Rede e círculo de mulheres: empoderamento e magia

Rede e círculo de : empoderamento e magia

Dani Bastos 

O que é uma rede?

Por “rede” entende-se um conjunto de entidades (que pode ser de objetos, materiais, pessoas) interconectados uns aos outros. De forma ampla e genérica, a rede serve para compartilhar recursos e/ou informações materiais ou imateriais entre cada uma destas entidades, de acordo com regras previamente definidas. Existem muitos tipos de rede – redes de transporte, redes sociais, redes elétricas, redes de pessoas – são alguns modelos.

Nas redes físicas, por exemplo, a estrutura é geralmente definida como um sistema de nós e elos que se interligam. Fazendo um paralelo com as redes de pessoas, cada pessoa é um “nó” ou um “elo”. A essência da rede de pessoas é o relacionamento estabelecido entre elas. É uma forma de organização onde se pode partilhar valores e objetivos em comum.

A partir da compreensão aqui colocada sobre a função social das redes, é possível aprofundar a reflexão sobre o motivo pelo qual em muitos grupos sociais onde há uma predominância da influência do patriarcado, ensina-se desde muito cedo que as meninas – futuras mulheres – julguem e denunciem umas às outras, que elas se digladiem entre si, que se vejam como rivais.

Esse “modus operandi” da do patriarcado é muito perverso porque a vigilância e o controle passam a não mais acontecer apenas de fora para dentro, ou seja, não são apenas os pais, irmãos, maridos, professores, padres, médicos e outros homens da sociedade a estabelecer e definir qual é o comportamento  “correto” esperado de uma mas também as outras mulheres passam a corroborar para reprimir a verdadeira e instintiva feminina e terminam por reproduzir a opressão. Dessa maneira, é muito mais difícil que as redes femininas sejam formadas.

O sistema dominante sempre quis manter a “ordem”. A “ordem” é tudo que é conhecido, delimitado, controlável, conveniente, domesticável. Alguns agentes sociais têm o potencial de causar a “desordem”, ou seja, se vierem a conhecer o seu verdadeiro poder ou força podem vir a romper a “ordem”. Daí a necessidade de controlá-los. As mulheres, com certeza, tem esse potencial, por isso o sistema patriarcal tem a preocupação e a necessidade de controlar nossos corpos, nossos pensamentos, nossos comportamentos, nossas vontades, desejos, até nossos sonhos.

Mas sempre existiram mulheres que preferem morrer a aceitar rédeas. São mulheres que não se deixam dominar em hipótese nenhuma. São as que acreditam em sua intuição. São as que seguem seu próprio ritmo. São as que respeitam seus ciclos. São as que dão ouvidos à sua voz interior. São as que deixam o coração falar mais alto. São as que resistem, as que persistem, as que ousam, as que lutam, as que agem. São as bruxas, as rebeldes, as loucas, as insubordinadas, as atrevidas, as perigosas.

Destaca-se aqui a importância das Redes de Mulheres. A rede de mulheres numa dimensão mais , tem como objetivo principal o estabelecimento de relações sociais e/ou profissionais entre as participantes. Serve para compartilhamento e troca de experiências, informações, saberes, conhecimentos, ideias, projetos e direitos. Um dos intuitos é fazer com que as integrantes sintam-se apoiadas, respeitadas, representadas e principalmente pertencentes a um coletivo onde podem falar, se expressar, participar de fato sem serem interrompidas, julgadas, podadas ou ridicularizadas.

Já numa dimensão mais espiritual e sagrada, a rede de mulheres funciona como um espaço de apoio emocional, de reencontro com as energias femininas, de religação com os elementos da natureza – , água, e ar – de transmissão de saberes através de histórias ancestrais, de conexões intergeracionais e atemporais, espaço de compreensão, de aceitação e de acolhimento, onde a mulher descobre que não é a única a sofrer inseguranças, medos, bloqueios, dúvidas ou solidão.

Algumas chamam de Círculo de Mulheres. Porque o círculo é considerado uma forma ancestral, mágica e simbólica – a roda sagrada – de intensa troca energética, que coloca todas em posição de igualdade, sem hierarquias, sem assimetrias, contrariando a ordem social dominante onde somos constantemente diminuídas, invisibilizadas, inferiorizadas e subjugadas. É [para algumas] a volta e celebração do útero como órgão mágico, criador em potencial, não apenas da biológica, mas da vida criativa e visceral em sentido amplo – plantas, projetos, pessoas, empreendimentos. É o despertar do potencial para o , para o crescimento, para o fazer florescer, para o frutificar.

É um dos primeiros instrumentos de cura e um dos primeiros passos para a reconstrução da autoestima feminina. A rede ou círculo de mulheres é de extrema  importância para o reestabelecimento dos vínculos, dos laços, para o reencontro com os pares e com a fonte geradora da inspiração e da para que mais e mais mulheres sejam fortalecidas, incentivadas e empoderadas. Afinal, juntas somos bem mais fortes.

 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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