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Seguir Esperneando: A Dor da Fome – Episódio 14

Seguir Esperneando: A Dor da Fome – Episódio 14

❤️ LIVE SOLIDÁRIA A DOR DA FOME SEGUIR ESPERNEANDO – LANÇAMENTO DO EPISÓDIO 14 ⏰ Dia: 05/10, às 21h 📍 Mediador: Duda Meirelles 🗣️ Participação: 📌 Maurício Falavigna – Colunista do Reconta Aí


SEGUIR ESPERNEANDO – O PODCAST DA LUCÉLIA SANTOS

EPISÓDIO 14 –  A DOR DA FOME

Eu sou Lucélia Santos e você está no “Seguir Esperneando”, o meu podcast em parceria com a Revista Xapuri.

Neste décimo quarto episódio, “A Dor da Fome”, vamos botar o dedo na ferida e tratar de uma situação que nos mata de vergonha e indignação: Infelizmente, a fome no retomou aos patamares de 2014, ano em que conseguimos sair do Mapa da Fome da ONU.

Na quarta-feira, 22 de setembro, o Jornal EXTRA estampou na capa a imagem visceral das consequências deste retrocesso injusto e cruel: a foto de um caminhão, cercado por dezenas de pessoas garimpando ossos e pelancas de carne, no bairro da Glória, na cidade do Rio de Janeiro, chocou o país. 

Milhares de pessoas, incluindo intelectuais e políticos, postaram mensagens de protesto nas . O senador Humberto Costa, do PT de Pernambuco, citou o conteúdo da reportagem, publicada com o título “A Dor da Fome”,  na CPI da Covid,  no Senado da República.

O caminhão de ossos da Glória parece ter, enfim, mexido com os brios de uma que colhe os resultados da dupla tragédia do golpe de 2016 e das eleições de 2018: Um Brasil onde 116,8 milhões de pessoas sofrem com algum grau de insegurança alimentar; 43,3 milhões não tem acesso suficiente a alimentos; e 19 milhões, literalmente, passam fome, conforme levantamento da Rede Penssan. 

POR QUE 19 MILHÕES DE PESSOAS PASSAM FOME

Duda Meirelles:

Eu sou Duda Meirelles e estou aqui para refletir, junto com a Lucélia Santos,  sobre a situação da fome que,  após seguidos recuos por mais de uma década, voltou a crescer em todas as regiões do nosso país.

O aumento da fome no Brasil foi impactado pela pandemia,  como em outros países, mas não é só efeito da Covid-19. A insegurança alimentar brasileira já vinha se agravando desde o golpe de 2016, bem antes do coronavírus.

O alastramento da miséria no Brasil é consequência do desmonte ou do fim dos programas sociais de inclusão social e da defasagem na cobertura e nos valores do programa Bolsa Família. Essa ação deliberada de descaso e omissão viola o direito social à alimentação, garantido pela Constituição de 1988.

Os dois  governos pós-golpe de 2016 fizeram o dever de casa para trazer a fome de volta: desidrataram o Programa de Aquisição de Alimentos; extinguiram o Programa de Cisternas; acabaram com os estoques estratégicos de grãos;  paralisaram a Reforma Agrária;  descontinuaram os programas de redistribuição e garantia de renda básica.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Lucélia Santos:

O Progama Fome Zero, criado em 2003, no primeiro ano do mandato do presidente Lula,  é considerado até hoje pela ONU como um dos programas de combate à fome mais bem-sucedidos no todo.

Combinado com as políticas de valorização do salário mínimo e de distribuição de renda, como o Bolsa Família, o Fome Zero fincou as raízes da política de Estado que retirou o Brasil do Mapa da Fome em 2014.

Conforme dados do Instituto de  Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Bolsa Família, também implantado por Lula, em uma década e meia reduziu a pobreza em 15% e a extrema pobreza em 25%.  

Segundo o Ipea, o programa conseguiu controlar os casos mais graves de insegurança alimentar e, pela primeira vez na  do Brasil, a fome deixou de ser uma tragédia nacional.

Para o padre Julio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua de São Paulo, a  crise humanitária da fome se agudiza devido à crescente impossibilidade do acesso à alimentação em quantidade e qualidade, causada pelo desarranjo da política social brasileira.

Pragmático, o padre Julio vê como solução a ação conjunta de solidariedde com luta política: 

“Com uma mão a gente dá o pão, e com a outra a gente luta. Eu não posso dizer para quem está faminto agora: Vamos esperar a transformação social acontecer, a justiça se instalar. Até lá, ele morreu. Então, eu preciso dar o pão para ele agora, porque ele tem fome, tem pressa. Mas, tenho que continuar lutando, não posso perder o horizonte da luta. Fome só se erradica com com .”

DESIGUALDADE

Duda Meirelles:

A dificuldade para colocar comida na mesa é maior entre as famílias chefiadas por mulheres e por pesssoas pretas ou pardas.

Existe fome em 11,1% dos domicílios chefiados por mulheres, e outros 15,9% enfrentam insegurança alimentar. Pessoas pretas ou pardas  passam fome em 10,7% dos domicílios. Nos dois cenários, a fome se agudiza entre as pessoas desalentadas, desempregadas ou com renda per capita abaixo de um salário mínimo.

O desemprego ficou em 14,1% no segundo trimestre de 2021, atingindo 14,4 milhões de pessoas. O subemprego chegou a 22%, e o trabalho informal a 49,30%, totalizando 86% da força de trabalho.

Essa massa de gente desempregada abriga 41% da nossa população abaixo da linha de pobreza, sem acesso regular à alimentação básica.

Dos 41%, apenas 12,6% são  identificadas pelo IBGE como pessoas brancas. As outras 28,4% são pessoas pretas ou pardas.  

Os dados da desigualdade, coletados pela Rede Penssan, não deixam dúvidas: é no estômago do povo preto que a fome bate mais forte.

PANDEMIA  

Lucélia Santos:

Conforme dados do grupo de pesquisa Alimento para Justiça: Poder, Política e Desigualdades Alimentares na Bioeconomia,  a insegurança alimentar alcançou 125,6 milhões de pessoas, o que equivale a 58,3% da população brasileira, desde o começo da pandemia.

Em 2020, 23,5% da população deixou de comer ou precisou a reduzir a quantidade e a qualidade dos alimentos ingeridos por falta de dinheiro. O número de pessoas passando fome aumentou de 10,3 em 2018 para para 19,1 milhões em 2020.

Segundo pesquisa da Rede Penssan, passa-se mais fome no Norte – 18,1% dos domicíllios, e Nordeste –  13,8%, do que em outras regiões. Nas outras regiões do  país, os percentuais não chegam a 7%, ficando abaixo da média nacional de 9%.

No campo, a situação é mais ainda mais crítica – a fome alcançou 12% dos domicílios na área rural, contra 8,5% em área urbana. Sofre mais quem tem menos acesso à água: a fome dobra, passando de 21,1% para 44,2%, quando as famílias não têm água para produzir o próprio alimento.

Mas não são  só os mais pobres que foram impactados pela insegurança alimentar durante a pandemia. Comparando os dados do IBGE de 2018 e 2020, a Rede Penssan registra que  a proporção de domicílios em situação de insegurança alimentar leve quase dobrou, passando de 20,7% para 34,7%. Ou seja, a classe média também é mais poupada dos efeitos da fome.

AUXÍLIO EMERGENCIAL

Duda Meirelles:

Em mil dias, o governo Bolsonaro não apresentou nenhum programa estrutural de combate à desigualdade, à miséria e à fome. O auxílio emergencial foi criado em abril de 2020 com o objetivo apenas de atender pessoas vulneráveis afetadas pela pandemia de Covid-19.

Concedido inicialmente a 68 milhões de pessoas, ele foi pago em cinco parcelas de R$ 600 ou R$ 1,2 mil para mães chefes de família e, depois, foi reduzido pela metade estendido até 31 de dezembro de 2020, em até quatro parcelas de R$ 300 ou 600 cada.  Entre janeiro e março de 2021, não houve pagamento do auxílio, e a população que vinha sendo atendida ficou desamparada.

O auxílio voltou a ser pago a partir de abril de 2021, mas para um público mais restrito, de 40 milhões de pessoas,  e em valores ainda menores: variam de R$ 375 a R$ 150. Em julho de 2021, foi prorrogado por mais quatro meses. A última parcela do auxílio emergencial, com valor médio de R$ 200, será depositada pelo governo federal em outubro de 2021.

Para substituí-lo, Bolsonaro promete reformular o programa Bolsa Família, trocando o nome para  Auxílio Brasil, aumentando o valor médio do benefício, de R$ 190 para R$ 300, e a abrangência, de 14,7 milhões para 17 milhões de famílias. 

O governo não conseguiu ainda definir a dotação orçamentária para a efetiva implementação do programa, nem o seu modelo operacional. Segundo reportagem da Folha de São Paulo, 400 mil famílias estão na lista de espera do Bolsa Famíliasem nunca ter recebido o o auxílio emergencial.

SOLIDARIEDADE

Lucélia Santos:

 Com a volta da fome, a tábua de salvação do povo pobre tem sido a solidariedade. Desde 2020, ano em que o Brasil foi apontado pelo Instituto Lowy como o pior país na gestão da pandemia, os movimentos populares intensificaram suas ações solidárias em socorro de quem tem fome.

Do começo da pandemia até julho de 2021, a campanha Solidariedade sem , organizada pelo MST, doou 1 milhão de marmitas e 5 mil toneladas de alimentos, em escala nacional.

 “Entregamos o equivalente a 1 mil caminhões cheios de alimentos nas periferias urbanas e nas comunidades rurais por todo o país para combater a pandemia da fome no Brasil”, registra o movimento em sua página na internet.  

Em 1993, Herbert de Souza, o Betinho, fundou a Ação da Cidadania contra a fome, uma entidade para lutar por direitos sociais, começando pelo direito à alimentação, tendo por principal atividade coletar e distribuir alimentos para matar a fome.

Com o sucesso dos programas de inclusão social nos governos Lula e Dilma, a Ação da Cidadania interrompeu a distribuição de cestas básicas.  Desde 2017, a maior rede de solidariedade no combate à fome no Brasil, voltou a coletar doações e a distribuir cestas básicas em todo o país.

O padre Julio Lancellotti diz que a solidariedade da sociedade civil com as pessoas que passam fome representa uma aposta num ciclo de esperança que precisa ser reaberto, depois desse tempo de pandemia e retrocessos.

Eu sinto que o povo está muito cansado, não aguenta mais. Então, a fome é de comida e de sentido de . Se, o pouco que tenho para comer, eu como triste e angustiado, isso não me sustenta. É preciso comer com esperança,” completa o padre Júlio.  

SEGUIR ESPERNEANDO

 Duda Meirelles:

“Seguir Esperneando” é mais um espaço de resistência da Revista Xapuri, construído em parceria com a atriz e militante Lucélia Santos.

Este episódio, “Quem tem fome, tem pressa”, resulta do esforço coletivo de Agamenon Torres; Ana Paula Sabino; Janaina Faustino; Lucélia Santos;  ; e eu, Duda Meirelles.

O roteiro deste podcast foi construído por Zezé Weiss, com base e utilizando excertos das seguintes matérias: “A Dor da Fome”, do Jornal Extra; “A fome como político”, de Mauricio Falavigna; Josué de Castro e a descoberta da fome: por sua filha Anna Maria de Castro”, de Leonardo Boff, e  “Não é só o efeito da pandemia: por que 19 milhões de pessoas passam fome”, por Laís Alegretti/BBC News Brasil.

Os dados estatísticos foram organizados por Ana Paula Sabino e são da Organização das Nações Unidas para a Agricultura – FAO; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Oxfam Brasil; e Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – Rede Penssan.

 “Seguir Esperneando é patrocinado por: Bancários-DF – Sindicato dos Bancários de Brasília; Fenae – Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal; Fetec-CUT Centro Norte – Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Centro Norte; e Sinpro/DF –Sindicato dos Professores no Distrito Federal.

Colabore com a Xapuri. Visite nossa loja solidária em www.lojaxapuri.info, ou faça uma doação via pix:  www.contato@xapuri.info.

Até o próximo episódio do “Seguir Esperneando”!

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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