Jaime Sautchuk partiu para o mundo dos encantados

Jaime Sautchuk partiu para o mundo dos encantados

partiu para o dos encantados

DE QUÊ VIVER?

A cirrose mata o bêbado

Overdose, o tri-legal

Aids, o do risco

Stress, o jornalista

Sol, o camponês

Trabalho, o operário

, o miserável

Mar, o pescador

Coragem, o revolucionário]

Tiro, o menino de rua

Tensão, o piloto

Tesão, a prostituta

Paixão, eu e alguns amores

Que, bem ou mal, serão louvados

E os burocratas, de quê morrem?
De tédio, os desgraçados! 

Jaime Sautchuk

Neste 14 de julho, por volta das 13h, em , por conta de uma parada cardíaca, nosso companheiro Jaime Sautchuk, jornalista e escritor, fundador e editor da Revista Xapuri, de 68 anos, partiu para o mundo dos encantados…

Por ACQ e

Jaime Sautchuk

Catarinense de nascimento, goiano por opção e  cerratense de coração, Jaime vinha sofrendo com uma saúde debilitada, com sessões diárias de hemodiálise há cerca de dois anos. Natural de Joaçaba, aos 13 anos foi estudar em Curitiba, Paraná, onde trabalhou como office-boy e bancário até se tornar jornalista, aos 18 anos. 

Em Brasília, trabalhou inicialmente no extinto Diário de Brasília. Passou pelas redações da BBC de Londres, dos jornais alternativos Opinião e Movimento, de O GloboEstadãoFolha de S. PauloVejaAfinal e Diário da Manhã. Em novembro de 2014, fundou com a jornalista e ambientalista Zezé Weiss a revista Xapuri Socioambiental, da qual foi editor até  a última edição impressa, publicada em junho de 2021. 

Militante do PCdoB, participou das lutas do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal e foi pioneiro em Brasília, no final dos anos 70, dos movimentos de defesa da Amazônia e do Cerrado. Anos depois ele mesmo investiu todo o seu patrimônio na criação da Reserva de Patrimônio Natural Linda Serra dos Topázios, em Cristalina, no Estado de Goiás. Ali, ao longo de mais de uma década, Jaime montou uma biblioteca fabulosa sobre o

Jaime Sautchuk ganhou o prêmio Vladimir Herzog de com o vídeo independente Balbina, Destruição e , que retratou a devastação do território do povo Waimiri-Atroari pela desastrosa construção da usina hidrelétrica no rio Uatumã, no Estado do Amazonas. Na Revista Xapuri, fez questão de que primeira a matéria de capa fosse sobre os indígenas isolados, por considerá-los os mais vulneráveis. 

Sautchuk escreveu livros de ficção (Mitaí e Antologia Profética), de reportagem (Projeto Jari – A Invasão Americana; A Guerrilha do Araguaia; Descaminhos do Futebol; O Socialismo na Albânia: um repórter brasileiro no país de Enver Hoxha) e de não-ficção (O Dom de Francisco (sobre o chef do restaurante Dom Francisco); Cruls: Histórias e andanças do cientista que inspirou JK a fazer Brasília; Para Ler Cristovam Buarque (sobre as ideias do ex-governador do Distrito Federal); O Causo eu Conto – sobre Bernardo Élis e o Brasil Central.

No formato e-book Jaime deixa pronto Por um Mundo sem Venenos (disponível na lojaxapuri.info) e um outro, Escorre Ouro em Paracatu (sobre a mineração em Goiás nos dias atuais) em fase final de produção. Ultimamente, Jaime estava envolvido na finalização do O homem que fundou uma cidade (sobre a história da criação da cidade de Alexânia, em Goiás) e na celebração dos seus 50 anos de jornalismo, no ano de 2022. 

Jaime deixa dois filhos, Carlos e João Miguel, e uma filha, Rosa, do primeiro casamento com a jornalista Vera Lúcia Manzolillo. Foi casado também com a socióloga Adinair França  (já encantada) e a veterinária Cláudia Costa Saenger. O velório será nesta sexta-feira, de 8 às 10h, no Cemitério Campo da Esperança, em Brasília, com a presença de familiares e amigos, observando-se as regras sanitárias de proteção do Covid. Em seguida, o corpo será cremado, apenas com a presença de familiares, em Valparaíso de Goiás. 

Antonio Carlos Queiroz – Jornalista. Zezé Weiss – Jornalista.

Revista Xapuri Prmeira Capa

Revista Xapuri – Edição 01: Foto Zezé Weiss.  Fotos do Jaime: Cláudia Saenger. 

REVISTA XAPURI
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso um veículo independente e democrático de informação.  Resolvemos fundar o nosso.  Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, tipo voluntário. 

Jaime propôs um jornal, eu uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta). Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em  uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão dar um jeito de imprimir.

A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial. Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/ra pessoalmente (até a doença agravar,  nos últimos meses, fez questão de manter essa tarefa). Rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. O resto é história. Trilhamos uma linda jornada.
Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensamente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Na última sexta-feira, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava cansado da doença e da tragédia que o Brasil enfrenta. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Gratidão, Jaime!
Zezé Weiss


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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