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Discurso do Lula nos 42 anos do PT

Discurso do Lula nos 42 anos do PT

“O meio ambiente precisa ser cuidado com todo o carinho. Boiada nenhuma vai passar por cima do que pertence a todos nós, e não à elite irresponsável desse país.

Por Lula

Companheiras e companheiros,

É com muito orgulho e muita alegria que comemoramos mais um aniversário deste partido que nós fundamos para dar voz ao povo brasileiro.

Infelizmente, o Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras chega aos 42 anos num momento especialmente triste da história do Brasil, que nega todas as conquistas que realizamos ao longo dessas quatro décadas de luta.

Fundamos o PT para combater as desigualdades, a concentração de renda, a fome, a inflação, o desemprego, o atraso econômico, a subserviência do Brasil aos interesses estrangeiros. Combatemos, e vencemos, tanto na oposição quando no governo.

Levamos 22 anos para chegar ao governo. E em apenas 13 anos de governo, conseguimos o que nenhum outro partido, em qualquer momento da história, jamais foi capaz de realizar.

Foram tantos acertos, que os atrasados desse país se viram obrigados a dar um golpe e derrubar a primeira mulher eleita presidenta do Brasil.

E depois, no golpe dentro do golpe, impediram que o primeiro operário a chegar à Presidência disputasse novamente – e vencesse – a eleição de 2018.

Fizeram o Brasil recuar no , e trouxeram de volta todos os flagelos que havíamos conseguido derrotar.

Tudo isso em meio a uma pandemia que matou mais de 630 mil brasileiros, devido à atitude criminosa e a negação da ciência por parte do atual governo.

Apesar de todos os retrocessos que o país atravessa, temos o que comemorar no dia de hoje.

Mesmo com todas as tentativas de destruição do PT, e da acirrada campanha de criminalização da política, estamos vivos e mais fortes do que nunca. E continuamos a ser o partido político mais querido pelo povo brasileiro.

Nossa força mostra o quanto sonhar e lutar vale qualquer esforço.

Mostra também o poder da solidariedade contra o egoísmo, do sobre o ódio. E eu peço licença para dedicar minha fala a esse que é o sentimento mais nobre do ser humano, tão caro a cada um e a cada uma de nós.

Porque, antes de tudo, o PT é o partido do amor. Do amor ao Brasil e ao povo brasileiro.

Companheiros e companheiras.

Acredito em todas as formas de amar. Creio no amor romântico, o amor fraterno, o amor de uma mãe e de um pai pelos filhos, o amor aos nossos amigos, o amor da gente por um animal de estimação – e dele pela gente.

Ao longo de 76 anos, 50 dos quais dedicados à militância política, vivenciei tantas vezes o amor, e também o seu oposto.

Fui vítima do ódio, que me custou 580 dias de prisão injusta e ilegal, condenado à saudade incurável dos meus entes queridos e do povo brasileiro, a quem amo de paixão.

Mas sempre fui – e serei – acima de todos os ódios, abençoado pelo amor. Aprendi na Bíblia que “se eu não tiver amor, eu nada serei”.

Vi de perto tudo o que de mais belo a humanidade é capaz de construir, se ela tiver amor.

Acredito no ser humano. Minha fé na humanidade é resultante da crença inabalável nesse sentimento cantado em verso e .

Mas, acima de tudo, acredito na igualdade entre os seres humanos. Ninguém é melhor do que ninguém.

Ninguém pode ser dono de ninguém, muito menos do inteiro. Nem a mais temida superpotência, com suas armas de destruição em massa, nem o mais poderoso bilionário, com seus iates, jatos e foguetes.

A superpotência, com seu arsenal atômico capaz de destruir várias vezes o planeta, sabe que só existe um planeta, e que depende dele para viver.

O bilionário, com dinheiro de sobra para apreciar a do espaço, sabe que sua fortuna depende da sobrevivência da espécie humana, e que se esta desaparecer, de nada valerão todos os bens que ele acumulou em vida.

Companheiros e companheiras.

O amor e o ódio caminharam lado a lado na história da humanidade. Precisamos, mais do que nunca, fazer com o que a amor prevaleça.

O ser humano é o resultado de milhões de anos de evolução. Não nos tornamos a espécie mais poderosa do planeta apenas pelo cérebro mais desenvolvido, a sofisticação da nossa linguagem ou a capacidade de fabricar ferramentas.

Mas também pela capacidade de cooperarmos em larga escala, com um grande número de desconhecidos. Essa cooperação também pode ser chamada de amor ao próximo.

Há milhões de anos, quando nossos antepassados se uniram e passaram a cooperar nas caçadas, eles foram capazes de derrotar as feras mais perigosas.

Se nos unirmos agora, seremos capazes de construir um mundo com mais amor. Um mundo melhor para todos. Mas se permanecermos desunidos, nos tornaremos cada vez mais uma ameaça à nossa própria sobrevivência.

Somos a espécie mais evoluída. No entanto, nossa ganância e nosso individualismo estão destruindo o planeta, sem a necessidade de dispararmos uma bomba atômica sequer.

Somos, também, o predador mais letal que já pisou sobre a face da Terra. Levamos à incontáveis espécies de animais, ao mesmo tempo em que domesticamos e condenamos outros ao sofrimento mais atroz.

Nossa arrogância nos fez acreditar que em algum momento do passado fomos capazes de eliminar os grandes males que dizimavam nossos antepassados: a fome, as guerras e as pestes.

No entanto, nos dias de hoje, a fome castiga 900 milhões de homens, mulheres e em todo o mundo.

Guerras sem fim expõem populações inteiras a mortes, doenças, extrema e migrações forçadas.

O novo coronavírus, a peste dos nossos tempos, já matou mais de 5 milhões e 700 mil pessoas ao redor do planeta.

Num espaço de tempo relativamente pequeno em termos de história natural, evoluímos da pedra lascada à inteligência artificial.

Criamos a internet, uma das mais extraordinárias invenções da humanidade. Com ela, os seres humanos conquistaram a capacidade de acumular mais e mais conhecimento e cooperar ainda mais entre si, numa escala antes inimaginável.

No entanto, essa mesma internet tem servido também para o seu contrário: propagar a ignorância e o negacionismo, e disseminar o ódio, o racismo, o machismo, a homofobia e todas as formas de preconceito.

E também para espalhar mentiras e desinformação, inclusive contra as vacinas, que a inteligência humana foi capaz de criar para salvar milhões de vidas.

Numa das tristes ironias do nosso tempo, a internet – esse grande avanço da ciência –, tem sido usada para desacreditar a própria ciência.

Companheiros e companheiras.

Jesus Cristo, o ser humano mais extraordinário que passou por esse planeta, nos ensinou a maior de todas as lições: Amai-vos uns aos outros.

O amor está na base de todas as religiões e na maioria das culturas. Por que então insistimos tanto em não nos amarmos uns aos outros?

Caminharemos para a autodestruição se deixarmos de lado a cooperação, que guiou a humanidade ao longo de milhões de anos, se não enxergarmos mais o próximo como nosso irmão.

Se permitirmos que a desigualdade continue cavando um fosso cada vez mais profundo e intransponível entre ricos e pobres.

Nunca fomos tão prósperos, com acesso a bens materiais que nossos antepassados não podiam sonhar. Mas, ao mesmo tempo, nunca fomos tão solitários e desiguais.

A desigualdade mata um ser humano a cada quatro segundos, de acordo com relatório divulgado pela Oxfam no início deste ano.

O mesmo relatório revela que, em plena pandemia, os dez homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas, enquanto a renda de 99% da humanidade entrou em queda livre, e mais de 160 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza.

A ganância envenenou o espírito humano. 12 mil anos após o início da revolução agrícola, produzimos alimentos em quantidade suficiente para alimentar todos os habitantes deste planeta.

No entanto, 2,1 milhões de seres humanos morrem de fome todos os anos.

A medicina deu saltos extraordinários, erradicou doenças que antes dizimavam milhões de pessoas.

No entanto, nos países pobres, 5,6 milhões de seres humanos morrem todos os anos por falta de acesso à saúde.

As empresas fabricam computadores cada vez mais sofisticados, conectados a uma internet cada vez mais veloz.

No entanto, milhões de crianças no mundo inteiro não possuem sequer um lápis e um caderno.

A tecnologia criou máquinas e algoritmos para aumentar a produtividade do trabalho.

No entanto, o desemprego e a destruição dos direitos trabalhistas nos tornam cada vez mais pobres.

A ciência decifrou nosso código genético, e está bem próxima de deter o processo de envelhecimento, para que o ser humano possa viver com perfeita saúde até os 150 anos.

No entanto, aqui no Brasil, a mortalidade infantil voltou a subir, impedindo crianças de completar sequer o primeiro ano de vida. E jovens negros da periferia continuam morrendo todos os dias, fuzilados pelo racismo estrutural.

Companheiras e companheiros.

Sabemos o quanto o ser humano é capaz do bem e do mal. Dos gestos mais nobres e dos atos mais cruéis.

Recentemente, vimos com horror um imigrante congolês espancado até a morte no Rio de Janeiro, ao tentar receber de seus patrões o que lhe era devido pelo seu trabalho.

Na mesma semana, vimos uma professora de uma escola pública do interior do Pará dançando e chorando de alegria ao saber que seus alunos conquistaram vagas no ensino superior.

Essa professora não receberá sequer um centavo de aumento pela sua e o sucesso de seus alunos. A felicidade dela é unicamente pela felicidade do próximo – porque o ser humano é assim, vocacionado para amar seus semelhantes.

Precisamos lutar com todas as forças para que o ódio que matou um trabalhador imigrante, e que todos os dias mata mulheres, negros, índios, gays, lésbicas e transexuais seja banido para sempre.

Ao mesmo tempo, precisamos nos inspirar no amor dessa professora pelo seu trabalho e pelos seus jovens alunos.

Porque o amor será sempre maior que o ódio. A verdade será sempre maior que a mentira. E a esperança mais uma vez haverá de vencer o medo.

O pesadelo está perto de fim. É hora de devolvermos ao povo brasileiro a capacidade de sonhar. E mostrar que esses sonhos podem transformar a realidade outra vez.

O PT precisa governar de novo, para provar que a classe trabalhadora sabe cuidar desse país melhor do que ninguém.

Para que nosso povo volte a fazer pelo menos três refeições por dia, ter educação e saúde de qualidade, emprego com salário digno e carteira assinada.

Para que o salário mínimo volte a ser reajustado acima da inflação. A gasolina, o diesel, o gás de cozinha, a energia elétrica, a cerveja gelada e o churrasco do fim de semana caibam de novo no bolso dos brasileiros. E o filho do trabalhador volte a ter a oportunidade de se tornar doutor.

Precisamos voltar a investir na agricultura familiar, na cultura, na ciência e na tecnologia. A Petrobrás, a Eletrobrás e todas as nossas estatais voltem a ser um do povo brasileiro.

O meio ambiente precisa ser cuidado com todo o carinho. Boiada nenhuma vai passar por cima do que pertence a todos nós, e não à elite irresponsável desse país.

O Brasil irá voltar a ser respeitado internacionalmente, e o povo brasileiro voltará a ser feliz e a ter orgulho do seu país.

Nós fomos capazes de fazer tudo isso em apenas 13 anos, e vamos fazer de novo, agora com ainda mais experiência e mais desejo de mudança.

Com mais espírito de luta, e muito amor no coração.

Parabéns a todas e todos. E viva o PT.”

Do site lula.com.br

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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