Angela Mendes: compromisso com a resistência

Angela Mendes: compromisso com a

Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi assassinado com um tiro de escopeta no quintal de sua casa em Xapuri, no Acre. Ao longo dos anos, Angela Mendes, a filha mais velha de Chico, à época uma jovem de 18 anos, fez da dor da perda do pai compromisso com a resistência.

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“Quando meu pai morreu foi horrível, foi como se o chão tivesse fugido debaixo dos meus pés. Entrei em um buraco de desespero por não compreender como uma pessoa tão querida como o meu pai podia ser morta daquela forma tão covarde”, diz Angela.

A filha de Chico conta que até hoje sente muita falta das brincadeiras, do carinho que os dois tinham um pelo outro, e fala da última vez em que se encontraram: “Nossa despedida foi de muito carinho, de muita compreensão, a gente ficou de se ver dias depois e, de repente, pronto: eu descubro que não vou vê-lo nunca mais”.

Este ano completam-se 35 anos do assassinato de Chico Mendes. A ambientalista Angela, ex-secretária da mulher do CNS, organiza, de 15 a 22 de dezembro, mais uma Semana Chico Mendes, com cinco empates temáticos: Memória e ; Sustentabilidade e Bem-Viver; Climática; e Juventude que, como os igarapés da , vão desaguar em um grande Empate de Retomada, em defesa do legado de Chico Mendes. 

Angela comenta: “Três décadas e meia depois, aqui estou eu, uma mulher da floresta, trabalhando no Comitê Chico Mendes, no Acre, e correndo mundo, como um dia fez meu pai, em defesa dos da . É essa a maneira que encontro para honrar a memória, defender o legado e manter vivos os ideais de Chico Mendes”. 

Angela Feitosa Mendes – Presidenta do Comitê Chico Mendes. Conselheira da Revista Xapuri. Ex-Secretária de Mulheres do CNS.

Foto: Arquivo Pessoal/ Angela Mnedes

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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