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Juninho da cocada

Juninho da Cocada já não vive mais

Juninho da Cocada já não vive mais. É para isso que serve a polícia?  

O fato é: Vitor da Silva Santos, uma criança de 11 anos, não mais ouvirá o chamarem “ô Juninho”. Não mais venderá cocada alguma, não mais entrará numa sala de aula, não mais poderá sorrir, brincar e sonhar…

Por Paulo Victor Melo/Revista Fórum

Grampearam o menino do corpo fechado e barbarizaram com mais de cem tiros. Treze anos de vida sem misericórdia e a misericórdia no último tiro. Morreu como um cachorro e gritou feito um porco, depois de pular igual a macaco. Vou jogar nesses três que nem ele morreu: num jogo cercado pelos sete lados.

Desde o final da tarde de ontem (25), quando tomei conhecimento do assassinato de Juninho da Cocada, que esses versos da música Tiro de Misericórdia, escrita em 1977 por Aldir Blanc e João Bosco, não me sai da cabeça.
 
 
Não foram cem tiros como na música de Aldir e João. Mas qual a diferença entre um, dois, trinta, oitenta ou cem tiros quando a vítima é um menino negro, de 11 anos, estudante e que tão cedo precisava destinar algumas horas para algo que deveria ser exclusivo de adultos (trabalhar)?

Para a Polícia Militar de Sergipe, que realizava mais uma das famigeradas “ações de combate ao tráfico de drogas”, Juninho da Cocada foi apenas mais um alvo que, como na música, morreu num jogo cercado pelos sete lados.

Já a Polícia Civil apressou-se em dizer que Juninho era usuário de drogas, era traficante e que, no momento da sua misericórdia, estava com dois conhecidos traficantes. A Nota Pública, vale frisar, é toda baseada em relatos “de populares” (está escrito assim) e da mãe biológica da vítima.

Na mesma nota, a Polícia Civil diz que “um inquérito policial foi instaurado para apurar a ocorrência”. Ou seja, antes mesmo da apuração, a Polícia Civil já jogou para o público a versão de que Juninho era usuário, era traficante e que estava na companhia de dois traficantes adultos.

Quem acompanha com uma lupa minimamente crítica as notícias sobre ações de “combate às drogas” sabe que essa é uma narrativa comum dos órgãos de segurança pública, expressando que o que acontece entre nós é o combate à pobreza, o combate a corpos negros, sejam corpos adultos ou de crianças, como no caso do menino de Canindé do São Francisco, sertão sergipano.

“Mataram um menino trabalhador, vendedor de cocada. Ele estava na esquina e correu quando viu a viatura com medo de ficar no lugar, pois eles chegam com muita violência, não respeitam nem crianças nem ninguém”. Esquina… correu… Como ler as palavras ditas por Betânia Galdino, mãe de criação de Juninho da Cocada, em entrevista a uma rádio de Aracaju, e não lembrar da música de Aldir Blanc e João Bosco?

O que dirá a Polícia Civil sobre a declaração da mãe biológica de Juninho? O que dirá a Polícia Militar de Sergipe à sociedade?

Esses órgãos que são financiados com o nosso dinheiro seguirão tentando justificar uma ação de tamanha perversidade afirmando que Juninho era traficante de drogas?

Essas instituições que integram um Estado que deveria existir para cuidar e não matar crianças seguirão sustentando uma versão de que a Juninho, uma criança de 11 anos, não cabia outro destino?

O fato é: Vitor da Silva Santos, uma criança de 11 anos, não mais ouvirá te chamarem “ô Juninho”. Não mais venderá nenhuma cocada, não mais entrará numa sala de aula, não mais poderá sorrir, brincar e sonhar.

Há poucos dias, Aracaju acordou com a brutalidade policial de uma operação de reintegração de posse que destruiu uma cozinha coletiva e uma biblioteca comunitária, que retirou 70 pessoas do único que teto que encontraram para se abrigar e que prendeu sete pessoas que apenas lutavam pelo direito a uma moradia digna.

Agora, na mesma semana, numa cidade distante menos de 200 km da capital, uma criança de 11 anos é vítima de dois assassinatos, o provocado pelas balas e o provocado pelas palavras de um Estado que, cada vez mais, revela o seu caráter fascista.

Paulo Victor Melo, jornalista. 

Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum, nem da Revista Xapuri.

Fonte: revistaforum


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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