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Violência contra a mulher: Entre a Doença e a Loucura 

contra a mulher: Entre a Doença e a Loucura 

Por Carolina Parrode

 
Fala-se muito sobre relacionamento abusivo. Vivemos na era no , do tal “empoderamento” (palavrinha estranha, mas isso não importa), das denúncias de assédio, machismo e misoginia, da luta pela equidade etc. É muita informação importante e relevante produzida sobre o tema. São estudos, relatos, diagnósticos, autoajuda, receitas, conselhos… enfim, vê-se de tudo!
 
É possível encontrar inúmeros textos interessantes na rede… e também receitas e exageros. Depara-se com “Superando o fim de um relacionamento abusivo”, “Como superar um relacionamento abusivo em 28 passos” (…) e mais um monte de títulos.
Existe uma verdadeira campanha para que as mulheres diagnostiquem seus relacionamentos e, caso percebam-se submetidas a tirania de seus pares, que possam encontrar forças para sair desse lugar de jugo.
 
Por óbvio que sair de um relacionamento assim é um passo muito importante, no entanto é a vitória de uma batalha, mas não da guerra. Nem de longe este seria o fim da história… não é bem assim que a banda toca. O sofrimento ecoa por longo tempo.
 
Bem, para boa parte das mulheres não seria preciso exercício de empatia e altruísmo para imaginar/saber as condições de quem vive às sujeições de um “amor doente” (se é que pode-se chamar de “amor”). Muitas de nós vivenciamos essa experiência através de amigas, irmãs, vizinhas, filha, mãe ou através de nossas próprias experiências. Vamos juntas…
 
Depois de anos sofrendo sozinha, choros, noites em claro, reza brava, esforço e mais um sem número de fatos esdrúxulos, ela deve começar a pensar: “Será que eu estou louca, sou fresca ou realmente já está na hora de desistir desse relacionamento (porque vivo um inferno)?”
 
Depois de centenas de vezes vendo-se em situações onde pensa: “Fique calada que acaba mais rápido. Não retruque que já está acabando”. Depois de várias vezes escutar o aviso do superego: “nunca argumente com alguém alcoolizado”.
 
Depois de milhares de vezes de “vou sair de fininho e dormir ali num canto para não me indispor”. Depois do olhar estranho de várias pessoas… Olhos abertos e bocas bem fechadas.
 
Depois de tudo isso e mais um pouco, a mulher vai percebendo que algo está errado, e não é com ela!
 
Ver-se em uma situação assim é como a sensação de observar, inerte e paralítica, a própria lucidez esvaindo-se. Indo embora. Abandonando o barco, saltando ao mar.  E então, como em um filme de terror, a mulher debate-se dentro de si mesma. “É louca”, julgam.
 
Deve haver um momento em que a lavagem cerebral é tão grande e, ela já foi tão longe na missão de “permanecer”, que parecem ser duas mulheres habitando um só corpo.
 
Uma, a mulher inteligente que forjou-se na intelectualidade, olha bem para a outra: observa e julga compassivamente. A vê sucumbindo, enlouquecendo. Adoecendo. Mas a doença atinge as duas. A loucura, apenas uma.
São doenças que desregulam a pele, o estômago, o apetite, a concentração e os cabelos da cabeça. Estragam o humor, embaçam a beleza, a maternidade, a produtividade e sua autoimagem.
 
A mulher inteligente é forte e revolucionária. Então a louca acaba valendo-se de sua fortaleza para tentar “fazer o que é certo” e permanecer ali mais um pouquinho… pushing a little bit harder. Afinal.. yes, you can! Então, por várias vezes ela assiste, inerte, sua lucidez indo embora. E vai mesmo. Lucidez que vai, doença que vem. É como ver-se impotente diante de si mesma. Imagem estranha.
 
Nunca duvidemos da capacidade de um homem extremamente impositivo e machista, reduzir e suprimir a inteligência de uma mulher.
Você olha para ela… moça bonita e inteligente. Forte. E mesmo assim, há tanto tempo, submete-se.
 
Carolina Parrode, mulher.
 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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