1964 e 8 de JANEIRO: PASSADO E PRESENTE SE ENCONTRAM NO BANCO DOS RÉUS

1964 e 8 de JANEIRO: PASSADO E PRESENTE SE ENCONTRAM NO BANCO DOS RÉUS

1964 e 8 de JANEIRO: PASSADO E PRESENTE SE ENCONTRAM NO BANCO DOS RÉUS

O Brasil chega aos 61 anos do golpe militar de 1964 em um momento crucial de sua história democrática. Enquanto o Supremo Tribunal Federal julga o ex-presidente Jair Bolsonaro e sete aliados militares por tentativa de golpe em 2022, a sociedade brasileira se vê diante de um espelho que reflete tanto as sombras do passado quanto os desafios do presente

Por Revista Focus Brasil

O julgamento histórico, que pode resultar em penas de até 43 anos de prisão para os acusados, não se limita ao aspecto jurídico – ele representa um acerto de contas com um ciclo de violência política que parecia ter ficado para trás, mas que ressurgiu com força nos últimos anos.

Na quarta-feira, 26 de março, o STF aceitou a denúncia contra Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados – entre eles generais, almirantes e ex-ministros – por liderarem uma trama antidemocrática após a derrota eleitoral de 2022. Os réus, que respondem por crimes como tentativa de abolição violenta do Estado democrático, podem pegar até 43 anos de prisão.

A sessão do STF que aceitou a denúncia contra Bolsonaro e seus aliados foi marcada por falas contundentes dos ministros. Cármen Lúcia, citando a historiadora Heloisa Starling, lembrou que “golpe não se faz em um dia”, traçando um paralelo direto entre os eventos de 2022 e o processo que levou ao golpe de 1964. 

Já Flávio Dino foi ainda mais enfático ao afirmar que “Golpe de Estado mata”, lembrando que as consequências de rupturas democráticas se estendem por anos, como bem mostra o caso do deputado Rubens Paiva, desaparecido durante a ditadura militar. A presença de familiares de vítimas do regime militar, como Ivo Herzog e Hildegard Angel, conferiu ao julgamento um peso simbólico ainda maior, conectando as lutas do passado com os combates do presente.

A ditadura militar (1964-1985) não foi um evento isolado na história brasileira, mas sim o ápice de um processo de militarização da política que remonta à Revolução de 1930. O regime que se instalou em 1964 combinou repressão política com um projeto econômico que, embora tenha promovido crescimento industrial, aprofundou desigualdades e concentrou renda. 

A transição para a democracia, marcada pela Lei da Anistia de 1979, deixou pendente a questão da responsabilização pelos crimes cometidos durante o regime – uma dívida histórica que hoje se reflete no debate sobre como lidar com os eventos de 8 de janeiro de 2023.

O governo Lula tem sido enfático em sua posição contra qualquer tentativa de anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 2023. Ministros como Luiz Marinho e Gleisi Hoffmann têm repetido que a responsabilização penal dos envolvidos é um “dever histórico” para a consolidação da democracia brasileira. Essa posição se choca, no entanto, com pressões de setores do Congresso que defendem um “esquecimento” dos eventos recentes – reproduzindo, em certa medida, o mesmo padrão que marcou a transição da ditadura para a democracia nos anos 1980.

O PASSADO QUE NÃO PASSA: O QUE 1964 E 2022 TÊM EM COMUM

O Brasil enfrenta hoje desafios que vão além do julgamento dos responsáveis pela tentativa de golpe. A herança do governo Bolsonaro inclui não apenas a militarização de pastas civis e a apologia à tortura, mas também uma crise econômica e social agravada por anos de má gestão. Enquanto isso, setores golpistas continuam ativos tanto nas Forças Armadas quanto no Congresso, alimentando campanhas de desinformação que minam a credibilidade das instituições democráticas. 

Nesse contexto, a defesa da democracia não pode se limitar ao campo simbólico – ela exige reformas estruturais que vão desde a área de segurança pública até o sistema tributário, passando por uma profunda revisão do papel das Forças Armadas na sociedade brasileira.

Os 61 anos do golpe de 1964 e o julgamento dos envolvidos na tentativa de golpe de 2022 representam dois momentos cruciais de uma mesma história. Se em 1964 o Brasil sucumbiu ao autoritarismo, em 2022 as instituições democráticas resistiram – mas a vitória ainda está longe de ser completa. 

Como bem lembraram os ministros do STF, a democracia não se celebra apenas no discurso: ela exige vigilância constante, memória ativa e, acima de tudo, a coragem de fazer justiça quando necessário. 

O Brasil tem hoje a oportunidade de virar uma página triste de sua história – não apagando o passado, mas aprendendo com ele para construir um futuro mais justo e democrático. Como publicou o STF em suas redes sociais: Lembrar para que nunca mais se repita

O Brasil tem, agora, a chance de virar essa página – sem esquecer as lições do passado, mas com os olhos no futuro.

Fonte: Revista Focus Brasil Fpabramo.org. Capa: Paulo Pinto/Agência Brasil

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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