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“DEIXAR PARA AS CALENDAS GREGAS” AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

“DEIXAR PARA AS CALENDAS GREGAS” AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Há alguns anos, qualquer evento só se tornava importante no Brasil quando “passava” na Rede Globo. Vários momentos da história demonstraram isso, como a campanha das Diretas Já, a primeira campanha presidencial de Lula (contra Collor) e os inesquecíveis caras pintadas no Impeachment de Collor de Melo. 

Por Artur de Souza Moret  

Mas o que significa isso, de fato? É simples de explicar. O Monopólio (uma empresa domina o mercado) e o Oligopólio (poucas empresas dominam o mercado) de uma atividade econômica produzem vantagens competitivas, assim as características e as regras são muito diferentes das demais formas de negócio, inclusive as regras básicas da economia de oferta e procura. 

A Rede Globo, até a década de 1990, era um monopólio, pois dominava o mercado, dava as regras, induzia tendências e, sobretudo, vendia o que era de seu interesse. O Oligopólio produz falhas no mercado, sobretudo na competição e nos desejos dos consumidores. Assim, o mercado do petróleo está pautado pelo Oligopólio. 

Os resultados da COP 28 (Dubai/2023) deu mostras de que foi a mais importante de todas as 27 realizadas até o momento, porque deu o tom do que está por vir, ou seja, nada vai mudar na produção e consumo de hidrocarboneto no mundo, por uma simples razão: o Oligopólio do petróleo não tem interesse.

Vale destacar que para o movimento ambiental, que briga para impedir o aumento da temperatura da Terra, e para o movimento positivo e necessário de diminuição do consumo de crude oil foi uma lástima ou mesmo uma tragédia, mas demonstrou que diminuir o consumo não é o caminho que o mercado vai impor; e qual será o caminho?

As primeiras COPs só interessavam aos ambientalistas, mas ao longo do tempo a pressão popular e o lobby ambiental transformou o tema da Climate Change, fez ganhar força, alavancou a abrangências e os encontros (COPs) caminhavam para colocar um freio no consumo de insumos que emitem gases de efeito estufa (GEE).

Entretanto, a COP 28 jogou um balde de água fria na pretensão dos otimistas ou até daqueles sonhadores que achavam que poderiam frear o Capital, este foi o ponto de inflexão e é importante entender o porquê.

Até a década de 1970 eram as “sete irmãs” (Royal Dutch Shell, Anglo-Persian Oil Company (APOC), Esso, Standard Oil of New York (Socony), Texaco, Standard Oil of California (Socal) and Gulf Oil, que dominaram por décadas as decisões sobre o petróleo; entretanto, um grupo de países surgiu em 1960 para fazer frente ao oligopólio. 

A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), que atualmente conta com 13 membros (Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Irã, Iraque, Líbia, Kuwait, Nigéria, Argélia, Angola, Gabão, Congo, Guiné Equatorial e Venezuela) pôs fim ao domínio das “sete irmãs”.

A mudança de um grupo para outro é uma prática normal do Capitalismo, como disse Marx: o Capital se reinventa nas crises, ou seja, nada diferente do que “se reinventar” e dominar o mercado.

 

Hoje já há outro grupo das “novas sete irmãs”, que detém ⅓ do mercado de petróleo mundial (Saudi Aramco; Gazprom (Rússia); China National Petroleum Corporation; National Iranian Oil Company; Petróleos de Venezuela; Petronas (Malásia); Petrobras); o Oligopólio da indústria do petróleo é uma regra, muda de mãos, mas as decisões não passam pelas regras tradicionais da economia e sempre motivados pelas crises.

Dando salto de décadas, em 2023 se configurava outro momento de crise no mercado do petróleo, se a COP 28 impusesse a diminuição do uso de petróleo, este foi o problema: diminuir o ritmo de consumo de petróleo. O mercado de petróleo é oligopolizado e é incoerente com o mercado de petróleo diminuir a acumulação e reprodução.

Um belo e terrível livro, Confissões de um Assassino Econômicos, de John Perkins (2004), mostra como o capital e as grandes corporações funcionam para retirar do caminho os críticos e eliminar as críticas sobre obras e projetos de interesse, usando lobby, poder político e dissuasão.

Nesta COP 28 não foi diferente, havia mais de 1.300 participantes declaradamente atendendo aos interesses da Indústrias do petróleo, gás e carvão, e ainda mais grave foi o fato da COP 28 ser o presidente da mega empresa de petróleo do Catar. A indústria do petróleo se organizou, influenciou e não deixou definir data para a diminuição do consumo de crude oil.

E é fácil entender: a OPEP e as “irmãs do petróleo” são um oligopólio e as regras são elas que impõem ao mercado, seja no preço, seja na produção. O que importa ao capital é a reprodução e a acumulação, não importa COP, não importam as mudanças climáticas. Ou seja, a COP 28 mandou as calendas às mudanças climáticas. Pelo dito popular,

“Deixar para as calendas gregas” significa “deixar para uma data muito distante, é adiar a solução de alguma coisa para um tempo que nunca há de vir”. E mais uma vez o Capital venceu, não importa o que está acontecendo no mundo, as mudanças climáticas não interessam.

O QUE SERÁ DO MUNDO?

Para o Capitalismo nada muda se não diminuir o consumo de hidrocarboneto. Entretanto, pode mudar, se o capitalismo encontrar algo que possa continuar se reproduzindo, mas ainda não se descobriu um substituto que possa reproduzir e acumular.

Para a sociedade há algo que é importante entender: não temos para onde “correr” se o Capital não deixar. Um exemplo, caso todos nós decidamos reduzir o uso de combustível, produziremos um impacto grande na indústria do petróleo, isso é certo. 

Mas podemos imaginar como eles podem se reorganizar, e provavelmente vão diminuir os custos e teremos combustíveis baratos, vamos ficar acostumados e muitos podem até dizer que ganhamos a guerra, mas não é verdade, quando voltarmos a consumir, os preços retornam aos padrões atuais.

Também é importante observar que a Indústria tem muita gordura para queimar; os ganhos da indústria do petróleo são muito elevados, tem-se indícios que o custo do preço do barril é em torno de US$ 10 e hoje o preço do barril é de US$ 77/barril, ou seja, o ganho é de 770%.    

Acredito que para a sociedade sobra pouco, mas temos que agir, porque temos que pensar nos próximos passos para não perecer nas catástrofes, nas doenças que se avizinham, nas graves alterações do clima, com a fome ou mesmo sendo torrados com as altas temperaturas.

A adaptação é uma nova etapa de aprendizagem, o que poucos sabemos e que é urgente! Segundo o IPCC (2014): “Adaptação à mudança do clima relaciona-se ao processo de ajuste de sistemas naturais e humanos ao comportamento do clima no presente e no futuro”.

Então, está na mesa o trabalho futuro: ajustar os sistemas naturais e humanos e evitar danos das mudanças climáticas. Esta será a pauta dos ambientalistas, dos Cientistas do Clima, ou seja, deverá ser um exercício duro porque os efeitos já estão aí e se preparar (para um efeito) quando ele já bate às portas é grave.

Já demos alguns passos, o Plano Nacional de Adaptação às mudanças climáticas foi feito no Brasil em 2016 (lançado em 10 de maio de 2016, por meio da Portaria no 150) e já é um caminho, mas precisa ser revisto e precisa ser retomado. 

Apresento aqui algumas propostas que já são indicativas de como devemos proceder: elaborar estratégias setoriais e temáticas de gestão de risco; atuar nas áreas de segurança alimentar e nutricional, hídrica e energética; perseguir as metas nacionais de desenvolvimento socioeconômico e de redução das desigualdades regionais; promover a capacidade de adaptação do Governo Federal; desenvolver ações para a redução dos riscos associados à mudança do clima.

Não temos o que fazer a ser não desistir de mudar a sociedade atual, mas temos que nos adaptar, e o momento é agora.

artur de souzaArtur de Souza Moret Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Ambiental (IPDA).  Foto: Divulgação/ Mahmoud Khaled.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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