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A DECLARAÇÃO DE AMOR MAIS LINDA DA FACE DA TERRA

“A DECLARAÇÃO DE AMOR MAIS LINDA DA FACE DA TERRA”

De Jorge para Zélia: A declaração de amor mais linda da face da terra

“Para mim, nem Amado, nem Gattai, apenas Zélia, quando não Zelinha.”

Por Casa do Rio Vermelho 
A DECLARAÇÃO DE AMOR MAIS LINDA DA FACE DA TERRA
Foto: Casa do Rio Vermelho

Após trinta anos de vida em comum, de amigação – gosto demais da palavra amigação, usada para nomear o que o código de família denomina concubinato, tenho aversão à palavra concubinato, má e feia, filha do preconceito e da discriminação -, Zélia requer, no uso da lei, o direito de usar meu sobrenome, assinar-se Amado. 
Na Bahia perde a causa, o juiz encagaçou-se ignomínia; em ela a ganha, junta Amado a de solteira.
Não tarda, Nelson Carneiro vence a do divórcio, eu e Zélia nos casamos.
Três anos depois, dona Zélia sai do sério, escreve e publica um , ‘Anarquistas, graças a Deus’, em cujas páginas narra sua filha de imigrantes, italianos anarquistas e católicos, no quadro de uma São Paulo afarista onde nasciam o com os matarazzos e os crespi e o movimento operário na sede das Classes Laboriosas e de outros grêmios culturais e reivindicados.

O livro fez sucesso e ainda faz, repetem-se as edições, é traduzido, virou série de televisão na transposição (magnífica) de Walter Avancini.
 
Dona Zélia tomou gosto, anda pelo quinto volume de sem falar nas histórias para .
 
Não querendo usar muletas na caminhada literária, assinou seus livros com o nome de solteira, voltou a ser Zélia Gattai, renome nacional, por pouco lhe servi de arrimo.
 
Para mim, nem Amado, nem Gattai, apenas Zélia, quando não Zelinha.”
 
𝐉𝐨𝐫𝐠𝐞 𝐀𝐦𝐚𝐝𝐨, em  “𝐍𝐚𝐯𝐞𝐠𝐚𝐜̧𝐚̃𝐨 𝐝𝐞 𝐂𝐚𝐛𝐨𝐭𝐚𝐠𝐞𝐦”

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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