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AYAHUASCA: O CIPÓ DOS ESPÍRITOS

AYAHUASCA: O CIPÓ DOS ESPÍRITOS

Ayahuasca: O cipó dos espíritos 

Elemento central de muitos dos rituais xamânicos do sagrado , a ayahuasca, cujo nome, de origem Inca, significa “cipó dos espíritos” ou “vinho dos mortos”, é usada como bebida sacramental desde tempos imemoriais por pajés de vários povos originários do , do Peru e do Equador.

Da EBC com edições de Zezé Weiss

Produzida pela combinação de duas plantas nativas da floresta amazônica, o cipó Mariri ou Jagube (Banisteriopsis caapi) e as folhas do arbusto Chacrona ou rainha (Psychotria viridis), a ayahuasca é uma bebida amarga, de uma coloração que vai do ocre ao , que costuma provocar vômitos, diarreias, alucinações e visões místicas.

Mesmo assim, o chá da ayahuasca, também conhecido no não-indígena como chá do Santo Daime, é consumido regularmente pelos povos indígenas da Amazônia e por quem segue seitas religiosas ancoradas em seu uso, como o Santo Daime e a União do Vegetal (UDV).

No Brasil, o Conselho Nacional Antidrogas (Conad) retirou a ayahuasca da lista de drogas alucinógenas, conforme portaria publicada no Diário Oficial da União em 10 de novembro de 2004, permitindo o uso nos rituais religiosos. Seu  uso ritual-religioso foi regulamentado em 2010.

Mesmo tendo liberado o uso da ayahuasca para fins religiosos, o Conad considera que o consumo do alucinógeno é arriscado. Na mesma resolução, existem regras como a proibição de que pessoas com histórico de transtornos mentais ou sob efeito de bebidas alcoólicas ou outras substâncias psicoativas ingiram a droga.

Além disso, é obrigatório que as seitas que usam a ayahuasca “exerçam rigoroso controle sobre o sistema de ingresso de novos adeptos”.

Os efeitos sobre o cérebro causados pela substância alucinógena ainda não são totalmente conhecidos. Além de ser usado em algumas religiões, o chá vem sendo estudado no tratamento de depressão e de dependência química.

Pesquisadores da USP-Ribeirão Preto identificaram os princípios ativos mais importantes produzidos pela bebida psicoativa: são as betacarbolinas e a dimetiltriptamina (DMT), substâncias que atuam no nível de serotonina no cérebro. A serotonina é um neurotransmissor capaz de dar ao cérebro sensação de bem-estar, regulando o humor e dando sensação de saciedade.

Fonte: EBC, com edições de Zezé Weiss. Publicado originalmente em 04/04/2021. 

AYAHUASCA: O CIPÓ DOS ESPÍRITOS
Imagem: Pixabay/via Jornal da USP

ESTUDOS BUSCAM COMPREENDEER DE FORMA SEGURA OS POTENCIAIS TERAPÊUTICOS DA AYAHUASCA 

Para o pesquisador Rafael Guimarães dos Santos, da FMRP, existe um certo preconceito em relação à substância, o que pode estar atrelado ao medo do desconhecido, entretanto universidades do Brasil e de várias partes do mundo estudam a substância

Por Rose Talamone/Jornal da USP 
 
Sempre que os pesquisadores solicitam voluntários para estudos sobre as propriedades terapêuticas da ayahuasca é comum as pessoas terem dúvidas, medo de participar e até questionarem a validade dessas pesquisas. A ayahuasca é rica em dimetiltriptamina e beta-carbolinas, é uma bebida de efeitos psicoativos e largamente estudada nos maiores centros de pesquisa pelo mundo, inclusive na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.  

Por isso, a Rádio Ribeirão foi ouvir o professor Rafael Guimarães dos Santos, do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da FMRP e um dos coordenadores desses estudos, para compreender as razões por trás das pesquisas sobre a ayahuasca. 

Ayahuasca, diz o professor, tem origem na , falada por povos indígenas na região dos Andes, na América do Sul. A palavra é uma combinação de aya, que significa “espírito” ou “alma”, e huasca, que significa cipó e se refere à planta Banisteriopsis caapi, um dos principais ingredientes da bebida ayahuasca. Assim, ayahuasca pode ser traduzida aproximadamente como “vinho das almas” ou “cipó das almas”.

Segundo Santos, do ponto de vista científico e de , não só a ayahuasca, mas a psilocibina e o LSD, que também são substâncias psicodélicas ou alucinógenas, despertam o interesse da neurociência em função dos efeitos subjetivos que essas substâncias podem produzir. 

Entre essas alterações, o pesquisador cita a do fluxo do pensamento e da percepção, além do fato da pessoa ficar mais introspectiva e mais emotiva, mais conectada com memórias autobiográficas, com os acontecimentos da e da infância. “A neurociência quer compreender as bases neurais, onde e como esses efeitos ocorrem e talvez também seus potenciais terapêuticos.”

Conhecer melhor os efeitos dessa substância, do ponto de vista científico e clínico, é o principal objetivo das pesquisas, por isso precisam de voluntários saudáveis para avaliar a segurança de uma ou mais doses e de diferentes dosagens da ayahuasca.

O professor afirma que já foi demonstrado o potencial efeito da ayahuasca na depressão, mas alerta que mostrar potencial não quer dizer que seja um antidepressivo. “Por isso qualquer pessoa que tenha interesse em participar das pesquisas pode entrar em contato conosco, mas de maneira geral, o aconselhamento é sempre seguir o conselho do seu médico.” 

Atualmente, as pesquisas em caráter experimental avaliam os efeitos da ayahuasca na depressão, no estresse pós-traumático e no uso abusivo de algumas substâncias, como álcool, por exemplo, mas Santos faz mais um alerta: “A substância não está aprovada para nenhum tratamento, para nenhum uso clínico”. 

Pesquisas seguras e controladas

Para o pesquisador existe um certo preconceito em relação à substância, o que pode estar atrelado ao medo do desconhecido, mas afirma que a visão da maioria das pessoas é respeitosa. “É vista como algo sagrado, associado às populações tradicionais, especialmente as comunidades indígenas espalhadas por países como Colômbia, Peru, Equador e Brasil, e também associada às religiões ayahuasqueiras, como Santo Daime, União do Vegetal e a Barquinha.” 

Mesmo assim, diz o professor, “persiste um certo preconceito de que seriam pesquisas feitas só para usuários de drogas ou que têm um certo perfil associado aos usuários de drogas recreativas, quando, na verdade, o que se busca é, com a seriedade da ciência, mostrar que dentro de um contexto seguro elas podem ter utilidade, inclusive médica, e com potencial de ajudar as pessoas.”

Foco de estudos no Brasil e no mundo

Santos lembra que todas essas pesquisas são feitas por uma grande equipe treinada, profissionais da de várias áreas e inúmeros projetos estão acontecendo, tanto na FMRP como em vários outros centros no Brasil e no mundo.

“São centros que estão trabalhando tanto na área básica, como pré-clínica e também com seres humanos, e entre eles estão a Federal do Rio Grande do Norte, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a Universidade de Brasília (UnB) e a USP no campus em São Paulo.”

O pesquisador diz, ainda, que surgem cada vez mais núcleos estudando a ayahuasca, principalmente na área da saúde mental, envolvendo questões de transtornos psiquiátricos, inclusive no exterior. Atualmente a FMRP já tem parceiros na Espanha e na Holanda.

e vários países da Europa, como Austrália e Nova Zelândia, por exemplo, têm centros de pesquisa testando esses compostos; as pessoas não sabem disso e ainda têm a imagem de que essas substâncias sejam sempre associadas a um uso recreativo e pouco controlado.” 

Sua origem vegetal e o fato de serem utilizadas por comunidades tradicionais indígenas, diz o pesquisador, também podem ser um fator de desconfiança entre as pessoas. “É importante também saber que o uso é socialmente construtivo nessas comunidades e que o científico demonstra seu potencial terapêutico.” 

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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