O morro ameaçou descer

O morro ameaçou descer. Deu intervenção militar no Rio de Janeiro

Intervenção Militar: O medo do morro traz de volta os generais 

Por Guilherme Coutinho/Brasil 247

O morro ameaçou descer e os generais assumiram o controle da segurança pública do Rio de Janeiro. Utilizando-se de uma das medidas mais drásticas existentes no ordenamento jurídico brasileiro, a intervenção federal, Michel Temer colocou as Forças Armadas no comando das polícias (civil e militar), além do Corpo de Bombeiros do estado fluminense.

O aumento da violência durante os dias de carnaval –infelizmente, recorrente como ressaca em quarta-feira de cinzas – não justificaria ato tão extremo, sobretudo após o término da folia. Nem mesmo momentos delicados como copa do mundo, olimpíadas, chacinas de crianças e guerra de traficantes mereceram ato tão extremo. Mas a ameaça da descida do morro para participação política amedrontou o governo golpista: os generais estão de volta.

O decreto de intervenção, competência da Presidência da República, tem validade imediata e deverá ser submetido ao Congresso Nacional em 24 horas para a deliberação, em sessão conjunta. O Presidente do Congresso, Eunício Oliveira, já sinalizou que convocará a sessão de deputados e senadores e que não deve haver impedimentos políticos para a aprovação da medida.

Na prática, o Rio de Janeiro terá dois governadores, um civil e um militar: Luiz Fernando Pezão e o General Braga Neto, interventor escolhido por Temer para ser o braço forte do Estado no Palácio da Guanabara. Uma nova etapa do golpe acaba de começar.

A verdadeira motivação para intervenção, não foram os assaltos durante o reinado de momo, mas, sim, o medo de uma possível comoção social vindoura que pode abalar, de baixo para cima, as estruturas da República. A faixa na entrada da Rocinha, que motivou mais faixas em outras comunidades cariocas, prometendo descer em caso de prisão de Lula, mostrou a força do povo que, se unido, é uma fortaleza inabalável. Um outro indício sintomático de tenção revolucionária foi um saque a um supermercado que não foi impedido pela polícia, afinal ninguém deve mesmo ser impedido de comer.

Militares são treinados para guerra e não para tempos de paz, e é para isso que o governo parece estar se preparando. O morro ameaçou descer, o povo ameaçou reivindicar seus direitos e a repressão militar voltou em um piscar de olhos.

A situação da autoridade desmedida do governo golpista e do Poder Judiciário pode ter chegado a um extremo que a população não mais aceitará. Michel Temer pode ter pensado em reprimir uma revolução popular, de forma preventiva, demonstrando o medo legítimo que os governos ilegítimos devem ter de seu povo. E que as classes menos favorecidas (as mais prejudicadas pelas reformas golpistas) entendam de uma vez seu poder sobre os rumos da nação.

 

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Foto: SN Notícias 

Fonte desta Matéria:  Guilherme Coutinho, n Brasil 247:  Intervenção no Rio: o medo do morro traz de volta os generais

 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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