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Brumadinho

Lama da Vale chega à aldeia Naô Xohã

Lama de rejeitos da Vale chega à aldeia Pataxó Hã-hã-hãe pelo rio Paraopeba; indígenas decidem permanecer na área

Nosso povo tem feito orações em solidariedade às vítimas e familiares da tragédia provocada pela mineradora Vale” – Cacique Háyó Pataxó Hã-hã-hãe 

Da: Assessoria de Comunicação do CIMI

A lama de rejeitos da barragem do Córrego do Feijão, da mineradora Vale, em Brumadinho, região metropolitana de Belo Horizonte (MG), chegou ontem à tarde ao rio Paraopeba e na madrugada deste sábado, 26, foi avistada a partir das margens da aldeia Naô Xohã, do povo Pataxó Hã-hã-hãe, situada no município de São Joaquim de Bicas, vizinho ao local da tragédia que, até o final da tarde deste sábado, deixou 34 mortos, 296 desaparecidos e mais de 80 desabrigados. Na aldeia vivem 25 famílias.
De acordo com o cacique Háyó Pataxó Hã-hã-hãe, a água do rio Paraopeba começou a sofrer alterações por volta das 4 horas da manhã. “A água ontem estava clara, mas hoje está vermelha escura. Já tem um bocado de peixe morto, boiando, com a boca pra fora pedindo socorro”, afirma. O cacique lamenta as vidas perdidas e informa que o povo tem feito orações em solidariedade às vítimas da tragédia provocada pela mineradora Vale.
Depois do rompimento da barragem, seis prefeituras de municípios da Bacia do Paraopeba, incluindo São Joaquim de Bicas, emitiram alertas para que a população se mantenha longe do leito do rio, pois o nível pode subir com a quantidade de lama que nele chegou. Bairros foram evacuados, incluindo a aldeia, mas os indígenas decidiram não ficar na cidade e permanecer na parte alta da área de 33 hectares ocupada há um ano e meio.
“Em Bicas é difícil. Não dava pra ficar lá. É muito preconceito. Onde a gente vai na cidade botam a guarda municipal, polícia. Aqui na aldeia estamos bem”,  diz o cacique. Mesmo na parte alta, mais afastada do rio, às 25 famílias indígenas a orientação repassada é a de não chegar perto do leito e tampouco fazer qualquer uso de suas águas: “Resíduo de minério é perigoso, não sabemos o que tem nele”.
O cacique Háyó completa que mesmo quando o rio enche, as águas não chegam na parte da aldeia onde os indígenas decidiram permanecer. Entendendo que estão seguros e observando de longe o rio, preferem se manter perto das plantações, terreiros e moradias. Raquel Pataxó Hã-hã-hãe ressalta que a comunidade não está na parte mais baixa da terra ocupada, mas segue atenta aos desdobramentos da tragédia de Brumadinho – inclusive prestando solidariedade.
“É a Mãe Natureza vomitando o que o homem branco tá fazendo. Ficamos tristes. Os peixes ali agonizando… é ruim de ver. Uma coisa que é de sustento não só dos Pataxó, mas de várias famílias, se acabando tudo”, diz o cacique. Além da pesca e da água para o dia a dia, o rio mantinha as roças dos Pataxó Hã-hã-hãe: mandioca, milho, bananeiras, fruteiras, hortaliças e pequenas criações.
Entre os Pataxó Hã-hã-hãe a dúvida é como a aldeia irá sobreviver às margens de um rio poluído gerando impacto em todo o meio ambiente local. “O café da manhã era peixe com farinha e mandioca cozida. Agora temos de pedir forças pros nossos encantos. Quando se trata de índio, aqui ninguém nem chega nem perto. A Funai nos ajuda muito pouco. O rio era a nossa fonte de vida e a de muita gente aqui nessa região. Vidas perdidas, o rio destruído… é uma tragédia”.
Kenya Pataxó Hã-hã-hãe explica que a aldeia Naô Xohã surgiu a partir da ida dos Pataxó e Pataxó Hã-hã-hãe, há muitas décadas, para Minas Gerais; com o intuito de vender artesanatos ou de fugir das ameaças geradas pelas disputas fundiárias com fazendeiros no sul da Bahia. “Aqueles que ficaram sentiram a necessidade de fazer uma aldeia, ficar mais próximo dos costumes”.
Há um ano e meio os Pataxó Hã-hã-hãe ocuparam 30 hectares de terras. A área, protegida como reserva ambiental, está sob litígio e pertence a uma mineradora do empresário Eike Batista, a MMX Mineração e Metálicos S.A. “A nossa origem é do sul da Bahia”, diz Eni. Dispersões provocadas por perseguições ou busca por melhores condições de vida levaram os Pataxó Hã-hã-hãe e também os Pataxó para diferentes regiões de Minas Gerais, a partir da década de 1970.
Tragédia se repete
Há três anos, em novembro de 2015, a barragem de Fundão rompeu, devastou a bacia do Vale do Rio Doce e afundou em lama a cidade mineira de Bento Rodrigues, em Mariana, deixando 19 mortos e centenas de desalojados. Os rejeitos chegaram até a foz do Rio Doce, no Espírito Santo. A Samarco, empresa com participação da mineradora Vale, é uma das principais responsáveis pelo episódio de Fundão.
Cerca de 126 famílias do povo Krenak vivem espalhadas em sete aldeias às margens do Rio Doce. Antes do desastre de Fundão, pescavam, caçavam e viviam abastecidos pela água do rio. Com a poluição gerada pela lama de rejeitos, os Krenak se vêem hoje dependentes de recursos estatais e da alimentação comprada em supermercados. Não podem plantar, os animais desapareceram da região e o rio segue inutilizável, em um processo de recuperação que pode levar mais de uma década.

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Fonte: Assessoria de Comunicação do CIMI, com edições de Zezé Weiss/Xapuri Socioambiental

Foto: Indígenas Pataxó Hã-hã-hãe se banham no rio Paraopeba, agora poluído pela lama da Vale. Foto: Reprodução de vídeo da comunidade.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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