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GARIMPO: A GRANDE ILUSÃO

GARIMPO: A GRANDE ILUSÃO

Garimpo: A grande ilusão que devasta e mata

“Na verdade, o garimpo é a grande ilusão que devasta. O sonho da riqueza fácil que nunca chega para o garimpeiro, mas que torna os compradores de ouro e os intermediários cada vez mais ricos. Enquanto isso, populações inteiras são destruídas.”

Por Gomercindo Rodrigues

Desde os primórdios da descoberta do Brasil que o interesse que o interesse por suas riquezas minerais foi um dos sustentáculos do Brasil Colônia. Não é diferente, hoje, numa região onde recentemente se descobriu todo um potencial mineral até então desconhecido.

A miséria, o desemprego, a falta de terra para os trabalhadores rurais no centro-sul do Brasil e a propaganda oficial de que a Amazônia era o novo Eldorado deslocou para esta região um contingente considerável de migrantes em busca da riqueza fácil, da terra abundante e barata.

Chegando à Amazônia, todos constataram que a propaganda era muito maior do que a região efetivamente apresenta de potencial; as terras são abundantes, mas frágeis e, com a remoção das florestas que as cobrem, pouco férteis

A infraestrutra de atendimento aos migrantes praticamente não existia. As doenças proliferam rapidamente, principalmente a malária. O Eldorado  brilhava muito menos do que a propaganda dizia.

Foi então que começaram as descobertas dos minerais na região. Veio Serra Pelada, no sudeste do Pará, que chegou a ser comparado a um formigueiro humano, dado o grande número de garimpeiros que para lá se dirigiam.

A fronteira do ouro deslocou-se para o extremo norte do país. Apareceram os garimpos de ouro e cassiterita em Rondônia. Em Roraima, nas terras dos índios Yanomami, foram encontradas riquíssimas jazidas de outro.

O rastro de devastação deixado pelo garimpo é impressionante; é só olhar os vários povoados que surgiram dessa atividade, grandes favelas sem nenhuma infraestrutura, com contaminação por mercúrio das águas de importantes rios como o Madeira, ou as grandes crateras abertas pelos garimpeiros em Serra Pelada.

Em Roraima, com certeza, o drama tornou-se ainda maior, pois os quase dez mil índios Yanomami , que tinham pouquíssimo ou nenhum contato com a civilização branca, estão sendo dizimados pelas mais diferentes moléstias, por não têm o organismo defendido por anticorpos de doenças que antes sequer conheciam.

Um genocídio está em marcha, com a conivência governamental, dado que não há ação prática para detê-lo.

A própria vida humana, nos garimpos, vale muito pouco. Se alguém consegue bamburrar, de repente pode ser encontrado morto, sem que ninguém tenha visto nada. Segundo os próprios garimpeiros, a vida no garimpo está sempre por um fio.

Na verdade, o garimpo é a grande ilusão que devasta. O sonho da riqueza fácil que nunca chega para o garimpeiro, mas que torna os compradores de ouro e os intermediários cada vez mais ricos. Enquanto isso, populações inteiras são destruídas.

A floresta vai, muito mais rápido do que se poderia esperar, caindo. Os rios de águas puras cedem lugar a rios poluídos. A incidência da prostituição, inclusive e especialmente de menores – meninas entre 12 e 15 anos – e da marginalidade, bem como as doenças, aumenta em progressão geométrica.

Garimpo serra pelada sebastiao salgado 05

Gomercindo Rodrigues, advogado acreano, em “Caminhando na Floresta”, Editoras EDUFAC -Xapuri, 2009.

Nota do Autor: “Bamburrar” – expressão utilizada pelos garimpeiros para designarem as pessoas que conseguem extrair  muito outro em pouco tempo. O contrário de bamburrar é blefar. O garimpeiro que não consegue ouro está “blefado”. Fotos: Sebastião Salgado – Serra Pelada.

Garimpo sebastiao salgado serra pelada 21

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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