Conferência Indígena da Ayahuasca: Longe é um lugar que não existe…

Conferência Indígena da Ayahuasca: Longe é um lugar que não existe…

LONGE É UM LUGAR QUE NÃO EXISTE QUANDO ESTAMOS CONECTADOS PELO CORAÇÃO E PELA ALMA – 

Feliz com as notícias que chegam da I Conferência Indígena da Ayahuasca, realizada entre os dias 13 e 17 de dezembro deste ano que se finda (2017), na Terra Indígena Puyanawa, Município de Mâncio Lima – Vale do Juruá.
Notícias que chegam através da Rádio Yandê, registrada pela nossa querida Daiara Tukano; pelo lindo texto da amiga, desembargadora Cláudia Aguirre; pela matéria brilhante do nosso amigo, jornalista Leandro Altheman Lopes; pelas notas com informações preciosas, cheias dos “sentires” do nosso querido amigo, txaizão, Jairo Lima, e de mensagens de amigos, que expressam sua admiração, e da importância desse encontro.

Encantada pelo de organização do evento, realizado pelas Organizações do Juruá (OPIRJ, OPIRE, ASKARJ); pela assessoria e apoio da FUNAI/Regional Juruá, seja na organização do evento, divulgação, e/ou sistematização dos documentos elaborados pelos participantes indígenas presentes.
Feliz por constatar que longe não existe entre eu e os parentes dessa nossa de muitas jóias.

Feliz por constatar que, de alguma forma, estava entre esses parentes e amigos, mesmo na lonjura que nos separa nesse momento. Estamos conectados pelo coração e alma.

Quando me foi confirmado à impossibilidade de participar fisicamente da Conferência, escrevi uma carta para ser lida durante o encontro.  Para isso, me vali da parceria desse grande amigo Jairo Lima, o qual, logo se prontificou em ser o mensageiro. O que me deixou feliz e honrada.

A este amigo, meu agradecimento especial, pelo carinho, pela atenção, e por compartilhar comigo o processo de organização do evento, bem como a sua realização e encaminhamentos, mantendo-me informada, e assim, conectada com essa energia florestana.

Feliz, honrada e muito grata no coração a minha querida amiga Evanísia Puyanawa, que se dispôs a fazer a da carta, com minhas saudações,  abrindo assim a 1a Yubaka Hayrá – Conferência Indígena da Ayahuasca.
Para os amigos que me solicitaram a divulgação da carta, segue uma cópia da mensagem na íntegra:

“Saudação da Txai Dedê Maia
Prezadas e prezados parentes, representantes indígenas de vários Povos aqui presentes, meus Txais e Shanus, organizadores desse importante evento, na pessoa do meu Txai Luiz Nukini e Jairo Lima (FUNAI/Regional Juruá), apoiadores e solidários, palestrantes e mediadores, anfitriões, Puyanawa, na pessoa do meu querido amigo, Liderança Txai Mário Puyanawa…
A minha saudação, aqui dessa lonjura, com muita saudade da floresta, e de todos vocês.
Estou no Rio de Janeiro! Estou longe! Cuidando da saúde, que não anda muito boa. Para isso peço aos meus Txais, rezo forte e força para minha cura.
Escrever foi o único meio que me restou de me fazer presente entre vocês, nesse momento tão sonhado e tão importante.
Mas, estou perto de vocês com o coração, no pensamento, no desejo de que este encontro seja muito proveitoso e prazeroso para todos vocês.
Bem diferente do que foi a II Conferência Mundial da Ayahuaska, que aconteceu na cidade de , entre os dias 17 a 22 de outubro de 2016, organizada por um grupo de espanhóis e alguns cientistas nawás (não-índio).
Participei daquele encontro, e sou testemunha do quanto foi difícil a participação indígena.
Ouvi em diversos momentos, ditos pelos organizadores do evento, os espanhóis, respondendo a nossa insistência em colocar representações indígenas em algumas mesas dos cientistas ocidentais, que “a conferência não era indígena. A conferência era científica.” Ou então, argumentavam, com arrogância que “os “índios” eram apenas convidados.”

deDE LONGE

Mas, nós entendíamos de outro jeito. Entendíamos que os representantes indígenas eram os anfitriões. Essa galera estava chegando a nossa terra.

Terra de onde essa semente de conhecimentos científicos da floresta, conhecida mundialmente como Ayahuasca, há cem anos voou que nem semente de samaúma, por esse mundão a fora.

Além de considerarmos que os assuntos abordados pelos cientistas ocidentais diziam respeito aos Povos Indígenas. Guardiões há séculos desses conhecimentos.

Mas, a arrogância e o elitismo científico ocidental, levados por alguns “doutores” do assunto, não permitiram que abrissem mão do formato acadêmico de suas conferências. Não sabem dialogar com os Povos Indígenas fora de suas “caixinhas” acadêmicas.

Aqui, vocês estão em casa de parentes meus Txais e Shanus, e por tanto, bem dizer na casa de vocês também. Tenho certeza disso. O povo indígena sabe ser um bom anfitrião, e sempre recebe com fineza seus visitantes.

Diferente do modo como os representantes indígenas foram recebidos na citada II Conferência Mundial da Ayahuaska, realizada pelos europeus.

Aqui vocês estão livres para falar, para dialogar, para pensar caminhos possíveis com os conhecimentos sagrados e ancestrais dos Povos Indígenas.

Gostaria muito de estar falando ao vivo, com vocês!!! Ah! Como eu gostaria!!! Mas infelizmente meu estado de saúde não permitiu.Desejo que as rodas de boas conversas, e os pensamentos de todos vocês, sejam bem iluminados pelas entidades que guiam os diferentes povos indígenas; que nas rodas dos rituais com a Ayahuasca, bebida sagrada que para cada povo, tem um nome específico, e que não é uma simples denominação lingüística, mas, que trás toda a espiritualidade que orienta cada povo, de jeito diferente… Iluminem e dêem bons encaminhamentos a esses bons pensamentos e a essas boas conversas que vão acontecer durante esses dias.

Um grande abraço a todos!
Haux! Haux! Haux!”

dede fot

Dede Maia é e pesquisadora. Sua trajetória de mescla-se com a do indigenismo acreano. Junto com  grandes indigenistas como os Txais Terri e Antonio Macêdo ajudou a construir o que hoje chamamos  “a história do Acre Indígena” . Mesmo desenvolvendo vários projetos diferentes em sua trajetória, sempre se destacou como incentivadora e apoiadora do processo de fortalecimento da cultura tradicional em sua expressão artística e material, sendo autora, coautora ou participante de um-sem número de projetos voltados à esta frente indigenista.

Imagens de Ramon Aquim, selecionadas por Jairo Lima. Conheça a página do o blog Cronicas Indigenistas cronicasindigenistas do nosso parceiro Jairo Lima.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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