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Barão de Cocais (MG): Em alerta devido a barragem, cidade convive com pânico

Em alerta devido a barragem, cidade convive com pânico

Em Barão de Cocais, em Minas Gerais, o risco de um desastre similar ao de Brumadinho é iminente. Moradores dizem que é como viver ao pé de um vulcão prestes a entrar em erupção – sem que se saiba ao certo por onde fugir.

Por: dw

Em Barão de Cocais, as sirenes de ambulâncias e viaturas da polícia estão proibidas. A recomendação é que esses veículos, mesmo em situação de emergência, façam o percurso em silêncio para não ativar o pânico nos moradores.

Desde que a cidade mineira de 32 mil habitantes entrou em nível máximo de alerta devido ao risco iminente de colapso de uma barragem de rejeitos da Vale, qualquer ruído mais alto faz as pessoas na rua perguntarem umas às outras: “Será que a barragem rompeu?”

Ivanilde Coelho, 44 anos, não consegue mais dormir. A casa onde mora na parte urbana da cidade, às margens do rio São João, seria destruída em caso de rompimento. Hipertensa, ela diz estar em depressão e quer se mudar dali. “Não tem como viver assim, nesse medo, sem dormir, sem comer direito”, diz no quintal de sua casa, onde o pequeno salão de beleza praticamente não é mais visitado por clientes.

Mulher olhando para riacho

Ivanilde Coelho: “Não tem como viver assim”

O filho dela, Matusalém, passa as noites monitorando o volume das águas do rio em companhia de vizinhos. A vigília informal acontece há dois meses, após o alarme ter soado na cidade pela primeira vez, em 8 de fevereiro. Fazia poucos dias que uma avalanche de rejeitos no complexo da Vale em Brumadinho havia deixado mais de 300 mortos.

Desde que foi obrigado a sair de sua casa de madrugada quando a sirene de alerta tocou, Adão vive em um quarto de hotel. A comunidade rural onde morava, Socorro, foi evacuada por completo.

Fundada há 300 anos, a vila está a menos de dois quilômetros da barragem problemática da Vale em Barão de Cocais, dentro da Zona de Autossalvamento, em que a responsabilidade do resgate é da mineradora. Em caso de rompimento, a comunidade seria atingida em seis minutos.

“Eu vivo triste. Lá em Socorro a gente plantava de tudo, tinha criação, andava tranquilamente. Aqui a gente não tem nada para fazer, fica o dia todo esperando algo acontecer, esperando a Vale dar alguma notícia”, conta Adão, sentado no chão em frente ao hotel.

Ao todo, 454 pessoas da Zona de Autossalvamento foram retiradas de suas casas. Mais de 6 mil moram atualmente na chamada Zona de Segurança Secundária, faixa na parte central da cidade que seria afetada pelos rejeitos.

“A gente realmente não sabe. A gente não tem uma consultoria independente, tem que acreditar no que a Vale diz. Eu realmente acho que corremos perigo. Talvez não seja agora, mas as chances de rompimento são reais”, responde o prefeito Décio Geraldo dos Santos sobre a seriedade da situação.

Vigilância e falta de planejamento

Dentro de uma sala de uma universidade próxima ao centro da cidade, representantes da Vale e da Defesa Civil acompanham as imagens geradas por três câmeras posicionadas na barragem que apresenta risco, chamada de Sul Superior, localizada na mina do Gongo Soco.

“A Defesa Civil trabalha num regime de plantão. Aumentamos a equipe pra atender a população e tirar dúvidas sobre os pontos que podem ser atingidos e as rotas de fuga”, diz o coordenador José Flávio Rodrigues Junior.

Inativa desde 2008, a Sul Superior armazena 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos, segundo a Defesa Civil. Com seu rompimento, uma barragem menor, com 1 milhão de metros cúbicos, também seria abalada. A mineradora afirma que não há funcionários no local. Questionada pela DW Brasil, a Vale não detalhou quais equipamentos usa para monitorar a estrutura – além das câmeras.

Com longo histórico de exploração de ouro, a retirada de minério de ferro no Gongo Soco começou no fim de 1980. Adquirida pela Vale em 2000, as atividades no local seguiram até 2016, quando o minério de ferro acabou.

A empresa também não respondeu se será possível restaurar as estruturas no local para que a barragem volte a ser segura. Na avaliação de Carlos Barreira Martinez, pesquisador da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), essa operação custaria muito dinheiro à Vale.

“Eles devem propor que a barragem seja desmontada ao longo do tempo, gradualmente, com retirada da água do rejeito e depósito desse material em pilhas”, avalia. O tempo de descomissionamento pode levar de três a cinco anos, segundo a estimativa de Martinez.

Um plano de fechamento da mina ainda é desconhecido. Quando recebeu autorização para explorar o minério em Barão de Cocais, a Vale não precisou apresentar qual solução daria depois que as atividades acabassem, segundo pesquisa científica publicada em 2008 pela Ufop (Universidade Federal de Ouro Preto).

homem aponta para mapa

José Flávio Rodrigues Junior aponta os locais que seriam atingidos por um rompimento da barragem

Martinez se surpreende com o que considera uma “inabilidade enorme” da empresa. “Existe alguma coisa acontecendo lá que fez com que eles entrassem em pânico”, pontua. “É estranho que a maior mineradora do mundo não saiba lidar com uma situação de risco”, comenta sobre o cenário em Barão de Cocais, Macacos e Ouro Preto, cidades onde outras barragens da Vale também estão em nível máximo de alerta.

Medo e incerteza

Para os moradores de Barão de Cocais, faltam informações claras sobre a situação. Eles querem saber quais medidas estão sendo tomadas e por quanto tempo viverão em alerta permanente.

“É como um vulcão prestes a entrar em erupção. As pessoas estão doentes: depressão, hipertensão, síndrome do pânico. Mesmo as crianças que moram longe da área de inundação ficam preocupadas com os parentes que estão dentro da área da mancha”, relata o prefeito.

No centro da cidade, que seria atingido por rejeitos, o comércio está mais vazio. “As pessoas têm medo de andar por aqui”, comenta o dono de uma oficina mecânica. O promotor de Justiça Cláudio Daniel Fonseca de Almeida estuda como responsabilizar a Vale pelos impactos econômicos sentidos pelos moradores.

“Vamos propor o pagamento de um valor emergencial para a população inteira nos mesmos moldes de Brumadinho”, explicou à DW Brasil. O promotor divide o tempo entre o atendimento à população e a organização da nova sede do Ministério Público – o órgão, assim como todo o Fórum Municipal, teve que abandonar o prédio oficial pelo risco trazido pela barragem.

Em frente à igreja matriz, que abriga obras de Aleijadinho, carros de som estão a postos dia e noite. Virão deles o aviso para que os moradores sigam a rota de fuga em caso de rompimento. Os motoristas contratados não sabem até quando estarão ali, de prontidão.

“Nossa cidade agora ficou marcada por causa dessa barragem. Ninguém mais quer vir aqui. O pior é pra gente que fica e não sabe se isso tudo um dia terá fim”, diz um dos aposentados do grupo que frequenta diariamente o coreto em frente à matriz.

Fonte: https://www.dw.com/pt-br/em-alerta-devido-a-barragem-cidade-convive-com-p%C3%A2nico/a-48247786

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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