Estudantes indígenas e quilombolas na luta, aprendendo e construindo a união
“O colonialismo interno e o neocolonialismo impregnam as relações de saber, poder e ser. Mudanças profundas dessas estruturas só serão possíveis através de lutas de transformação dos sistemas dominantes”. Artigo de Egon Heck, do secretariado nacional.
Eram 300 estudantes universitários, indígenas e quilombolas, em um momento de somar e construir juntos a união necessária para conquistar a tão sonhada autonomia em seus territórios, na pluralidade de povos e culturas. De 18 a 22, deixavam o Centro de Formação Vicente Canãs (CFVC) cedinho, toda manhã sempre animados pela histórica semana de mobilização e luta pelos seus direitos, em Brasília (DF).
Precisam não apenas chegar às universidades, mas nelas poder permanecer e contribuir com a sabedoria de seus povos, lutar pela descolonização desse espaço de saber e sabedoria. Os estudantes indígenas e quilombolas têm consciência de que essa é uma tarefa difícil pois o ranço colonial está impregnado nas estruturas das universidades onde ainda precisam enfrentar muitos preconceitos, desprezo e racismo. Contudo, persistem na resistência de séculos.
A descolonização necessária
O colonialismo interno e o neocolonialismo impregnam as relações de saber, poder e ser. Mudanças profundas dessas estruturas só serão possíveis através de lutas de transformação dos sistemas dominantes. Essa semana de mobilização provou isso. Acreditam que a presença de indígenas e quilombolas nas universidades poderá ser um desses espaços de transformação e superação do sistema colonial.
Na avaliação, no final da semana de mobilização e incidências políticas em vários órgãos do Estado brasileiro, corria a emoção, lágrimas e compromisso. Dos mais de 300 estudantes indígenas e quilombolas de universidades de todas as regiões do país, foi destacada a importância da união promissora que vem se consolidando entre os povos indígenas e quilombolas.
“Ajudamos a construir mais uma página bonita e importante na luta pelos direitos dos povos indígenas em nosso país”
“O que parecia apenas mais um sonho, aos poucos vai se tornando realidade. Nós temos que continuar a luta dos nossos antepassados. Eles nos deixaram um testemunho de resistência, coragem e determinação. Se hoje estamos aqui é porque foi derramado muito sangue e sofrimento em nossas aldeias”, ressaltou um dos estudantes.
“Genocídio do conhecimento é Golpe”. Foto: Laila Menezes/Cimi
Novo raiar para o movimento indígena
Era difícil imaginar, quando há quatro décadas se iniciou, através das assembleias indígenas, um novo movimento indígena no Brasil. Hoje, prova-se que mesmo difícil de se conceber, o movimento de estudantes indígenas e quilombolas protagoniza um novo raiar para as lutas dos povos. Foi um momento revelador da vitalidade e potencialidade das lutas dos povos indígenas e quilombolas para não apenas evitar retrocessos como pretendem as elites no poder, mas para contribuir com a sabedoria milenar na construção de sistemas de Bem Viver para todos os brasileiros. Além da união dos povos, mobilização divulgou nota que anuncia as conquistas.
A experiência de passar horas em ritual na estrada, na entrada do Palácio do Planalto, na marcha até Advocacia Geral da União (AGU) contra o Parecer AntiDemarcação, de perceber o descaso e desdém com que os representantes do Estado tratam os povos indígenas, quilombolas e populações marginalizadas desse país, é uma experiência que cala fundo na alma e não se aprende nas universidades. Apesar dos muitos e grandes desafios que os povos indígenas e quilombolas têm pela frente, a manifestação foi de felicidade pela contribuição na causa dos povos.
“Temos orgulho de estar na luta. Ficarão sementes que farão crescer a nossa luta e nossa união”.
“Por uma educação específica e diferenciada para os povos indígenas e quilombolas”. Foto: Laila Menezes/Cimi
“Diante a conjuntura de golpes nas políticas de inclusão, dos ataques aos direitos indígenas e quilombolas arquitetados nos três poderes do Estado brasileiro, permaneceremos vigilantes contra toda política que tende a governar para os que são privilegiados há 518 anos e contra toda política social”. (Nota Pública – Permanência já! Movimento Nacional dos Estudantes Universitários Indígenas e Quilombolas).
O que ficam são as lições, certezas e desafios. A luta continuou na certeza de que os passos dado nesta semana foi muito importante, não apenas para terem condições objetivas de continuarem sua formação nas universidades, mas principalmente para que seus povos não percam direitos constitucionais, mas que tenham conquistas, unidos com os quilombolas e outras populações tradicionais. A luta vai continuar, com maior união, com a força dos encantados e dos que tombaram na resistência e luta pelos direitos.