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As Paixões 1

As Paixões 1

As Paixões 1

Após o fim do meu casamento, imaginei que qualquer nova relação apresentada seria calma e madura, como sempre me disseram. As paixões são reservadas aos jovens, foi o padrão ensinado…

Por Giselle Mathias

Ceder a elas seria imaturidade e deveria me comportar como uma de meia idade e separada. Eu deveria manter a seriedade, não ceder a arroubos sentimentais e exercer o padrão estabelecido para a minha faixa etária.

Porém, a nos surpreende e nos desafia, impõe situações para que possamos refletir sobre o que nos é imposto, nosso ser e o que somos está a todo gritando dentro de nós contra todas as regras determinadas; estava tão presa aos conceitos e ao que me era colocado que tentava a todo tempo negar a mim mesma o que sentia.

Após minha separação, conheci um homem inteligentíssimo, descolado, o tipo que sempre me agradara, além de fisicamente ser o que me encanta, a sintonia mental e afetiva estava posta. Quando o conheci não pude desviar o olhar, toda a minha atenção era dele, conversamos por horas, simplesmente a sensação era a de conhecê-lo há um longo tempo, não conseguíamos nos despedir, estávamos inebriados um pelo outro, a admiração era mútua, o desejo era sentido por todos que estavam a volta de nós, era nítida aquela conexão.

Aquele encontro parecia envolto em uma magia, senti como se fosse impossível depois daquele momento me afastar daquele homem, do sentimento que me despertara. Era algo avassalador. Não imaginava que fosse possível sentir algo tão intenso após uma primeira troca de olhares. No entanto, estava tão inserida nos moldes exigidos e sem a consciência dos padrões que me movimentavam, que negava aquele sentimento aflorado em mim, não podia na minha idade sentir aquela paixão, a qual sempre determinaram ser permitida somente a juventude.

Os dias se passaram com muitos contatos, falas bobas e inocentes como se estivéssemos dando os primeiros passos no amor, era muito difícil para mim controlar meus impulsos, mas precisava fazê-lo, e o racional se impunha, porque não conseguia me desligar desse processo tão padronizado e as travas, os medos e a insegurança se sobrepunham aquele sentimento quase infantil.

Queria tê-lo, simplesmente estar ao lado dele como se nada mais existisse, mas a vida gritava, as responsabilidades me exigiam a racionalidade e o sentimento deveria dar lugar a seriedade imposta, não poderia me deixar levar por toda a paixão que me tomava naquele momento.

Não sei dizer se já senti algo parecido em minha vida, já tinha me apaixonado, me encantado, mas nada foi tão forte ou que tenha nascido em um único encontro. Eu estava verdadeiramente apaixonada por aquele homem, sem os sonhos da infância, sem as expectativas dos filmes e livros românticos, com as qualidades e defeitos que me foram apresentados, eu o via por completo, o ser dele, seus anseios, dúvidas, crenças, fragilidades e toda a sua força.

Me apavorei!

Nunca tinha vivido algo parecido, talvez seja a paixão da maturidade, e ela me pareceu mais intensa, vívida e urgente do que os encantamentos juvenis, sentia um desejo ardente misturado a uma dor profunda que não conseguia compreender, estávamos completamente envolvidos um pelo outro.

Mas, infelizmente não pude vivê-lo não consegui estar ao lado dele, não estava preparada para assumir a paixão que me tomava e envolvia todo o meu ser naquele momento, me sentia angustiada, em pânico de repetir o que vivera com meu Ex-marido, aquele sentimento me aprisionaria em suas teias e me impediria de ser quem sou, por mais que o visse completamente, eu passara a acreditar que todos os homens eram iguais, seria traída de novo e não seria possível manter-me livre, pois o que eu sentia por si só me colocaria novamente em uma cela, meus padrões gritavam e me sufocavam. Eu havia conquistado a minha , buscava o meu ser e aquela paixão me parecia um obstáculo para atingir o que eu acreditava naquele momento.

Agi como um passarinho que ganha sua liberdade, voa desesperadamente e se assusta com qualquer coisa que se assemelhe a uma gaiola ou ao ser que o aprisionara. Desejava mostrar minha liberdade, uma força que ainda não tinha, achava que não poderia ceder ou demonstrar o quanto estava entregue aquele sentimento, porque isso me deixaria frágil, vulnerável aquele homem. Não poderia ser uma presa fácil ao caçador.

Hoje percebo o quanto meus padrões se impuseram, o que me soa até com uma certa graça, pois sempre disse não acreditar em conquistas, mas sempre me comportei como sendo a caça distraída aguardando apenas o caçador se aproximar, por isso a confusão se instalou quando conheci o Avassalador, continuava a me sentir como uma presa, não percebi o que representava um sentimento recíproco, sem toda as etapas da conquista, só o conhecer um ao outro, o desejo incontrolável que tivemos e a vontade de estarmos juntos sem as máscaras e enganos.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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