O QUE ACONTECERÁ EM MACEIÓ COM O COLAPSO DA BRASKEM?

O que acontecerá em Maceió depois do colapso das minas da Braskem?

A terra rachou primeiro em fevereiro de 2018, no bairro do Pinheiro, em Maceió. Sinal de alerta da natureza com a mineração, iniciada nos anos 1970 pela Salgema Indústrias Químicas S/A, que depois virou Braskem.

Por Zezé Weiss

Depois veio, em março deste ano, o tremor de magnitude 2,5. Mais rachaduras abriram mais crateras. Com danos irreversíveis no solo, mais imóveis tiveram que ser evacuados.

Desde 2018 até dezembro de 2023, mais de 14 mil imóveis precisaram ser abandonados, 60 mil pessoas perderam, até o momento, seus quintais, seus jardins, suas cozinhas, suas camas, suas vizinhanças, seus afetos, seus negócios.

No começo da tarde do domingo, 10 de dezembro de 2023, uma parte das minas da Braskem, a mina 18, segundo a Defesa Civil de Maceió, se rompeu e a terra no bairro Mutange, com tudo que estava sobre ela, afundou-se na lagoa de Mundaú.

Em nota, a Braskem informou, na noite do dia 10 de dezembro, que a exploração do sal-gema, autorizada pelo poder público, para a produção de soda cáustica e PVC, foi encerrada nas minas de Maceió no ano de 2019. A empresa informa também que passou a trabalhar para o fechamento e estabilização de todas as minas.

O que acontecerá em Alagoas? Seguirá a terra rachando por conta da exploração de sal-gema, de acordo com o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) em 2019? O que acontecerá com a vida, das pessoas, dos animais, de toda a natureza que causou toda essa instabilidade no solo, cuja Terra respondeu com cinco tremores, afetando tantas vidas somente no último mês de novembro?

zezeZezé Weiss – Jornalista Socioambiental. Foto: Divulgação.

 

 

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Imagens do Google mostram como a Braskem mudou a paisagem em Maceió

Uma das minas da empresa entrou em colapso nesse domingo (10), em decorrência da extração de sal-gema realizada pela mineradora; Braskem afirma ser a atual proprietária do que um dia foram espaços públicos

 
No último domingo (10), a região próxima à mina nº 18 da Braskem, em Maceió, iniciou um processo de colapso, consequência do afundamento de solo causado pela Braskem, atingindo cinco bairros da capital. Por meio de imagens de satélites, a Agência Tatu mostra a transformação na paisagem da região desde 2018.
A análise foi feita considerando o histórico disponibilizado pelo Google Earth, que reúne imagens de satélites de todo o globo. A reportagem utilizou como referência para a coleta  de imagens o local onde ocorreu o colapso, no bairro do Mutange.
Confira as alterações da Braskem na paisagem de Maceió no vídeo abaixo:

O vídeo mostra uma sequência de imagens registradas entre o ano de 2016 até 2023 em um mesmo ângulo da região do Mutange. Até março de 2019, as imagens mostram um cenário normal de uma região habitada com movimentação de veículos. Em março de 2020, já se percebe um vazio nas vias, principalmente ao longo da Avenida Major Cícero. Essa mudança coincide com a saída das famílias que aconteceu até abril daquele ano. 
Já na imagem de julho de 2020 é possível visualizar uma parte dos imóveis já sem telhado, inicialmente no trecho plano, e a transição entre as imagens causa um efeito gradativo do avanço da desocupação das casas e estabelecimentos comerciais até a parte alta. 
A maior mudança pode ser vista na imagem de dezembro de 2022 e na mais recente, de junho de 2023, quando é possível perceber que a área se torna totalmente vazia, com uma coloração de terra, principalmente na área que passou por terraplanagem. 

Impactos causados pela Braskem em Maceió

O professor de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Dilson Ferreira, elenca os impactos que as imagens denunciam:

  • Migração: “o afundamento de solo tirou as pessoas da região e formou um vazio urbano, uma cidade fantasma, com a migração de 55 a 60 mil pessoas, além de impactar indiretamente mais de 200 mil pessoas. Com essas imagens, é possível perceber  a ampliação do mapa de risco, um cenário de guerra”;
  • Problema ambiental: “a água está entrando na mina que colapsou e rompeu, se misturando com o sal de alta pureza. A gente não sabe ainda o risco para a Lagoa Mundaú. Pode afetar o sururu, toda fauna e flora”;
  • Falta de infraestrutura: “a mudança de uma população para outra área exige mais escolas, hospitais e toda infraestrutura necessária. Não é só um problema localizado dos cinco bairros, mas se expõe para toda a cidade e até para outros municípios”;
  • Aluguel em alta: “a grande procura por moradia em outras áreas da cidade ampliou o valor dos aluguéis”;
  • Mobilidade: “os carros que circulavam nas regiões diretamente afetadas, agora passam pela Avenida Fernandes Lima. Isso aumenta o fluxo e as pessoas passam mais tempo no trânsito”;
  • Social: “tivemos a retirada das vítimas à força, pessoas depressivas e casos até de suicídio”;
  • Econômico: “Comerciantes e empresas que encerraram as atividades”.
Mutange em 2018
Mutange em 2018
mutange em 2023
Mutange em 2023

Vítimas da mineração da Braskem

Questionado sobre o que as imagens representam para as vítimas, o presidente da Associação de Empreendedores e Vítimas da Mineração da Braskem em Maceió, Alexandre Sampaio, foi objetivo.
“É um cenário de terra arrasada. Essa devastação sistemática da Braskem, que começa com as minas, depois com o destelhamento das casas e finalmente a destruição delas, é o símbolo vivo de um crime sem precedentes na humanidade e também o símbolo da impunidade”, descreveu Sampaio.

O que a Braskem diz

A imagem mais recente da região mostra espaços que eram ocupados por imóveis e que agora compõem uma área deserta. A Braskem divulgou que o espaço passa por “atividades de terraplenagem para suavizar as inclinações da encosta, implantação de um novo sistema de drenagem integrado ao sistema existente e o plantio da cobertura vegetal que, além de contribuir  para a estabilização do terreno, ampliará a área verde de Maceió”.
Questionada se a propriedade de vias e espaços públicos que foram terraplanados também pertencem à empresa atualmente, a Braskem confirmou que sim e que a transferência da propriedade está prevista no Termo de Acordo para Apoio na Desocupação das Áreas de Risco, firmado em 2020 com o MPF, MPE e DPU. “A partir da desocupação dos imóveis das áreas de desocupação e monitoramento, a empresa assume sua posse, passando a adotar medidas para limpeza, conservação, controle de pragas e segurança patrimonial”, informou em nota.
A mineradora também acrescentou que, no acordo, “se compromete a não edificar nas áreas desocupadas para fins comerciais ou habitacionais’ e que “discussões futuras sobre a área e sua utilização poderão ser feitas a partir do Plano Diretor do Município”, afirmando que nenhuma decisão sobre o futuro da área caberá exclusivamente à Braskem.

 
 
 
 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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