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Em carta a servidores, presidente do ICMBio diz que indiciamento em CPI é ataque ao órgão

Em carta a servidores, presidente do ICMBio diz que indiciamento em CPI é ataque ao órgão

CPI controlada por ruralistas indicia Mauro Pires por consultoria na área de licenciamento enquanto esteve afastado, entre 2012 e 2015. Associação de servidores também reage.

Por Gabriel Tussini/ O Eco

Em carta aberta enviada ontem (14) a servidores do ICMBio, o presidente da autarquia, Mauro Oliveira Pires, classificou seu indiciamento na CPI das ONGs, do Senado, como um “meio escolhido para atacar o trabalho do ICMBio” e “de todas as instituições ambientais e de seus servidores”. No relatório aprovado por 5 votos a 3 na última terça (12), a comissão fez de Pires seu único indiciado, acusando-o de corrupção passiva e improbidade administrativa por ter prestado consultoria na área de licenciamento ambiental enquanto esteve de licença não remunerada do órgão, entre 2012 e 2015.

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A ministra Marina Silva em depoimento na CPI das ONGs, realizado no dia 27 de novembro. Na mesa, o relator da CPI, senador Marcio Bittar (União-AC) e no centro o presidente da CPI, senador Plínio Valério (PSDB-AM). Foto: Roque de Sá/Agência Senado.

O relatório do senador Márcio Bittar (UNIÃO-AC) alega que Pires recebeu “para atuar em favor de particulares, em razão do conhecimento e da influência próprios de sua função pública”, o que configuraria os crimes de improbidade administrativa e corrupção passiva, segundo Bittar. Na carta, Pires narra ter apresentado aos senadores um parecer da Consultoria Jurídica do Ministério do Meio Ambiente, “que comprova não haver fundamento legal nem materialidade” nas acusações. Nos 3 anos de afastamento, o atual presidente da autarquia trabalhou na empresa Canumã, da qual era sócio.

Uma nota pública da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASCEMA Nacional), divulgada no último dia 8, frisa que as acusações não tem materialidade, pois se limitam “à ilação de que a constituição de serviço de consultoria, fora da função, servia-se à prática de corrupção passiva”. “O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio não emite licenciamento ambiental e não está entre suas atribuições tal instrumento”, reforça a entidade, que fala ainda em “abuso de autoridade” por parte dos senadores.

A lei 8112/90, que regula a carreira de servidor público, não proíbe a execução de atividades econômicas por parte de servidores em licença não remunerada – os únicos impedidos são os afastados por motivo de doença em pessoa da família. O relatório, segundo a nota da ASCEMA Nacional, faz “a ilação de que o servidor, uma vez retornado ao cargo, possa ter eventualmente atuado nos mesmos processos”. Segundo Pires, as acusações são “injustas”, “causam indignação e afrontam a minha honra”.

O próprio relatório reforça, ao propor o indiciamento, que a manifestação “não se confunde com o ato privativo do delegado de polícia”, “por meio do qual, fundamentadamente, mediante análise técnico-jurídica do fato, o delegado indica autoria, materialidade e circunstâncias do delito investigado” – indicando que essa análise não foi feita.

Na carta, Pires alega que o indiciamento poderia ser uma retaliação pelo trabalho do órgão. Segundo ele, o ICMBio, assim como o Ibama, “incomodam quando combatem o desmatamento, apreendem madeira ilegal, destroem maquinários e equipamentos do garimpo ilegal ou expulsam invasores de terras indígenas”, entre outras ações, mas que o órgão age em cumprimento de seu dever legal.

Confira a íntegra da carta de Mauro Pires aos servidores do ICMBio:

“Aos colegas e amigos do ICMBio, 

Como é de conhecimento, foi instaurada a Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, no Senado Federal, com o objetivo declarado de investigar a liberação de recursos do Governo Federal para ONG e OSCIP, assim como o uso de recursos externos por elas no período de 2002 a 2023.  

Como atual presidente deste ICMBio, fui convidado a depor sobre a relação do Instituto com as organizações da sociedade civil, e nessa condição compareci à CPI no dia 31 de outubro de 2023. 

Para meu espanto, no último dia 5 de dezembro foi lido o relatório final da CPI contendo o pedido de meu indiciamento pelo suposto crime de corrupção passiva e improbidade administrativa. A razão seria o fato de eu ter declarado no depoimento que, durante minha licença sem remuneração do ICMBIO, entre 2012 e 2015 – concedida nos termos do Art. 91º da Lei Nº 8.112/90 –, realizei consultorias. Em busca de me defender, percorri os gabinetes dos senadores entre segunda e terça feiras, aos quais apresentei o “memorial”, que demonstra a improcedência da acusação, bem como o parecer da Consultoria Jurídica do MMA, que comprova não haver fundamento legal nem materialidade nas acusações injustas a mim imputadas.  

Infelizmente, o relatório acabou sendo aprovado na terça-feira passada (12 de dezembro), com o voto favorável de 5 senadores e 3 contrários.   

No contato com os parlamentares, assim como no debate da sessão que aprovou o documento, ficou claro que eu não era propriamente o alvo dos ataques. O pedido de indiciamento foi o meio escolhido para atacar o trabalho do ICMBio, e, também, do Ibama, do MMA e de todas as instituições ambientais e de seus servidores. 

O ICMBio incomoda. O Ibama incomoda. Incomodam quando combatem o desmatamento, apreendem madeira ilegal, destroem maquinários e equipamentos do garimpo ilegal ou expulsam invasores de terras indígenas. Incomodam quando atuam para que as reservas extrativistas sejam territórios seguros das comunidades tradicionais. Incomodam quando não pactuam com a ilegalidade e combatem o crime organizado. Incomodam quando conseguem reduzir em 62% o desmatamento dentro de Unidades de Conservação na Amazônia em tão pouco tempo. Incomodam interesses que vivem à margem da legalidade.

Mas se assim agimos é porque estamos no estrito cumprimento do nosso dever legal e de nossa missão, de “proteger o patrimônio natural e promover o desenvolvimento socioambiental”.  

As acusações injustas que sofro me causam indignação e afrontam a minha honra. Mas são também afronta a este Instituto, materializada no meu nome. Por isso, reafirmo meu compromisso de continuar trabalhando para que o ICMBio tenha as condições políticas, humanas, materiais e financeiras para o desempenho de suas atribuições institucionais.   

Acompanharei com atenção, devidamente assessorado, os desdobramentos desse relatório.

Agradeço a todos vocês, servidores e colaboradores do ICMBio, pelo apoio que tenho recebido neste momento.  

Brasília, 14 de dezembro de 2023 

Mauro Oliveira Pires”

Gabriel TussiniEstudante de Jornalismo (UFRJ). Fonte: O Eco. Foto de capa: Marcos Oliveira/Agência Senado.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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