“Cadê ocê, Bestão?”

“Cadê ocê, Bestão?”

Obrigado, Bestão. Você nos tornou pessoas melhores. Aprendemos muito com você.

Por Fernando Frajola

Aviso de textão (em 24.03.2023. 

Quando tive a confirmação do falecimento do Beto Mafra, fui de poucas palavras. Mas agora, já superando o impacto da notícia, preciso compartilhar algumas coisas com vocês.
 
Algumas amigas comentaram comigo o “sumiço” dele no início do ano. Tentei mandar mensagem no zap, não me respondeu. Daí, perguntei aqui no FB dele: “cadê ocê, Bestão?”. Isso foi em janeiro. Sem resposta. Preocupamos.
A partir de então, alguns amigos começaram a se mobilizar. (Não citarei nomes para não cometer injustiças. Alguns, eu até desconheço a contribuição).
 
 
Descobrimos que ele estava com problemas de saúde e um pouco deprimido. A filha que morava perto estava cuidando dele. Mas, precisava fazer exames e consultas médicas… e isso podia demorar. Novamente, este grupo de amigos se mexeu para ajudar. A coisa chegou até ao Ministro Alexandre Padilha, que deu “o empurrão que faltava”.
 
Beto fez as consultas e exames. Identificaram os problemas, foi internado e marcaram a cirurgia, que não seria simples. Infelizmente, o resto da história vocês sabem. A cirurgia foi na terça e ontem ele faleceu.
 
O amigo Fernando Miller soube, viu uma foto minha com ele e minha esposa, os 3 super felizes e pediu autorização para publicar no DCM. Outras mídias repercutiram e até o PT lançou Nota Oficial o homenageando.
 
A família queria realizar o último desejo dele: ser cremado. Para isso se fez uma vakinha. Pois não é que em cerca de apenas 8 horas, 111 pessoas contribuíram e o valor foi arrecadado?
 
Então, me caiu a ficha. Beto Mafra se foi, mas a corrente de amor e solidariedade em torno dele permanece, firme e forte.
 
Obrigado, Bestão. Você nos tornou pessoas melhores. Aprendemos muito com você.
 
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NOTA DA REDAÇÃO – Recebemos do parceiro Luís Celso, na tarde do dia 24.03, o link da vaquinha. Minutos depois, chegou o aviso de que a meta já havia sido cumprida. Triste pela partida do Beto Mafra, confortada pela expressão de solidariedade com o Bestão.  

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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