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ACRE PERDE O “DOUTOR JOÃO MAIA DA CONTAG”

Acre perde o “Doutor João Maia da Contag” 

Morreu no 1 de março, em Senador Guiomard, onde vivia, o “doutor João Maia da Contag” – como era conhecido e estimado por milhares de famílias de seringueiros, posseiros e ribeirinhos do Acre, aos quais organizou em oito sindicatos e ensinou a lutar pelos direitos de posse de suas colocações tradicionais. 

Por Elson Martins 

joao maiaNo outro lado estavam grupos empresariais, grileiros, advogados e juízes corruptos, policiais militares e civis, prefeitos e delegados que se empenhavam em desmatar a e criar boi, com apoio da e civil de 1964.

João Maia da Silva Filho chegou ao Acre em 1975 como delegado regional da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Era pessoa muito instruída: falava fluentemente seis idiomas, tinha diploma de filósofo, obtido na Universidade de Montreal, e especializou-se em economia rural em Piracicaba, São Paulo; viveu a experiência dos Kibutzes em e atuou nas Ligas Camponeses de Pernambuco.

Não fazia, entretanto, questão de se apresentar com essas qualidades, preferia fazer amizades e atuar com a simplicidade que sua condição de exigia. Ao aproximar-se de uma casa de seringueiros, adotava uma fala mansa, acompanhada de gestos amigáveis, procurando parecer com os que o recebiam com alguma cerimônia. 

Geralmente, pedia licença para sentar no chão do barraco e manifestava o desejo de fumar um cigarro porronca, se possível, enrolado em palha de milho. A partir daí começava a falar dos direitos que as famílias tinham de se defender das ameaças e também procurar salvar a floresta do .

Em menos de dois anos a Contag criou oito sindicatos com cerca de 30 mil associados, projetou lideranças sindicais como Wilson Pinheiro e Chico Mendes, desenvolveu a através dos “empates” e ampliou a força sindical para um partido de massa, o Partido dos Trabalhadores (PT), que ajudou a transformar em Lei as Reservas Extrativistas, um legado enorme como reforma agrária justa e promissora, mesmo nos dias conturbados de hoje.

João Maia foi eleito deputado federal pelo PT em 1986 (convocado como suplente; se elegeu pelo PP em 1990 e 1994, depois migrou para o PSDB e para o PFL. Renunciou ao mandato em 1997 e, já fora da política, sofreu um AVC que o deixou sem fala até esta data, aos 82 anos, travando um acervo histórico pessoal que levou consigo para o túmulo.

Sua mulher, Clece da Cruz Silva, namorada que conheceu em éia, na época da criação do sindicato no município, lhe deu três filhos. A família vive numa pequena propriedade rural em Senador Guiomard.

Fonte: Jornal Varadouro. Foto: Divulgação/ Acervo Varadouro

Elson Martins conselho editorialElson Martins – Jornalista. Escritor Acreano. Membro do Conselho Editorial da Revista Xapuri. 

 

 

 

 

JOÃO MAIA 

Primeiro delegado da Contag (Confederação dos Trabalhadores da Agricultura) no estado, João Maia, que rodou o Brasil fundando sindicatos, veio ao Acre ‘passar um ‘ e findou ficando.

–Eu fui para o Acre para passar uns tempos, fundar sindicatos. Mas acabei ficando até hoje. Casei com uma acreana e tenho dois meninos acreanos. Eu fui lá para fundar a delegacia da Contag, como fundei. Passei dez anos como delegado da Contag – disse João Maia à Folha de S. Paulo em maio de 1.997.

Por mais de uma vez, sempre quando esteve no Acre, Lula contou que um dia (segunda metade da década de 70) estava no sindicato do Metalúrgicos do ABC (era o presidente) e a secretária o avisou que havia dois sujeitos do Acre querendo falar com ele

-Desconfiado, disse pra secretária dizer a eles que conversaria no final do dia e fora do sindicato. E assim foi. Fomos para um bar próximo e lá conheci Chico Mendes e João Maia. Depois eles ajudaram a fundar o PT no Acre.

João Maia e Lula foram processados com base na Lei de Segurança Nacional (por conta de um comício e declarações no município de Brasileia quando morreu assassinado o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município, Wilson Pinheiro) e foram absolvidos por 5 a 0, em Manaus, pelo Tribunal Militar no começo da década de 80.

Sobre Lula, João Maia dizia:

-Toda vez que o Lula me encontra me dá um abraço. Eu sei que ele tem o maior respeito por mim. Porque, na realidade, eu mudei de sigla, mas meu estilo de continua o mesmo.

João Maia tinha 82 anos.

(…)

 
 
 
 
 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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