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Autocuidado: A próxima fronteira do feminismo

Autocuidado: a próxima fronteira do feminismo

Ao mesmo que as precisam lutar por igualdade de gênero, é necessário que tenham estabilidade emocional. Mas como?

Cuidar-se, porque a sempre é um corpo que está sob ataque.

A demanda de reconhecimento do feminismo tem um efeito radical sobre as estruturas privadas e públicas da sociedade, ao contrário de outros tipos de lutas sociais, porque não se pode pensar a relação de gênero e o papel da mulher sem considerar o mesmo em relação aos homens.

A filósofa Nancy Fraser, um dos nomes mais famosos das reivindicações feministas, escreve que gênero e raça – tanto as mulheres quanto as “raças não-brancas” (especialmente a negra) – precisam do reconhecimento de sua identidade como tal para que a perspectiva patriarcal, androcentrista/branca e eurocentrista que as subjuga, deixe de ser uma ancestralidade ainda atual. A estrutura atual, para ela, não oferece soluções para a diferença de acesso a bem-estar material imposta a esse tipo de pessoas.

A escritora e filósofa francesa Simone de Beauvoir, provavelmente a maior teórica social do feminismo, escreveu, entre várias de suas frases conhecidas que “ninguém nasce, mas preferencialmente se torna, uma mulher” e que “emancipar a mulher é a recusa de confiná-la das relações que ela carrega do homem, não para negá-las; deixá-la ter sua própria existência independente e continuar, no entanto, existindo para ele também: o reconhecimento mútuo de cada um como sujeito, cada um ainda existindo para o outro”.

Nos últimos tempos, porém, as agressões virtuais – que não deixa de ter efeitos na vida real – se tornaram uma nova questão para as mulheres, e é por isso que elas recorrem cada vez mais ao conceito de autocuidado. A ideia original é da escritora caribenha, que, em seu livro A Burst of Light (sem tradução para o português), de 1988, escreveu que “cuidar de mim mesma não é auto indulgência, é autopreservação, um ato de luta “. Ou seja: o bem-estar físico e emocional das mulheres é parte fundamental não apenas para que o ativismo se mantenha, como para a vida pessoal.

As palavras de Aude ganharam força em 2007, quando duas pesquisadoras da de Sussex, na Inglaterra, fizeram uma pesquisa mundial sobre o ativismo feminista e suas consequências para as vidas das mulheres. O resultado foi que, emocionalmente, elas estavam destroçadas. “Para mudar o mundo, precisamos nos cuidar, e mais, cuidar umas das outras”, dizem Jelena Dordevic e Jane Barry, autoras do estudo, que se tornou o livro Que sentido tem a revolução se não podemos dançar? (Nandyala).

Ao longo de seu livro, Lorde compara a experiência dela na batalha contra o câncer com a luta contra o — ela também era negra. Segundo ela, o racismo pode ser colocado da mesma forma que um sofrido pelas células do corpo ou ao sistema imunológico: o próprio corpo vivencia a si mesmo enquanto mata a si mesmo, morte de fora para dentro. “Um mundo contra você pode ser vivenciado como seu corpo se virando contra você. Você será levado à fadiga, à exaustão por aquilo que você é exigido a fazer”, diz um trecho.

No Brasil, o conceito ganhou força depois do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL), em março do ano passado. Desde então, diversos coletivos feministas têm promovido debates sobre o tema, sempre baseando-se na ideia de que cuidar-se psicológica e emocionalmente também é um ato político. “A luta não pode ser esquecida, mesmo que seja difícil e que nosso objetivo às vezes pareça quase impossível. Não é por isso que vamos desistir de tentar. É nessa tentativa que podemos nos reinventar e achar novas estratégias. A única estratégia que não podemos nos deixar levar é o medo. É uma estratégia política tão potente que nos paralisa”, escreveu a blogueira Thayz Athayde.

Há iniciativas materiais ligadas ao autocuidado, como o da advogada paulistana Anna Haddad, fundadora da plataforma Comum, que tenta desenvolver habilidades das mulheres em cursos online e presenciais. “Chegam a mim relatos constantes de mulheres que sofreram ou sofrem abusos, outras pensando em se machucar por conta do que passam com parentes próximos ou companheiros”, contou à revista Marie Claire.

Outro exemplo é Luciana das Cruz Neves, líder de uma ocupação habitacional para mulheres em Belo Horizonte e que descobriu, há três anos, que sua própria filha estava sendo abusada por um parente. “Me vi em pânico, perambulando pelas ruas com ela. Não sabia exatamente para onde ir. Se para uma delegacia, para um hospital. Naquele caos, foi uma mulher, uma total desconhecida, quem me acolheu”, disse à mesma publicação.

A dica dela, assim como Audre, está na fronteira do autocuidado: “cuidar-se, porque a mulher sempre é um corpo que está sob ataque”.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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