NOSSA SABEDORIA É A DOS RIOS

Nossa sabedoria  

Por Carlos Nejar

Nossa sabedoria é a dos rios.
Não temos outra.
Persistir. Ir com os rios,
onda a onda.
Os peixes cruzarão nossos rostos vazios.
Intactos passaremos sob a correnteza
feita por nós e o nosso desespero.
Passaremos límpidos.
E nos moveremos,
rio dentro do rio,
corpo dentro do corpo,
como antigos veleiros.

Carlos Nejar – Poeta, ficcionista, crítico literário. Quinto ocupante da cadeira nº 4 da Academia Brasileira de Letras (ABL), eleito em 24 de novembro de 1988, na sucessão de Vianna Moog. Nasceu em Porto Alegre (RS), em 11 de janeiro de 1939. Foto de capa: EBC. 

Rio Amazonas: Águas, Nomes e Mistérios

Amazonas. De todos os rios do mundo é o mais extenso. São mais de seis mil quilômetros. É também o mais caudaloso, o de maior volume de água. É um rio que sabe por onde vai e donde vem. Vem do fio de água que desde do lago Lauri, Lauricocha, na cabeça dos Andes.

Por Thiago de Mello

Ele desce do vilcanota e vai tomando corpo no Urubamba, um riozinho que canta de noite nas suas margens muradas pelas mãos dos Incas. Águas de barro, ele ganha no Ucayali; logo se engrossa no longo Maranõn, para abrir-se no caudal do Solimões, estendendo os incontáveis braços sinuosos pela selva peruana, mas já aprofundando a sua calha principal, para entrar no Brasil como mesmo nome, entre as árvores que vai arrancando das margens ao fragor das barrancos que se despencam.

RIO AMAZONAS: ÁGUAS, NOMES E MISTÉRIOS
Vista do rio Urubamba, a partir de Machu Picchu. Foto: Reprodução/Internet

Bem pertinho de Manaus, capital do estado que tem o mesmo nome do rio, é que ele passa a ser chamado Amazonas. A partir do lugar (dizem que ali a Iara aparece) onde se juntam as águas barrentas do Solimões com as brilhantes e pretas do Negro, é o chamado encontro das águas, que atrai turista do mundo inteiro para contemplar o mistério: as duas águas não se misturam, são como azeite e vinagre. Só que o Amazonas continua com a cor barrenta do Solimões, levando ímpetos e os rebojos do Negro.

__ Por que não se misturam? perguntei um dia ao sábio e querido caboclo Jari Botelho.

__ Os dois rios não se misturam porque são muito orgulhosos já demais.

O estado do Amazonas, espaço geográfico da nossa crônica, faz parte da Amazônia brasileira, também chamada Amazônia Legal, que abrange nove estados: Pará, Amazonas, Acre, Amapá, Rondônia, Roraima, Goiás, Mato Grosso e Maranhão.

Já a nossa Amazônia se inclui na Pan-Amazônia, que cobre de verde parte dos territórios da Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela e Guianas. 

São quase oito milhões de quilômetros quadrados de florestas e rios, com as suas borboletas, pirilampos, multidão de ´pássaros, milhares de peixes (estão classificadas mais de três mil espécies), orquídeas, cobras grandes e pequenas, coloridas e venenosas, bromélias rubras, árvores altíssimas centenárias, samambaias rasteirinhas, flores aquáticas lilases, campinas que cantam no vento, tudo recoberto pelo silêncio que desce das estrelas enormes.

Thiago de Mello – Poeta maior do Brasil e da Amazônia, em “Amazonas: Águas, Pássaros, Sereias e Milagres”, Editora Salamandra, 1998. Título original do texto: Os números (página 12). Foto de capa: UOL.  

RIO AMAZONAS: ÁGUAS, NOMES E MISTÉRIOS
Rios Negro e Solimões – Encontro das Águas. Foto: Rede Manaus Hotéis

OS RIOS AÉREOS DA AMAZÔNIA

Os rios aéreos da Amazônia

A preocupação com o desmatamento da Amazônia não deve ser apenas dos povos da floresta. Os mais respeitados estudos sobre mudança climática informam que a Amazônia é decisiva para a fertilidade das terras do Centro-Oeste, Sul e Sudeste do Brasil, além do norte argentino. Tudo por causa da umidade transportada para essas regiões.
Por Felício Pontes Jr.
Sobre o prosear com a natureza: “Qual é o problema?”
O professor Antonio Donato Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), apresentou no final de 2016 um trabalho em que faz a revisão de mais de 200 estudos sobre o clima e a Amazônia. Denominado O futuro climático da Amazônia, o relatório é um alerta impressionante sobre as consequências da destruição de nossa maior floresta.
Um dos segredos revelados é que no Brasil, ao contrário de outros países, não existem desertos na faixa do Trópico de Capricórnio (Centro-Sul). O motivo para a manutenção de círculos hidrológicos amigáveis nessa região é a Floresta Amazônica.
Basta olhar para o lado, onde o poder regulatório da umidade amazônica não chega por causa da barreira natural dos Andes. Ali está o deserto do Atacama, no Chile. Na mesma faixa ficam as maiores cidades do Brasil: São Paulo e Rio de Janeiro.
No relatório, o ecossistema amazônico é definido como uma bomba biótica, impulsionando umidade pelo céu do país e funcionando como o coração do ciclo hidrológico.  São os chamados “rios aéreos”, que despejam mais água no Centro-Sul do Brasil do que o rio Amazonas despeja no Oceano Atlântico.
Para o cientista, é preciso um esforço urgente para reverter a destruição do ecossistema amazônico.
Felício Pontes Jr. – Procurador da República. Autor livro “Povos da Floresta Esperança”, Repam-Paulinas, 2017.
Natureza, Ailton Krenak

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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