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Bárbara de Alencar: a primeira presa política do Brasil

Bárbara de Alencar: a primeira presa política do Brasil

Bárbara de Alencar: a primeira presa política do Brasil

A conta que, por ser “inimiga do rei”, a cearense Bárbara de Alencar tornou-se a primeira presa política do Brasil. Presa no Crato, Bárbara foi levada para a capital do estado, Fortaleza, a 500 quilômetros de distância, no lombo de um cavalo, com os braços acorrentados.

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O ano era 1817 e Bárbara, então com 57 anos, amargou mais de três anos de cadeia por declarar a independência de Portugal de uma pequena vila na capitania do Ceará. Expoente da Revolução Pernambucana, Bárbara fazia parte da república fundada no do Brasil mais de 70 anos antes do fim da monarquia, com a Proclamação da República, em 1889, pelo marechal Deodoro da Fonseca.

Os documentos históricos da Revolução Pernambucana, nascida da articulação de padres carmelitas e intelectuais nordestinos que estudaram na Europa, registram Dona Bárbara do Crato, como era chamada, e mais duas escravas (sem menção dos nomes), como as únicas da linha de frente do movimento.  

Ao contrário das demais lideranças, todas de origem urbana, Bárbara era uma rica proprietária de terras e de escravos do interior do Ceará. Ela e três de seus cinco filhos lutaram para que o Nordeste se tornasse uma república.

Avó do escritor José de Alencar, defensor da monarquia, a pernambucana natural de Exu mudou-se para o Crato depois do casamento, aos 22 anos, com o comerciante José Gonçalves dos Santos, 30 anos mais velho que ela, às escondidas, sem o consentimento do pai, numa clara transgressão aos costumes da época.

Casada, em outra transgressão, Bárbara tornou-se malvista por querer ser, segundo os comentários da época, o “macho da família” e, em vez esperar em casa pelo marido que vendia tecidos na feira do Crato, passou a administrar seu próprio negócio – a produção de rapadura e cachaça – no engenho do seu Sítio do Pau Seco, nas cercanias do Crato.

Bárbara tornou-se revolucionária por influência de dois de seus filhos, José Martiniano de Alencar e Carlos José dos Santos, que estudaram no Seminário de Olinda, em Pernambuco, criado no ano de 1800 pelo bispo Dom Azeredo Coutinho que, apesar de ser inquisidor-geral de Portugal, era um educador progressista, que defendia a formação de padres com amplos conhecimentos, permitindo inclusive a leitura de obras iluministas, como a Enciclopédia de Diderot e D´Alembert.

Segundo historiadores e historiadoras da Revolução Pernambucana, foi dali, daquele seminário, que os jovens candidatos ao sacerdócio, contaminados pelos ideais iluministas e pela maçonaria, adepta dos ideais republicanos, que surgiu o movimento revolucionário da república do Nordeste, idealizado pelo frei paraibano Manuel de Arruda Câmara, amigo de Bárbara e de seus filhos.

Na prática, o movimento radical, que tem entre seus líderes a figura extraordinária de Frei Caneca, questionava o caráter divino da figura do rei e a hierarquização estratificada da sociedade, ou seja, a grande opressão do Império de II sobre os povos pobres do Nordeste. Desde sua casa no Crato, onde recebia os ideólogos do movimento, Bárbara tornou-se uma grande mobilizadora de simpatizantes e, com eles, fundou vários núcleos republicanos nas fazendas e povoados da região do Cariri, hoje sul do Ceará.

Ao assumir publicamente seus ideais de liberdade no Nordeste do século XIX, quando às mulheres não era permitido participar dos “espaços exclusivos dos homens”, como a política, a sertaneja Bárbara de Alencar, mesmo vindo de uma família endinheirada, dona de terras e prestígio, atraiu a ira dos donos do poder monárquico que imperava no Brasil.

Embora, ao contrário de seus camaradas rebeldes, sequer fosse abolicionista – conta-se que ela exigia de seus escravos o seguimento dos preceitos do catolicismo, não permitindo que vivessem amasiados, mas que os tratava com gentileza, tampouco permitindo que dormissem em senzalas. Conta-se também que, entre seus escravos, que a chamavam de “madrinha”, “sinhá Bárbara vivenciou grandes mostras de fidelidade.

Diz a História que um deles, de nome Barnabé, decepou com os dentes a própria língua para não entregar o paradeiro da “sinhá” às tropas reais. Conta-se   também que outra escrava, Brasilina, acompanhou toda a peregrinação de Bárbara, seguindo pela mata desde o Crato até a entrada dela na prisão em Fortaleza.

Assim, essa do , protagonista da República de Pernambuco (que durou apenas 75 dias), amiga do padre João Ribeiro, autor do desenho da bandeira que até hoje representa o estado, ardente defensora de uma republicana que garantia os direitos humanos, a liberdade religiosa e de opinião e a abolição de uma série de impostos, pagou, na prisão, por sua inadmissível ousadia.

Entre a prisão em Fortaleza, e depois no Recife e em Salvador, foram três anos de cadeia. De certa maneira, Bárbara teve sorte, sua foi poupada, sobreviveu. Outros 300 separatistas foram mortos em combate, 100 foram exilados, 3 foram executados em Salvador, outros 11 no Recife, dentre eles Frei Caneca, em um combate truculento que envolveu mais de 8 mil soldados das tropas reais.

Mesmo depois dos anos de cárcere e da privação de todos os seus bens, Bárbara não desistiu de seus ideais republicanos. Em 1824, quando o Brasil já era independente de Portugal, mas continuava governado pelo filho de Dom João VI, o imperador Pedro I, ela, já com 64 anos, uma vez mais formou fileira com seus três filhos revolucionários na Confederação do Equador.

Depois de perder dois filhos na batalha, jurada de morte, Bárbara, já debilitada, retirou-se da luta e foi viver na Fazenda Touro, na divisa do Piauí. Em 1833, aos 72 anos, ela decidiu voltar à Vila do Crato, para ser madrinha de casamento de uma sobrinha. A morte lhe pegou de surpresa, no meio do caminho, quando parou para descansar, na casa de um parente.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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