Haidê Venzon: Os direitos humanos perdem uma de suas imprescindíveis
“… é importante lembrar que os desafios são vencidos coletivamente e é a ação coordenada entre todas as pessoas comprometidas com a defesa e garantia dos direitos das crianças e adolescentes que pode fazer com que sejam realmente uma prioridade absoluta, porque esta continua sendo uma tarefa urgente”. Haidê Venzon
Por Zezé Weiss
Para muitas de nós, mulheres militantes do PT, dos direitos humanos, dos movimentos de defesa da criança e do adolescente, Haidê Allegretti Venzon tornou-se um exemplo de luta, uma referência de resistência, uma “amapari”, aquela que aponta caminhos.
Conheci o trabalho militante da professora Haidê nas celebrações dos 25 anos do Movimento pelos Direitos da Criança e do Adolescente (MDCA), em 2014. Haidê foi uma das 17 fundadoras do MCDA, no ano de 1989. Nas múltiplas e justas homenagens ao MDCA, o reconhecimento à trajetória de lutas da gaúcha Haidê Venzon sempre esteve presente.
Soube ontem, 09 de junho, de seu falecimento, aos 79 anos de idade, por uma nota de sua irmã, a antropóloga Mary Allegretti. Da Mary recebi, via whatsapp, o texto que se segue, lido no velório de Haidê Venzon, no dia 08 de junho, por um de seus amigos, Everton Silveira, pessoa simples de uma comunidade de Porto Alegre:
Não sei se tudo tem início, sentido ou final, mas sei o que nos deixa marcas. Marcas que ficam, que determinam os rumos que damos às nossas vidas!
Haidê Venzon, assim conhecida, é uma dessas pessoas que deixam marcas que, de tão fortes e profundas, fazem doer a consciência, provocam uma dor que desacomoda, que chateia, que faz a cabeça ficar girando à procura de uma maneira de saná-la, que faz aprender, que educa.
Lá por 1992, eu me encontrei com essa mulher, grande mulher, fabuloso ser humano, dona de uma personalidade forte e terna, de uma generosidade absoluta, de uma determinação, de um foco sem par.
As searas de sua vida a fizeram reconhecer desde muito cedo o que é fundamental para que a criança seja criança e, desde esse dia, ela jamais deixou de perseguir o caminho que pudesse assegurar que toda criança e que todo adoscente tivesse esse direito.
Pelo caminho, arrastava muita gente que, por vezes, mesmo sem entender a extensão de tudo o que ela defendia, pela confiança no seu olhar e na postura se embebescendo na ciência que ao seu redor fervilhava e fazia o conhecimento acontecer e lutar pela causa.
Eu nunca gostei muito de mágica, mas adorava aquela cartola que a Nossa Haidê tinha… Nunca pesei, sei que alguns até o fizeram, mas quando eu pegava aquela bolsa milagrosa com que ela subia e descia ruas e ladeiras, de reunião em reunião, da Prefeitura para o Conselho, do Conselho para a FASC, da FASC para a SMED, da SMED para o Fórum, do Fórum para a Prefeitura… ufa… imagino que tinha uns 30 quilos, e não duvide, era mesmo mágica, dali saíam leis, reportagens, dados, reuniões, números de telefones de todas as pessoas do universo que tivessem a ver com a questão da criança e do adolescente, saíam também polígrafos, ah, os polígrafos… e umas balinhas de goma coloridas, porque ninguém é de ferro!
Não cabem em palavras as marcas deixadas pela Haidê em minha vida, e creio ser o mesmo para tantos outros de nossa militância, do partido da Criança e do Adolescente, o que sei mesmo é que com ela aprendi alguns dos valores mais signifiantes da minha vida… Aprendi a ter cuiddo com o que dzer, com tratar a todas as pessoas pensando no que o outro vai entender, porque é preciso respeitar o tempo e a história de cada um… Aprendi que, se quermos um mundo novo,temos que lutar por ele, mais, temos que nos colocar diante de nosso algoz, na linha de frente, e não esperar por ninguém.
Que bom… que alegria ter podido, além de aprender tanto com ela, ser seu amigo e ter tido tantos momentos tão especiais. Haidê era absurdamente especial, e sabemos todos que há um antes e um depois dela na trajetória dos direitos da criança e do adolescente, e também nos processos democráticos de participação na construção e consolidação das políticas públicas afirmativas ancoradas no ECA.
Querida… brincava que quando ela partisse queria que mandássemos uma máquina de xerox para que ela seguisse fazendo suas cópias e nos presenteando com seus textos iluminadores, e também um telefone ilimitado, para que ela pudesse ligar a qualquer hora do dia ou da noite, com uma caderneta de anotações com uma lista infindável de nomes grafados em diversas cores, para o caso de não encontramos o nome de alguém, porém, agora, ela segue do alto nos iluminando a mente, o coração, e orientando os nossos passos ao lado do Pai, nos guiando em permanente vigília e construção das possíbilidades de efetivação de nossas (suas) crianças e adolescentes.
Fica à Haidê, nossa profunda gratidão pelas marcas que se tornaram eternas em nós, em tantas outras pessoas e na história dessa luta que seguee que permanecerá por gerações!
Haidê Venzon, Presente!