícil ainda ser liderança, porque as forças políticas e econômicas querem dominar, manipular e decidir, e para isso vale roubar, matar, invadir e destruir, como acontece com o meu povo no Maranhão.
Hoje vivemos em 11 Terras Indígenas, na região onde sempre foi a nossa terra originária. Embora nossas Terras tenham cumprido todo o rito da demarcação, do registro e da homologação, enfrentamos uma constante situação de risco dentro da nossa própria casa.
Nossas comunidades são constantemente ameaçadas e nossas lideranças são frequentemente assassinadas por invasores – fazendeiros, grileiros, mercenários, pistoleiros-, que nos destroem, nos roubam, nos matam e, pior, tentam acabar com nossos costumes e tradições, ameaçando, assim, a vida dos homens e das mulheres indígenas de nossas aldeias e de nossa região.
Fico muito triste porque, ao invés e garantir os territórios sagrados aos povos indígenas, o que se busca são formas de legalizar o desalojamento forçado, negando direitos conquistados, no Maranhão e no Brasil inteiro”.
Mesmo um passeio rápido pelas redes sociais, nas últimas semanas, dá uma ideia da dimensão da gravidade da conjuntura enfrentada por Sonia e pelo movimento indígena brasileiro neste final de ano.
Em 27 de outubro de 2015, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados aprovou a PEC 215 que, na prática, acaba com o processo de demarcação de terras indígenas no Brasil. Soninha se posiciona:
“A PEC 215 é um desses instrumentos de violar direitos, de negar direitos e de retroceder direitos dos povos originários. Agora, aprovada na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, o passo seguinte será a votação em Plenário.
Lá, seremos esmagados por esse sistema político fascista em que se tornou o Congresso Nacional. Mas estamos atentos e vigilantes, queremos ver formas de impedir que chegue ao Plenário e, de qualquer forma, vamos continuar mobilizando o Senado para que mantenham seu posicionamento contrário”.
A brava guerreira, que desde menina se indignava quando ouvia falar que “índio não pensava, quer era bicho violento, que não podia exercer um trabalho além da roça, que deveria ficar isolado na mata, que existe muita terra para pouco índio, que índio bom é índio morto, e por aí vai” não se intimida. Ao contrário, se fortalece na adversidade: “A cada vez que perdemos uma batalha, mais coragem me dá e mais forças eu tenho para continuar lutando”.
Esta é Sonia Bone Guajajara, uma grande liderança nacional, uma sensível mulher indígena que acredita e ousa construir um mundo diferente, “mas um diferente que valorize as diferenças, as competências, as habilidades e, sobretudo, a riqueza e as diversidades culturais, o deus que cada ser humano é” – diz a guerreira.
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, de autoria do ex-deputado Almir Sá, de Roraima, que tramita na Câmara desde o ano 2000, tem sido alvo de críticas e protestos, porque representa um retrocesso e uma ameaça aos direitos dos povos indígenas. Veja o que muda, segundo a proposta:
COMO É | COMO SERIA |
A decisão sobre demarcação de terras indígenas cabe à Fundação Nacional do Índio (Funai), ao Ministério da Justiça e à Presidência da República. | A competência de demarcar terras indígenas passa a ser do Congresso Nacional. |
A demarcação é definitiva | Pode haver revisão em processos de terras já demarcadas. |
A regulamentação é feita por Decreto do Executivo. | A regulamentação passa a depender de Lei, aprovada pelo Congresso Nacional |
Fotos: WWF | Celso Maldos
Matéria publicada originalmente em 15 de março de 2020.
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