Educação fora do eixo em Goiás e no Brasil –
“Uma escola sem partido é uma escola sem senso crítico. É uma escola racista, é uma escola homofóbica. A escola sem partido é falar pra sociedade que querem formar um exército de não-pensantes, um exército que ouve e abaixa a cabeça, e nós não somos isso.”
Ana Júlia, 16 anos, estudante paranaense
Fora do Eixo. Por obra do governo temerário que se instalou no país desde maio de 2016, o sistema educacional brasileiro entrou em rota de colisão com seu próprio eixo. A cada dia, ações arbitrárias por parte dos detentores do poder acirram a guerra ideológica que vira a educação brasileira de ponta-cabeça.
Na defesa de uma “Escola sem Partido”, ignora-se a tradição democrática do diálogo e parte-se para a repressão. A sociedade reage, e apanha. Em Miracema, no Tocantins, 26 jovens foram presos e algemados na manhã do dia 27 de outubro por protestarem contra a MP 46, do Ensino Médio, e a PEC 241 (que vira PEC 55 no Senado), que congela os recursos da Educação por 20 anos.
Segundo a própria Polícia Militar (PM), a maioria dos presos de Miracema era menor de 18 anos e pelo menos um deles não havia completado os 15 anos de idade. Fotos dos jovens algemados correram mundo, sensibilizando corações e mentes. “Nem nos tempos da ditadura estudantes eram tratados assim”, reagiu o jornalista Élio Gaspari em mídia nacional.
GOIÁS: SINTEGO E ESTUDANTES VÃO ÀS RUAS
Em Goiás, a arbitrariedade se repete. No mesmo dia 27, em Anápolis, cinco estudantes foram presos dentro da Subsecretaria de Educação “por ameaça de protesto” contra a MP 746, a PEC 241(55) e a implantação das Organizações Sociais (OS) na rede estadual de ensino.
Juliane Ribeiro, estudante da Universidade Estadual de Anápolis (UEG) explica como se deu a prisão: “Fomos surpreendidos com a ação da PM que, ao chegar, perguntou o que fazíamos ali. Respondemos que faríamos uma manifestação e, sem mais nem menos, os policiais nos acusaram de ameaça de invasão e foram logo nos algemando”.
E a situação só piora: Matéria veiculada no site Ponte (replicada pelo Jornal GGN, do jornalista Luís Nassif), revela que o governo de Goiás espiona estudantes e professores. Mais: estudantes relataram que foram espancados por policiais militares.
Assim como a antiga Gestapo dos tempos da Alemanha nazista, em Goiás os diretores de escola atuam como espiões, informando à polícia os nomes de professores e estudantes envolvidos com movimentos de contestação.
Os estudantes, ao participarem de um protesto, são identificados e chamados para terem “uma conversa” com a direção de sua escola. “Olheiros” infiltrados pelo governo que participam de reuniões em sindicatos e movimentos sociais para informar aos seus superiores tudo o que é falado ali.
De acordo com a matéria, um grupo no Whatsapp, formado por aproximadamente 20 servidores do governo goiano, busca neutralizar os movimentos de resistência de professores e alunos contrários ao projeto do governo Perillo de terceirização da gestão escolar através das OSs.
“Num trocadilho com as letras das OSs, o grupo de Whatsapp se chama SOS Escolas. Entre seus membros, estão a secretária de Educação, Raquel Teixeira, e o comandante geral da PM goiana, Coronel Divino Alves de Oliveira”, relata a matéria.
Ante veementes protestos dos professores e da direção do Sintego durante toda a tarde, ao final do dia os alunos foram liberados. Inconformado, o professor José Natal, presidente da Regional do Sintego em Anápolis classificou as prisões de arbitrárias e indevidas: “Sequer houve protesto. Os estudantes foram presos para averiguação. Isso só acontecia na época da ditadura”.
Em defesa dos estudantes, das liberdades democráticas e da educação pública, o Sintego foi às ruas. Em manifestação no centro de Anápolis, professores, estudantes e dirigentes do Sintego distribuíram panfletos informando a população sobre os desmandos do governo do Estado, o desmanche do Ensino Médio e os riscos da PEC 241 para o futuro da educação pública em Goiás e no Brasil.
Solidário com os estudantes goianos, que ocupam várias outras escolas no Estado, o Sintego se posiciona firmemente contra as prisões ilegais de estudantes; e também contra o descumprimento da Lei do Piso, que é federal; o não pagamento do Piso para os professores e da Data Base para os administrativos; e pela ameaça do repasse dos recursos da Educação para as OS, em um claro processo de privatização do ensino público.
ESCOLA “COM PARTIDO”, ENSINO PRIVADO
Em Goiás, a “Escola sem Partido” se traduz em contratos de gestão com a iniciativa privada, conforme denúncia do site do Jornal Folha Z, segundo o qual o governo Perillo, por meio das OSs, está implantando uma “escola com partido” no sistema educacional goiano.
Em matéria recente, o Folha Z informa que José Roldão Gonçalves Barbosa, proprietário da Associação Grupo Tático de Resgate (GTR), a OS selecionada para a gestão de 23 escolas estaduais em Anápolis, é filiado ao PSDB, partido do governador Marconi Perillo.
Segundo o Folha Z, a filiação Roldão ao PSDB, que é presidente da Federação das Santas Casas e Entidades Filantrópicas de Goiás (Femigo), conflita com o Edital de Chamamento das OSs: “os membros da Comissão de Seleção, além de não remunerados, não poderão possuir qualquer vínculo com os proponentes (parceiros privados) participantes da seleção”. O Sintego impetrou ação junto ao Ministério Público de Goiás (MP-GO) questionando a probidade do GTR.
Para Bia de Lima, presidenta do Sintego, a situação se agrava pela suspeita de que o programa de privatização do ensino público via OSs pode estar relacionado com os desvios de verbas da Saneago para o financiamento de campanhas tucanas no estado, conforme dados da Operação Decantação, da Polícia Federal. Segundo a Polícia Federal, parte dos recursos desviados foram repassados às OSs da Saúde, que administram os hospitais públicos em Goiás.
O Folha Z registra que a prisão de Afreni Gonçalves, presidente do PSDB, e de José Taveira, presidente da Saneago, em agosto de 2016 desmascarou o esquema de corrupção que vincula as OSs como canal de repasse dos recursos da educação para o financiamento de campanhas eleitorais tucanas no Estado.
Segundo a PF, recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de financiamentos do BNDES e da Caixa Econômica Federal foram desviados para o pagamento de propinas e dívidas das campanhas políticas do partido em Goiás. Em 2015, o governo goiano pagou às OSs da Saúde cerca de R$ 660 milhões. Por outro lado, o TCE-GO apurou que apenas 51% do que o Estado pagou às OSs foram usados para pagamento de salários de funcionários e diretores.
“Essa é uma realidade que precisa ser mudada, que não pode ser aceita de maneira nenhuma. Por isso, o Sintego foi às ruas com os estudantes no final de outubro. No dia 26 apoiamos e participamos do fechamento de três rodovias federais em nosso Estado: O trecho urbano da BR-153, na entrada de Anápolis, a BR-364 em Jataí, e a BR-050 em Catalão. Professores, estudantes e sindicalistas nos juntamos para lutar contra a MP 746, a PEC 241, o não pagamento do Piso e da Data Base e a instalação da “Escola sem Partido” por meio das OSs na rede pública de ensino do Estado”, explicou Bia.
Bia ressaltou ainda que “a sociedade não está sendo ouvida e a única forma de tornar pública a pauta da Educação é protestando. A aprovação da PEC 241 não vai apenas limitar os gastos com educação e saúde, vai trazer um retrocesso, contribuindo assim para a queda na qualidade do ensino”, completou a presidenta do Sintego.
Fotos: Acervo Sintego