A CANTIGA DAS LAVADEIRAS

A Cantiga das Lavadeiras é Música que ecoa na Floresta

Onã Silva, a poetisa do cuidar, cuida e dedica seu talento às lavadeiras. Utilizando-se do poema fluido, lírico e livre, vai apresentando aos nossos sentidos o ofício da lavadeira. Seus costumes, suas vestimentas, sua comida e a alegria do encontro – lavadeira e rio. Onã nos faz apreciar o ofício e a poesia, além do simples ato de lavar a roupa, conseguimos, pelo seu cordel ver “a alma de lavadeira”

Por Onã Silva

Arrastando a alpercata de couro

Lá vem a lavadeira

A Rainha Equilibrista

E sua coroa de algodão

Uma trouxa balofa na cabeça

E uma lata de farofa na mão.

 

Cantarolando, some pela estrada

Atrás da procissão de lavadeiras

Caleja os pés no cascalho

Até encontrar o riacho risonho

Que corre às gargalhadas

E abraça o mundo

cantando chuá, chuá!

 

A rainha do rio senta-se no trono

Uma pedra gorducha e cascorenta

Brinca com as piabas, conta prosa.

Assobia com os passarinhos

O refrão das mulheres que lavam:

Ensaboa, esfrega

bate e torce.

 

Ajoelhadas, estas mulheres reinam nas águas

Reverentes, diante do quaradouro

– o altar verdejantemente carinhoso

Beija muda por muda de roupa

Deixando-as brancas, brilhantes,

cheirosas,

como a alma de lavadeira.

Lavadeiras Portinari

Lavadeiras – Portinari

Onã Silva é enfermeira-cordelista, A Poetisa do Cuidar é Graduada em Enfermagem e Artes Cênicas, Pós-Graduada em Saúde Pública, Mestre em Educação, Doutora e Pós-Doutora. Filiada a diversas academias literárias.  Idealizou a Academia Internacional de Poetas e Escritores de Enfermagem (Academia IPÊ).  Recebeu em 2019, o Título de Cidadã Honorária de Brasília, pela Câmara Legislativa do Distrito Federal. Autora premiada em concursos de poesias, monografias e trabalhos científicos. Também é membro da ALANEG/RIDE representando a Cidade de Posse-Goiás.

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foto blog lavadeiras 1
Muita gente me pede referências de dinâmicas e jogos para desenvolver aprendizados sobre EMPATIA. Vou compartilhar uma estória de lavadeira contada por Alieth Cavassa, facilitadora de Comunicação Não Violenta (CNV), num dos workshops do Festival da Empatia em 2020 e que ainda hoje me gera uma série de reflexões…
Canto das Lavadeiras… https://www.youtube.com/watch?v=HTJo26KFHVI
Láááááááá em Goiás e Tocantins, corre o Rio Maranhão… e em suas límpidas margens as lavadeiras se encontravam dia sim e dia também…
Canto das Lavadeiras… https://www.youtube.com/watch?v=HTJo26KFHVI
E num lindo dia de sol, um velho sábio apareceu na aldeia onde viviam as lavadeiras. Todos os moradores seguiram o velho até a margem do rio e, de repente, ele anunciou:
– De hoje pra daqui uns dias, o Rio Maranhão vai secar em chão rachado e batido. Antes que a água seque, todos vocês devem guardar água em suas casas. Quando vocês abrirem os zóio de novo, sem perceber, o rio vai encher de novo. MAAAAAS se vocês beberem dessa água por 3 luas seguidas, vão deitar com saúde e levantar doentes. Se continuarem bebendo por 4 luas seguidas, ficarão doentes, doidos e sem juízo pra sempre!! Só bebam da água depois de 5 luas completas!!
E dali, sem dar explicações, sumiu mata adentro. Uns deram risada do velho sábio: 
– Precisa fazer muito sol pra esse mar de rio secar! Eita Velho doido!
Outros ouviram mas fingiram que não escutaram e voltaram logo pros seus afazeres.
Mas uma lavadeira, das mais queridas da região, prestou muita atenção no velho e a partir deste dia vinha lavar suas roupas mas, ao invés de levar uma cumbuca de água, aproveitava e enchia logo duas cumbucas… e assim foi, dia a dia, lavando roupa e guardando água nas cumbucas em sua casa que ficava um pouco mais afastada da vila.
Numa noite, todos dormiram e no outro dia, quando abriram suas portas e janelas na vila, olharam pro Rio Maranhão e ……
– O Rio Secou!!!!!! 
– A água sumiu!!!!!! 
– O chão rachou no fundo do rio!!! 
– Vamos todos morrerrrrrrr de sedeeeee!!!! 
Todos se reuniram no centro da vila, mas ninguém lembrou exatamente do que o velho sábio havia dito luas atrás. As velhas começaram a rezar novenas, os mais novos foram jogar bola e correr no leito seco do rio, alguns preocupados e outros nem tanto.
A lua chegou, o povo dormiu e quando o Sol bateu na janela no outro dia, o povo virou o pescoço pro rio e… Estava cheinhooooo de água novamente. Foi aquela festa geral! 
As beatas agradecendo a benção atendida e os mais novos pulando na água de roupa e tudo. Vida que segue…
A lavadeira, aquela amiga de todos, tinha viajado pra capital antes da seca do Rio. Demorou por lá umas 2 luas e quando voltou… as amigas lavadeiras, na beira do rio, contaram o acontecido. 
Ela arregalou os olhos e gritou: 
– Vocês não estão bebendo dessa água, né? Lembram do que o velho sábio disse?
As amigas começaram a rir da crendice da lavadeira e disseram:
– CLARO! Estamos usando a água pra beber, tomar banho, cozinhar, lavar roupas…
E mesmo que a lavadeira alertasse e até oferecesse a sua água armazenada… ninguém a ouvia…
– Você tá é doida! 
– Voltou da capital com miolo mole, foi??? 
– Deixa de ser tonta!
– Essa aí ficou abilolada! Vai, maluca!!!!!
No caminho de volta pra casa, percebeu que alguns moradores estavam meio esquisitos, alguns com cara de doente, outros falando coisas sem nexo… Ela ainda tentou falar com o padre… mas ele não falava pai nosso com ave maria, todo confuso.
Dia a dia, a lavadeira voltava para a aldeia, encontrava os amigos e as outras lavadeiras e via que a cada noite, todos ficavam mais doentes e mais malucos.
Depois da quarta lua, depois da cheia do Rio Maranhão, a lavadeira acordou, triste por saber que todos ficariam assim pelo resto da vida. Desanimada, olhou pro quarto onde guardava centenas de cumbucas de água boa e de repente, deu um sorriso gigante!
Abriu uma gaveta, pegou um martelo, foi até o quarto e … pá, pá, pá…começou a quebrar cumbuca por cumbuca, pá, pá, pá, pá, pá e a água boa escorreu pelo chão da casa…
Ela se vestiu, pegou sua roupa suja e foi até a vila… 
Na beira do rio tirou o lenço da cabeça e se ajoelhou… molhou o rosto… molhou os braços com a água límpida, cristalina… entrou no rio e com as mãos em concha… bebeu do Rio Maranhão. 
E lá longe, uma outra lavadeira comentou: 
– É a primeira vez nessa vila que uma louca se curou!
Canto das Lavadeiras… https://www.youtube.com/watch?v=HTJo26KFHVI
Como sugestão, Alieth Cavassa sugere as seguintes reflexões:

  1. Que necessidades a lavadeira tentou atender que a levou a tomar uma séria decisão ao final da estória?
  2. Que outras soluções empáticas ela poderia ter experimentado?
  3. Como o coletivo impacta em nossas decisões empáticas?
  4. Como essa estória impacta a sua história?
  5. Que relações você faz entre a atitude da lavadeira e o nosso contexto de vida? (pessoal, na empresa)

Se você gostou do conteúdo, deixe seu comentário. E conte pra gente se utilizou em alguma dinâmica e como foi o resultado. Até a próxima estória!
 Alieth Cavassa é criadora do jogo Ananse, um jogo de cartas que estimula a escuta e a expressão autêntica, promovendo conexões mais profundas e comunicação genuína. Professora da rede pública, facilita encontros de Comunicação Não-Violenta (CNV) e Justiça Restaurativa, aplicando essas práticas em espaços educacionais e comunitários. Também integrou o projeto “Empatia de Emergência”, que ofereceu suporte emocional a profissionais da saúde durante a pandemia, ensinando técnicas de autorregulação do estresse e escuta empática.

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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