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A árvore na cidade

A árvore na cidade

O espaço público da cidade produz dois fenômenos simultâneos e assim os estudiosos da sociologia urbana concluíram: ao mesmo que esconde a individualidade do sujeito, faz emergir a força da coletividade. É na rua que a expressão do “eu” se reduz em protagonismo diante do “nós”.

A queda do idoso na calçada, o choro da pedinte, o ônibus lotado que passa, o barulho ensurdecedor do carro, despertam o desconforto solidário nos passantes da cidade. Mas ao mesmo tempo a travessia solene do pedestre diante do carro rendido também representa a conquista de todos nós.

Pensa se não é verdade! Todo se irmana na rua, diante do suplício experimentado ou do grito incontido da vitória. Isto é a força do sentimento coletivo que se manifesta no espaço público, porque é nele, e tão somente nele, que se faz a , que se alimentam as contradições dos nossos interesses enquanto “eu”, enquanto “nós”.

Vejamos o que ocorre com a árvore na cidade! Esta componente biótica da paisagem urbana repercute o mesmo ânimo coletivo e esquizofrênico manifestado nas suas esquinas.

Se por um lado é reclamada, adorada e pretendida nos domínios públicos (praças, jardins, bosques…), ao mesmo tempo é rechaçada, desprezada e sabotada quando compromete a fachada da “minha” loja, a entrada da “minha” garagem, a estética da “minha” calçada, a fiação da “minha” rua.

(Ó! amada e amaldiçoada árvore diante do meu e do nosso desejo, se ao menos você falasse…!)

Talvez não houvesse polêmica quanto à importância da árvore no espaço urbano não fosse o o principal agente devastador de suas próprias florestas, seja por omissão ou inépcia continuada.

Essa realidade repercute na capacidade de discernimento das pessoas que passam a não emprestar a adequada atenção ao papel da árvore nos espaços públicos de nossas urbes. Não observam que quanto menos espaços verdes possui uma cidade, mais embrutecidas, áridas e quentes ficam suas ruas; logo, menos frequentadas e mais violentas.

Não por menos o bom senso levou alguns legisladores brasileiros (ufa!) a exigir planos de arborização para as cidades, especialmente à luz da política nacional de mobilidade urbana; que prioriza os modos de transportes não motorizados (a pé e por bicicleta) em relação aos motorizados.

Estabeleceram-se assim as diretrizes para reduzir os impactos negativos no jeito de se deslocar a pé e de bicicleta num mundo cada vez mais urbano, no qual as sombras tendem a prevalecer pela projeção do sombreamento dos edifícios.

Não é difícil compreender que a árvore exerce importantes papéis na cidade, desde a redução da poluição do ar, da estabilização da temperatura, da difusão dos impactos das chuvas, da absorção de ruídos, como também a garantia de sombras naturais com fator estimulante para a caminhabilidade ideal.     Afinal, ainda é pelo modo a pé que as pessoas se deslocam em maior número nos espaços públicos, no qual se busca harmonizar os interesses eternamente conflitantes entre a individualidade e a coletividade.

Antenor Pinheiro
Jornalista, membro da Associação Nacional de Transportes Públicos/ANTP


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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