SEMPRE UM REBELDE

SEMPRE UM REBELDE

SEMPRE UM REBELDE

Nosso salve e nossa homenagem ao grande e rebelde militante Athos Pereira.

Rodrigo Brito – Presidente

É uma honra, é um dever, é uma missão essa homenagem ao Athos Pereira. O meu primeiro contato com a trajetória deste grande militante começa por meio do Hamilton Pereira, o Pedro Tierra, quando estivemos presos no DOI-Codi de Brasília, no PIC, e o Hamilton me contava histórias sobre o irmão dele, o Athos Pereira.  

Ao sair da prisão, fiquei um período na reestruturação da esquerda, do PT, e fiz, à época, alguns contatos na reconstrução da UNE, no período da democratização. Numas das viagens que fiz nessa época, fui a Goiânia, conheci o Athos pessoalmente e falei pra ele: eu já conheço você de nome pela admiração que seu irmão refletia sobre você, quando a gente estava incomunicável no PIC de Brasília. Nossa conexão foi imediata e rápida. 

Mas a minha maior experiência de convivência com esse grande militante foi no Parlamento brasileiro. Como é público, eu exerci mandato parlamentar como deputado federal durante 26 anos e, por duas vezes, fui líder da bancada do PT, onde desenvolvemos uma relação mais profunda do que a profissional entre um deputado e um assessor. Além de uma grande amizade, desenvolvemos uma sólida afinidade enquanto militantes socialistas e petistas. 

Minha admiração pelo Athos Pereira foi crescendo cada vez mais por ver nele um militante preparado, um militante que participava dos embates teóricos, que cuidava muito da elaboração, da reflexão, do debate, embora ele atuasse mais em bastidor, mais na elaboração, mais nos textos, mais nas conversas, e foi essa a experiência que eu tive com ele. 

Em todos os embates que tivemos na Câmara – e nós tivemos muitos embates –, e nesses embates, principalmente durante a resistência às reformas neoliberais de Fernando Henrique Cardoso, no período da resistência à emenda da reeleição e mesmo no processo de crise no segundo mandato do governo FHC, o Athos já tinha uma relação como se ele fosse mais do que um deputado pela sua capacidade de reflexão e de elaboração. 

Athos era um quadro político que elaborava, que refletia; muito mais um escritor, um conversador, do que um orador. Um intelectual orgânico no sentido gramsciano, porque ele elaborava, ele organizava, ele não era o intelectual do eu sozinho. Era um intelectual que compunha, que juntava, que tinha uma capacidade de aglutinação muito grande. 

Ele tinha as posições dele, as reflexões dele, mas sabia reunir, sabia conviver. E, principalmente, no caso da Liderança do PT, ele era muito atencioso com as novas gerações que chegavam, sem a nossa experiência, que estavam começando a luta política; ele tinha uma paciência para conversar, paciência para orientar e paciência pra ouvir.

Eu guardo muita lembrança das conversas que a gente tinha no final do dia ou, quando a gente tinha uma folga, sobre as leituras que a gente fazia. Me lembro das leituras e reflexões que a gente realizava a respeito dos impasses que a esquerda vivia, principalmente com o fim da União Soviética, com a crise do socialismo e com os dilemas que a gente estava vivendo na resistência ao modelo neoliberal no Brasil. 

E o Athos, apesar das reflexões duras sobre esses impasses, ele sempre tinha um lado, ele sempre tinha posição, ele não fazia como alguns fizeram, de costear o alambrado, de mudar de posição, de se dobrar às conveniências, de ficar maneirando. Era uma pessoa com posições muito claras e firmes. Eu via isso quando a gente discutia sobre alguns livros, sobre algumas biografias, sobre alguns textos importantes que estavam surgindo, ele sempre com o olhar de esquerda, com o olhar socialista, com o olhar petista.

Portanto, eu quero deixar claro, nessa minha homenagem ao Athos, que eu tenho pensado muito nele, inclusive quando eu fui solicitado a dar esse depoimento eu tive alguns momentos em que eu sonhei com o tempo em que a gente viveu juntos, que foi uma convivência muito intensa, que nunca foi uma convivência normal nem burocrática.

Juntos, vivemos a era dos embates, dos enfrentamentos da Câmara, da preparação, por exemplo, da Marcha dos 100 Mil, da preparação das obstruções, da luta para construir uma assessoria coletiva no PT, porque assessoria tem muito a cultura do individualismo, e ele ajudou e foi fundamental na construção de uma assessoria de trabalho coletivo na Liderança do Partido dos Trabalhadores. 

 Isso é muito importante e atual, sobretudo neste momento em que a gente vive uma certa influência do individualismo, do pessimismo, de tudo se justificar pela correlação de forças, em que uma certa hegemonia leva à acomodação. 

Na minha lembrança forte do Athos, ele era sempre um rebelde. Era um rebelde quando escrevia textos, era um rebelde quando conversava, era um rebelde quando dialogava. 

Portanto, minha visão é a de que o Athos deixa uma contribuição permanente, viva, para o PT e para a democracia brasileira; a contribuição de um militante que se jogou na vida, seja na resistência à ditadura, seja no processo de democratização, na construção do PT. 

José Genoino

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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