Convivialidade: uma virtude que nos falta
A convivialidade como conceito foi posta em circulação por Ivan Illich (1926-2002), um dos grandes pensadores proféticos do século XX. [Illich] Tornou-se famoso por questionar o paradigma da medicina e da escola convencional. Por meio da convivialidade, tentou responder a duas crises: a do processo industrialista e a da ecologia
Por Leonardo Boff
O que se entende por convivialidade? Por convivialidade (não consta do dicionário Aurélio) se entende: a capacidade de fazer conviver as dimensões de produção e de cuidado; de efetividade e de compaixão; de modelagem dos produtos e de criatividade; de liberdade e de fantasia; de equilíbrio multidimensional e de complexidade social. Tudo para reforçar o sentido de [pertencimento] do ser humano dentro da natureza, da sociedade e do universo.
O valor técnico da produção material deve caminhar junto com o valor ético da produção social e espiritual (…). Os valores humanos do amor, da sensibilidade, do cuidado, da comensalidade e da veneração podem impor limites à voracidade do poder-dominação e à exploração-produção-acumulação (…).
A convivialidade também pretende ser uma resposta adequada à crise ecológica, produzida pelo processo industrialista dos últimos séculos (…). Alguns têm aventado a hipótese de uma catástrofe de dimensões apocalípticas. Isso é possível, mas não fatal. Importa deixar em aberto a chance de um uso convivial dos instrumentos tecnológicos a serviço da preservação da vida, do bem-viver da humanidade e da salvação de nossa civilização.
Esse novo patamar provavelmente conhecerá uma sexta-feira santa sinistra, que precipitará no abismo a ditadura do modo-de-ser-trabalho-produção material para permitir um domingo de ressurreição: a reconstrução da sociedade mundial sobre a base do cuidado, da responsabilidade coletiva e da real sustentabilidade.