Festa do Marmelo no Quilombo Mesquita: resgate da tradição marmeleira no Planalto Central
Desde o ano da graça de 2002, todo segundo domingo de janeiro tem Festa do Marmelo no Quilombo Mesquita, localizado na área rural do município de Cidade Ocidental, a cerca de 50 km da Esplanada dos Ministérios em Brasília.
Por Zezé Weiss
Já em sua 16ª edição, a festa, que começou como forma de a comunidade arrecadar dinheiro para a construção da igreja de sua padroeira, Nossa Senhora da Abadia, resgata a tradição da produção marmeleira no Planalto Central.
Segundo o historiador Jesus Benedito de Melo, do Instituto Cerratense, na comunidade do Quilombo Mesquita, reconhecido pelo governo federal como terra remanescente de Quilombo, vivem cerca de 300 famílias que cultivam, dentre outras culturas, cana de açúcar, laranja, goiaba e marmelo.

Foto: Jonas Banhos
Citando Liciane Carvalho, Melo informa que o marmelo foi trazido de Portugal, no século XVIII e chegou ao sertão do Goiás com os boiadeiros. “Além da tradição do cultivo, o marmelo representa fonte de recurso externo e sustentável da comunidade, preservando a herança cultural local, uma vez que boa parte dos moradores da comunidade são remanescentes de escravos do Quilombo do Mesquita, formado na época áurea da mineração no Arraial de Santa Luzia (hoje Luziânia), ao longo dos séculos XVIII e XIX”, registra o historiador.
Em 2018, a festa começa no sábado, dia 13 de janeiro, logo pela manhã, por volta de 8 horas, com a Grande Cavalgada do Marmelo, e termina no domingo, dia 14, com a tradicional Missa das 10 horas, seguida do também costumeiro almoço temperado a Leilão e a deliciosa sobremesa do Doce do Marmelo, a famosa Marmelada de Santa Luzia, produzida na comunidade.
MARMELADA DE SANTA LUZIA
Como se faz a Marmelada de Santa Luzia? Entre janeiro e fevereiro, as famílias quilombolas, descendentes de pessoas que foram escravizadas no Brasil colonial, colhem o marmelo Português (Cydonia oblonga Mill), plantado nos quintais.
Depois, durante todo o ano, com os frutos pré-cozidos e armazenados em latas, é feito o doce de marmelo, em boa parte ainda em tachos de cobre tradicionais, com uma receita passada de mãe e pai pra filho e filha, há várias gerações, em uma tradição que, segundo estudiosos, remonta ao surgimento do próprio Quilombo, entre os séculos 17 e 18.
As próprias famílias de agricultores e agricultoras do Quilombo que se dedicam à produção do doce são também as que produzem as charmosas caixinhas de madeira nas quais é vendida a Marmelada de Santa Luzia, no próprio Quilombo, na região e nos restaurantes de estrada no trajeto Brasília-Goiânia.
ANOTE AÍ:

No último domingo, cerca de 60 kg de marmelada foram distribuídas para os visitantes
Desde 2002, já é tradição a comunidade do Quilombo Mesquita, onde vive a quinta geração de remanescentes quilombolas, movimentar a Cidade Ocidental (GO), durante a colheita do Marmelo. Localizado a 50 km de Brasília, a comunidade com mais 270 anos, mantém o costume de seus ancestrais, assim como a produção do fruto e o doce feito dele. E, neste ano, cerca de 800 pessoas participaram da Festa do Marmelo na Igreja Nossa Senhora D’Abadia, padroeira do quilombo.
Herdada de pai para filho, é comum encontrar pés do fruto nos quintais da comunidade. Além disso, o doce feito no quilombo já chegou até na Itália, em 2012, pelas mãos do seu João Pereira, de 72 anos.
“Aqui, nós começamos bem jovens. Com 15 anos, eu já plantava e fazia o doce, aprendi com meu avô e com meu pai. Hoje, meus filhos, filhas, sobrinhos e netos, todos, têm um dedinho na produção da nossa marmelada. Só na nossa família já são 150 anos de história”, lembra o produtor.
Como tudo começou
A princípio, a 1ª edição da festa tinha o intuito de arrecadar dinheiro para a construção da igreja Nossa Senhora D’Abadia. Porém, eles mantiveram o costume e, atualmente, a festa acontece todo mês de janeiro, quando há a colheita do fruto.
Além disso, todo dinheiro arrecadado no evento com: o leilão, os doces e a comida é destinado para a capela. Segundo Célia, uma das organizadoras do evento e filha de seu João, produtor, a ideia é transformar a igreja em um santuário.
“É uma festa que fala da nossa cultura, do nosso povo, do nosso marmelo – que tem mais de 150 anos de tradição -. Ela trouxe muita visibilidade para o nosso quilombo. E deu tão certo que chegamos na 17ª edição”, orgulha-se.






