Os amargos do Cerrado
A culinária do Cerrado, em especial a goiana, é salpicada de sabores amargos, muito comuns nas panelas de todas as classes sociais. Algumas iguarias são nativas, muitas já conhecidas do indígena que ali habitava. Outras são adotivas, chegadas de todos os cantos, às vezes de muito longe, vindas da África com os escravos, ou da Ásia com outros imigrantes.
Guariroba (ou gueroba), camargo, jiló, jurubeba, almeirão, alcachofra, rúcula, chicória, mostarda e pequi são alguns dos parceiros prediletos de arroz, cozidos, galinhadas, saladas, molhos, caldos e paneladas, em todo tipo de fogão. No mais das vezes, porém, as misturas não ocorrem por puro gosto, mas por alguma crendice que coloca nas plantas atributos que nem sempre elas têm de verdade.
A explicação mais plausível dos amargos na alimentação vem da medicina popular, em que os remédios amargos são os que curam mais rapidamente. Não importa se estão entre milhares de plantas nativas do Brasil ou se foram importadas. O boldo-de-Goiás, por exemplo, veio das savanas africanas do Benin e da Nigéria, embora o boldo mais comum seja aquele que nascia nos Andes chilenos.
É certo, contudo, que a vontade de comer e a fome sempre foram incentivadoras de descobertas dos amargos, como nos contam os primeiros colonizadores da região Central do país. Foi o que ocorreu, por exemplo, com os tropeiros do bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva Filho, o Anhanguera II, que vasculhou aquelas paragens desde os anos 1720.
O alferes Silva Braga, cronista da trupe de Anhanguera, após falar de peixes salvadores, relata: “Achamos também alguns palmitos que se chamam jaguaroba, que comíamos assados, e ainda que seja amargoso, sustenta mais que o mais”. Ele se referia, claro, ao palmito da palmeira guariroba, que consegue ser menos amargo do que o camargo, outro palmito, que é retirado de uma palmeirinha que nunca passa de 1,30 m de altura.
E o palmito guariroba segue alimentando os povos do Cerrado, junto com outros tantos amargos que por aqui se acham.