Guerra do Contestado: O monge e seu receituário
Receita dada pelo célebre monge José Maria de Agostini ao senhor Joaquim Nunes da Rocha no dia 3 de setembro na casa do senhor Antonio Calumby, no lugar chamado São João, município de Campos Novos, não se lembrando o senhor Joaquim Nunes do nome da pessoa que escreveu a receita, que foi ditada pelo mesmo monge:
“Ponha em duas medidas de cachaça 700 gramas de arruda e 700 de guiné e 700 da casca da cortiça e 700 da erva de passarinho e 700 da erva do touro e 700 da erva de bicho e 700 da casca da caroba e 700 da casca da sassafrais e 700 da casca da palmeira e 800 de assucara branco, e deche na infusão 15 dias, e o depois, pase em otra vasilla e ponha 12 vidros de ensensa junto para tomar um calezinho de note e otro de manham.”
A letra é boa e conservamos a ortografia original.
Nota: o curandeiro tinha então à sua disposição três e mais secretários e ele próprio também escreve bem; a afluência de povo era então enorme; carneou-se uma vaca gorda, que foi toda gasta naquele dia.
A bem do Sr. Joaquim Nunes poder ter acesso à consulta foi preciso esperar até às dez horas da noite, ficando ainda 15 pacientes esperando a vez.
As receitas que já eram escritas, quando indicada alguma delas o consulente, pelo curandeiro, este mandava copiar por um de seus secretários que a entregava ao dito consulente.
A Notícia – (Lajes) 19/10/1912.
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As fumigações de Artemiza cozida, tomadas em banho de assento, fazem as partuerentes expulsarem a creança morta.
A mesma planta cozida em vinho que se bebe em doses curtas, porém frequentes, preserva a mulher do perigo de aborto.
Paulino Pereira
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Tosse, ponha-se no pescoço da creança que a tiver uma pedra pomes e a tosse cedera
Paulino Pereira
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Para os calos nos pes, colocar sobre o callo um pouco da parte interna de um figo e deixae ahi durante alguns dias ficareis curado
Paulino Pereira
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Para curar Dor de Ouvido, tomai uma pequena cebola e assae-a bem na cinza, enrolae-a em um pedaço de panno muito fino untada com um pouco de mantega sem sal. Mettei tudo no ouvido doente o mais quente que se puder suportar, dentro de um minuto a dor desaparecera
Paulino Pereira
Fonte: Jean Claude Bernardet, em Guerra Camponesa no Contestado, Global Editora, 1979. Pesquisa: Jaime Sautchuk.
A Guerra do Contestado (1912-1916), em Santa Catarina, é considerada o maior conflito armado pela posse da terra já ocorrido no Brasil. O sangrento e prolongado embate, com milhares de mortos, exigiu várias campanhas pesadas do Exército, que pela primeira vez usou avião e metralhadora. Seu resultado foi uma reforma agrária na região.
Por Jaime Sautchuk
A guerrilha se tornou conhecida também como “dos Pelados” e “dos Fanáticos”. “Contestado” porque aquela área do país ainda era disputada por Paraná e Santa Catarina. “Pelados” porque os rebeldes raspavam a cabeça pra evitar piolhos e outros bichos. E “Fanáticos” por ter uma fachada de movimento messiânico, religioso.
As razões da guerra, em verdade, foram socioeconômicas. Uma latente tensão social já existia por causa do coronelismo, mas foi a construção da ferrovia São Paulo-Rio Grande que a fez eclodir. O governo federal entregou a obra ao magnata ianque Percifal Farquhar, dono da Brazilian Railway Company, que já havia construído a Madeira-Mamoré, no Mato Grosso.
Foram dados à empresa 30 km de terras, em linha reta, às margens da ferrovia, para exploração de madeira e o que bem entendesse, mas aquelas terras já eram habitadas. Andava por lá um monge, de nome José Maria, que pregava o fim do mundo e a ressurreição, atraindo muitos fiéis. Em torno dele surgiu o conflito, mas ele morreu logo nos primeiros embates armados, ficando a adolescente Maria Rosa como liderança da seita.
Contudo, a moça era guiada por um conselho militar, que incluía seu pai, e repassava comandos como se tivessem sido visões. A luta ganhou vulto por anos a fio e só parou com a rescisão do contrato da ferrovia e o loteamento das terras que haviam sido entregues à empresa construtora, distribuídas a pequenos produtores.
Da produção daqueles minifúndios nasceram os grandes frigoríficos brasileiros (Sadia, Perdigão etc.), nas primeiras décadas do século passado.
Jaime Sautchuk – Jornalista. Escritor. Fundador da Revista Xapuri. Encantado em 14/07/2021, aos 67 anos de idade. Esta matéria (publicada originalmente em dez/2020) faz parte do legado de Jaime.