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A quebra do establishment na democracia liberal

A quebra do establishment na democracia liberal

Por Ighor Teles Silva

Inicialmente, cabe destacar que o tema sugerido é de profunda complexidade e de intensa imersão quanto ao conteúdo político e sociológico, pois as peculiaridades e as formações sociais dos Estado-Nação são fatores que incidem diretamente no seio desta discussão.

Por outro lado, existe um fator comum em quase todos os Estados: que é o modelo de democracia, com forte viés o liberalismo, introjetado no imaginário da população como cenário ideal de representatividade por meio do voto – sendo esta conquista importantíssima para o avanço social e a conquista de direitos sociais.

Esta forma de representação constitui elementos que estimulam a busca pelo poder através da defesa de bandeiras que possuem extrema relevância para a sociedade, de forma que os possíveis representantes que poderão ser escolhidos pelo povo se expressam publicamente exteriorizando seus anseios, projetos e suas crenças; com o objetivo de resolução dos problemas cotidianos da população.

Antes de buscar atingir o cerne da questão, existe a necessidade de conceituar duas expressões que serão constantes no texto: democracia e liberalismo.  Neste sentido, muitos autores se debruçaram sobre a não difícil e importante tarefa de tentar estabelecer um conceito que abrangesse a complexidade de que trata este sistema e que tem por objetivo alcançar algumas metas para a sociedade e aqui, cumpre destacar algumas dessas metas, como por exemplo:liberdade de formar e aderir a organizações; respeito às minorias e busca pela equidade; liberdade de expressão; direito de voto; elegibilidade para cargos públicos; direito de líderes políticos disputarem apoio e, consequentemente, conquistarem votos, no qual destacam-se a liberdade de escolha, de formação política e o voto que tem função de sustentação deste modelo de representação.

Já o liberalismo, doutrina político-econômica com viés na liberdade individual e na propriedade privada, prevê intensa limitação da intervenção do Estado tanto na política, quanto na economia, propondo que o seja o regulador e provedor da distribuição dos modos de produção e da renda para a população.

Entretanto, as crises cíclicas deste sistema – oriundas, por sua vez, crises cíclicas do sistema econômico capitalista como um todo – desnudam o que há de pior em termos de representatividade na sociedade, escancarando a incidência de desníveis sociais grotescos e, ao mesmo tempo, registrando o aparecimento de movimentos ultra-radicaisque enveredam para a ideologia da supremacia racial: demonstrando, assim, todo o contido e enrustido na sociedade,.

Neste sentido, a fragilidade demonstrada leva à fragmentação social, onde a estratificação exercida pela política econômica atrelada à política de Estado mergulha em um caos social fomentado com a preponderância ao lucro. A representação política tem perdido a confiança e a força perante a sociedade.

Os partidos políticos e seus expoentes inseridos numa engrenagem corrupta criaram uma crise de identidade ante aos anseios da sociedade, onde uma lacuna representativa originou diversos movimentos e partidos aproveitando-se dos escândalos envolvendo os já citados partidos e seus correligionários.

.Com o mesmo fio condutor, é possível traçar um paralelo que deixa cristalino alguns aspectos semelhantes e repetidos em diversos cenários políticos em diversas partes do mundo. Exemplificando com um país com elevado desenvolvimento social e econômico lança-se mão das eleições da Espanha, que sofreu uma grande crise econômica no final da década de 2010, agravando a desigualdade social e estimulando o renascimento de um sentimento nacionalista com ideais voltadas à soberania nacional. Retórica essa que vem de encontro à proposta dos fluxos globais potencializados pela migração, alimentando-se pelo medo e pela sensação de não pertencimento do migrante à nação em que vive.

Outro fator que ganhou força entre os eleitores foi descontentamento com a classe política e o establishment consolidado e imerso na corrupção sistemática, que teve seu estopim nas grandes manifestações com contornos políticos moldados pela indignação social.

Neste processo, marcado por  mudança e reorganização com certa renovação política, uma ferramenta já utilizada tornou-se fundamental para a propagação das ideias e anseios políticos:  as redes sociais, que por sua vez, cumpriram um papel que já não mais cabia aos meios tradicionais (televisão, rádio, panfletos etc) e entraram , como veículo de informação,  nos lares,  famílias e  círculos sociais que antes tinham perdido conexão com a política. Por fim, cumpre explanar que a reoxigenação e a reaproximação da sociedade com a democracia se deu pela renovação dos quadros políticos e da repactuação do modelo de disputa, onde antes dominava o bipartidarismo  e agora o quadripartidarismo tomou à dianteira, inaugurando uma representação mais abrangente e com mais opções dispostas à sociedade.

No que se refere à representatividade , é importante consignar que a afetação sofrida é advinda das grandes crises econômicas que basilam as políticas de Estado e, por conseguinte suas políticas econômicas. Fato é que o desleixo e a rejeição social pelo sistema político como um todo é reflexo das práticas exercidas pelos “escolhidos do povo” que, quando são atrelados aos escândalos de corrupção, agravam o descontentamento e a desilusão política.

Desta forma, os outsiders ou os políticos que não pertencem àquela ordem já estabelecida ganham força ante a sociedade com os discursos aferidos a partir da demonstração da insatisfação. O fio condutor que carrega toda essa informação é parte de um sistema que perpassa os novos meios de comunicação, de processamento de dados e interpretação dos dados captados. Nesse sentido, possibilita que a confluência das informações gere um emaranhado capaz de fortalecer determinado projeto político.

Por fim, os impasses da democracia são gerados em momentos de crise do sistema econômico vigente, vislumbrando o vácuo de tomada de decisões deixado pelos governantes eleitos, a imersão da sociedade numa perspectiva de extrema desigualdade, a diminuição do Estado de Bem-Estar social e o envolvimento dos políticos tradicionais em esquemas corruptos. Todos esses fatores aliados geram instabilidade social com reflexos direto na sociedade que não se sente representada pela classe política.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: CASTELLS, Manuel. Ruptura: a crise da democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

IGHOR TELES SILVA – BACHAREL EM DIREITO.  MESTRANDO EM ESTADO, GOVERNO E POLÍTICAS PÚBLICAS – FLACSO-FPA


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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