1515Sou chão, sou terra, sou cerratense
Há beleza em nossa savana? O que me diz você? O Cerrado é belo para você?
Por Iêda Vilas-Bôas
Posso dizer, a partir da mirada de meus míopes olhos que o Cerrado é o lugar mais lindo do mundo, mas há que se ter sensibilidade para perceber suas minúcias.
O Cerrado vai se mostrando aos poucos. Não possui a exuberância das florestas tropicais, nem o apelo das paisagens beira-mar. Ele vai se mostrando, como nosso povo goiano, em pequenas saliências.
Qual de vocês já se debruçou sobre uma Caliandra, que em seu festivo carmim espraia alegria e vermelhidão por entre a vegetação coberta de pó? Qual de vocês já se deitou debaixo de um pé de sucupira florido e não cismou amores? A cor roxa de suas flores traz reminiscências… a Paixão de Cristo, a sua paixão, a minha, a de todos nós… Porque ser Cerratense é, sobretudo, ser apaixonado.
Qual de vocês não gastou tempo observando as proezas do urubu-rei e do caracará? E ver, ali, que a cadeia alimentar e a luta pelo seu topo recomeçam, instantaneamente, ao primeiro brilho do sol?
Para mim, ser Cerratense e falar de leituras, literatura e cultura que valorizam minha região me traz um enorme sentimento de pertencimento ao meu chão.
Sim, sou chão. Sou deste chão sarobento, cheio de toá, chão amarelo, chão poeirento. Sou chão, sou terra, sou Cerratense. Deste espaço geográfico amplio minha visão para múltiplos mundos e possibilidades, mas volto. Sempre!
É aqui que meu espírito mora. Talvez amarrado num pé de pequi carregadinho de bagos. Ou anda meu espírito preso pelas cagaiteiras, nos pés de mangaba, pelos jatobás, ou simples que seja preso nas ramadas das quaresmeiras em flor.
Iêda Vilas-Bôas (1963–2022) – Escritora Cerratense. Excerto do texto “A Literatura como forma de manutenção dos referenciais da Cultura Cerratense”, publicado originalmente no Portal Cerratense: http://cerratense.com.br/.
http://xapuri.info/ieda-vilas-boas-escritora-cerratense/