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Mulheres Negras: Coragem, Militância e Resistência

Carolina de Jesus atarde.uol .com .brA militância das mulheres negras: minoria e resistência

Debate acerca da representatividade da negritude feminina na política volta à tona com o assassinato de Marielle Franco

Por: maria-maria

Num país com 54% da população negra, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é um paradoxo a sumária minoria de mulheres negras em papéis de representação social e política. Durante as eleições municipais de 2016, a candidatura de mulheres negras não chegou a 1%, de acordo ao Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Nas candidaturas ao cargo de vereador, essa porcentagem foi de 2,64%. E na Câmara dos Deputados, elas são hoje apenas 0,39%. A morte da vereadora Marielle Franco, no mês de março, reacendeu a discussão do caminho trilhado pelas mulheres negras que se dedicam às atividades políticas.

Na câmara legislativa de Vitória da Conquista, 85,7% dos vereadores são homens, ou seja, 18 num total de 21 eleitos. As outras três vagas são ocupadas por mulheres, mas apenas uma delas é negra: Nildma Ribeiro Lima, 39 anos.  A vereadora é militante de movimento social, moradora do bairro Patagônia há 30 anos e ressalta que “há necessidade de mais mulheres, principalmente negras, nos espaços políticos”.

No entanto, a ocupação desses espaços é uma tarefa difícil quando se avalia o lugar reservado à mulher negra ao longo da história brasileira. Para Alessandra Leal, 27 anos, militante do Coletivo Pretas da Dió, existe um empecilho social para a participação da mulher negra nas atividades políticas representativas. “Como a mulher negra pode se enxergar numa representação hierárquica na política sendo que ela tem que estar preocupada (primeiro) em sobreviver?”.

Os locais onde as mulheres negras moram também não contribuem para uma participação mais ativa. Elas vivem, em sua grande maioria, nas periferias das cidades. Nesses lugares, a ausência do aparato público, como escolas, postos de saúde, transporte gratuito, esgotamento sanitário, impossibilitam um cotidiano com tempo, conhecimento e qualidade de vida para a atuação política. “Na periferia só chegam políticas paliativas. Na zona rural só chegam políticas paliativas. Não se vislumbra políticas que tendem de fato a mudar a perspectiva daquelas mulheres”, diz Juliana Oliveira, estudante quilombola do oitavo semestre de Direito da Uesb.

Aquelas que chegam ao cenário político lutam praticamente sozinhas contra a precarização no mundo do trabalho, as condições de vida insalubres, os altos índices de mortalidade e os estigmas em relação aos seus sentimentos e sua feminilidade. “Ser militante negra dentro desse contexto social em que estamos inseridos é solitário. Isso porque os movimentos, hoje em dia, estão muito mais separados, muito mais individuais, e isso dificulta a militância. Ao invés de vários movimentos se unirem em prol de uma causa só, tem-se vários movimentos que buscam seu objetivo particular”, diz Juliana.

Resistência e luta

A morte de Marielle Franco, que assim como Nildma, Juliana e Alessandra, era mulher negra, cria de comunidade carente e uma voz presente na luta pelo respeito aos direitos humanos e pela garantia de cidadania aos moradores da favela, se tornou um combustível na discussão sobre o lugar de submissão e de silêncio das mulheres, principalmente as negras. A socióloga e militante, que era contra a intervenção militar e criticava as ações violentas da polícia nas comunidades negras e periféricas, foi assassinada a tiros no Rio de Janeiro.

sessao25 mai 49“Ao realizar nosso trabalho no espaço institucional, ainda enfrentamos muito machismo e preconceito”, diz vereadora Nildma Ribeiro Lima. Foto: Ascom Câmara VCA.

Nildma ressalta que a morte de Marielle só reforçou a luta por mais espaço das mulheres negras. “Para as mulheres terem direito ao voto foi uma luta. Para se candidatar, outra luta. Para estar na política, uma luta maior ainda. E o pior, tentar permanecer, porque, ao realizar nosso trabalho no espaço institucional, ainda enfrentamos muito machismo e preconceito”, diz a vereadora.

Juliana, que também é secretária e colaboradora da Oficina de Estética Negra, ação promovida pela Associação das Comunidades Periféricas de Vitória da Conquista (ACPVC), relacionou a baixa autoestima da mulher negra com o estigma de “objeto sexual” condicionado pela mídia, que expõe o corpo negro atrelado a vulgarização e sexualização.

Na oficina, coordenada pela militante, as participantes aprendem sobre empoderamento feminino e negro para possíveis mudanças de comportamento. “Mesmo assim, a gente percebe que o protagonismo negro ainda é muito tímido. Precisa-se de políticas, de apoio e de mais ativistas no movimento para mudar esse cenário”, enfatiza.

Outra característica da militância das mulheres negras é a defesa de um feminismo direcionado a elas. Juliana tem atuado na universidade nessa frente de luta. O cotidiano universitário, além da formação, se transforma num espaço de enfrentamento. “Para pessoas como eu, que vim do quilombo, somos privilegiadas por estar na universidade”, afirma.

Mulheres negras em ação

Mesmo sem grande representativade política em Conquista, as mulheres negras têm realizado ações significativas na cidade. Nem os recursos escassos nem a ausência de apoio do poder público municipal e estadual tem inviabilizado por completo as ações dos coletivos negros em bairros periféricos e presídios. De forma pontual, elas marcam espaço e defendem mais cidadania entre a negritude feminina.

Juliana familiarizou-se com a pauta negra quando frequentava um cursinho pré-vestibular para jovens quilombolas entrarem na universidade. Ela e alguns primos criaram a ACPVC com o objetivo de atuar por meio de oficinas de argila, beleza e estética negra e de informática junto a adolescentes e jovens, com faixa etária entre 12 e 29 anos, que tinham relação com o tráfico e com a prostituição.

O cursinho pré-vestibular foi realizado até o ano passado por meio da parceria com a Brazil Foundation, organização filantrópica que atua como ponte entre doadores e organizações sociais. No momento, a ACPVC busca parcerias para dar continuidade ao projeto, especialmente, conseguir transporte para os estudantes.

Alessandra 1Alessandra Leal é também estudante do curso de Ciências Sociais da Uesb. Foto: Arquivo pessoal.

O “Coletivo Feminista Negro Pretas da Dió” é outro projeto encabeçado por mulheres negras militantes de causas sociais. Criado em 2014, na Uesb, inicialmente como um grupo de estudo, as participantes viram suas ações de conscientização ultrapassar os muros da universidade. Alessandra Leal, estudante ativa no coletivo, diz que “o principal objetivo do grupo era, por meio de leituras e discussões, compreender o lugar da mulher negra e seu corpo na sociedade”.

Atualmente, as integrantes promovem debates, participam de mesas de debate como palestrantes ou eventos para formação política. Além da compreensão da sociedade e do lugar da mulher negra, o coletivo luta por igualdade racial, pelo protagonismo negro, ainda que não institucionalizado. Coletivos como o “Pretas da Dió” provam que a luta da mulher negra sobrevive por meio de iniciativas e do esforço de uma minoria engajada por fazer a diferença na sociedade e transformar a realidade.

Fonte: https://avoador.com.br/maria-maria/a-militancia-das-mulheres-negras-minoria-e-resistencia/

Marielle frente do verso

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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