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López Obrador do México: Um sopro de esperança

López Obrador do México: uma bomba de oxigênio para o povo brasileiro e latino-americano

Era hora que surgisse um López Obrador, novo presidente do México, carregando nos seus discursos de posse uma bomba de oxigênio para reativar o ânimo do desesperançado brasileiro e das forças políticas progressistas e da esquerda latino-americana.

Por Helena Iono
Este momento traz à memória o dirigente teórico J. Posadas, argentino, seguidor de Trotsky, que trazia à luz a vigência do processo desigual e combinado na América Latina e dava destaque à revolução interrompida dentro da revolução permanente no México. Eis que, enquanto um Bolsonaro no Brasil, com bravatas típicas de um nazi-neoliberalismo (fase terminal do imperialismo) trata de amedrontar o mundo, um Obrador mexicano faz renascer a chama do passado, desde Pancho Villa e Zapata, até Benito Juarez e Cárdenas, resgatando publicamente os próceres da história continental para  agendar um projeto de país, de 100 pontos, a fim de romper com 36 anos de destruição neoliberal e abrir uma nova era no México; apesar do diplomático “respeito” pelo presidente anterior, López Obrador veio decidido a mudar radicalmente o regime econômico e social do México e liberá-lo do jugo das transnacionais.
Do Brasil à Argentina, onde urge recuperar, com sabedoria e suor, a “década ganhada” dos governos progressistas anteriores, é preciso ter presente e acompanhar, desde já, a experiência de López Obrador junto ao povo mexicano.  O México estabelece agora uma pauta exemplar de medidas de governo essenciais para dar sustento econômico, social e político a um poder popular, apesar da previsível e enorme oposição do capital financeiro e das oligarquias; será um estímulo, uma oxigenação para a reorganização da esquerda no Brasil. O impulso do México, chegará pelos vasos comunicantes ao Brasil, encurtando os prazos do neofascismo liberal.
O terremoto, com epicentro na Cidade de México já começou. Três dos 100 abalos vibraram a praça do Zócalo com uma multidão de ovacionando Obrador ao dizer: “vamos recuperar o petróleo como fez o general Cárdenas!”, “acabar com a pensão dos ex-presidentes”, e “investigar até encontrar os responsáveis do desaparecimento dos 43 estudantes de Ayotzinapa!”. Veja o discurso com os 100 pontos de governo na praza do Zócalo.
É bom destacar uma das questões remarcadas nos discursos, além dos 100 pontos de caráter sócio-econômico, concretos e emergenciais  (fim do desemprego juvenil, salário nunca inferior à inflação, pensão garantida aos anciãos e deficientes físicos, saúde e remédios gratuitos, investimento em obras públicas e transporte ferroviário, etc…) que é a à . O tema corrupção é inerente a um país, onde o maior responsável pela sua causa é a estrutura mafiosa gerada por interesses econômicos poderosos com tentáculos no exterior. Atacar a corrupção no México é combater globalmente o regime econômico-social privatizante e neo-liberal vigente; e a isso se propõe Obrador. O sentido do seu ataque à corrupção não é o mesmo utilizado pelo “lawfare” golpista que tem um sentido único, ou seja,  de criminalização da esquerda, do PT e do kirchnerismo.
Por isso, Obrador sinaliza a corrupção de altas esferas do poder (militares, juízes, ministério público) que apoiadas no neoliberalismo econômico decenal, que engendraram um mecanismo social viciado, onde a propina e o contrabando passaram a ser normais nas ruas e nas fronteiras do país. Algo similar ao que o governo Maduro da Venezuela trata de combater: os contrabandistas de fronteira e sabotadores dos produtos alimentares do Estado no comércio, apoiados pela máfia contrarrevolucionária.
Outro tema tocado: o da insegurança e violência. Não se trata de uma simples bandeira eleitoral como a agitada por governos reacionários da Argentina, ou do Brasil que enchem as ruas de policiais, compram armas dos EUA e de Israel para reprimir movimentos sociais opositores, assegurar ajustes do FMI e, então, blindar uma inteira cidade de com 22 mil agentes de proteção à reunião do G-20; não se trata da legalização do uso indiscriminado de armas, criando leis como a última (a do “gatilho fácil) da Ministra de Segurança da Argentina que justifica o tiro pelas costas a um ladrão de bairro, garantindo a impunidade para os  policiais; não se trata de criar o meio de cultura do terror, do medo e da suposta luta contra a violência para justificar o “voto da bala”.
López Obrador toma de frente o problema da insegurança que é real, mas para dar uma solução de fundo, combatendo a degradação das condições de vida e o desemprego que assola o povo mexicano. É vítima da violência uma inteira sociedade, desde pobres à classe média. Por isso, a direita vence eleitoralmente no Brasil, incluindo o voto da classe média aterrorizada com a violência (mais de 100 mil vítimas em um ano). Tem sido uma falha das esquerdas não assumir essa pauta. Obrador, presidente e grande comunicador social, está disposto a ouvir a voz do povo e encarar problemas imediatos que o afligem, como este, atacando a raiz dos problemas, o regime de poder econômico-político das corporações. E com armas da reorganização da Forças Armadas junto ao povo.
A reformulação das Forças Armadas e a criação de uma Guarda Nacional, baseando-se numa reforma constitucional é transcendental. Obrador faz um chamado a que o Exército e a Marinha façam parte, ao lado das Polícias (Federal, Ministerial, Estadual e Municipal) de uma nova Guarda Nacional que atue na segurança pública; resgata a confiança no papel do Exército, composto por camponeses e gente humilde em todo o território, na defesa da soberania nacional e popular; convoca-os a serem soldados do povo, abrindo o caminho para uma união cívico-militar contra o neo-liberalismo, neste México onde o general Cárdenas deixou um legado nacionalista.
O discurso às Forças Armadas que, mais que um discurso, é um diálogo com os servidores da pátria para ganhá-los a uma missão nobre, humanitária, de defesa pública e não para a guerra e a repressão do povo.  Essencial é ganhar o exército para opor-se às forças políticas das elites desconformes com o projeto popular e que podem tentar uma via antidemocrática e golpista.
A capacidade do diálogo direto com o povo indica ser uma qualidade essencial de Obrador; o que tem faltado a algumas gestões progressistas (além do descuido na conquista de meios públicos e comunitários de comunicação). A promessa de prestar contas ao povo, diariamente (via meios de comunicação e em primeira pessoa) sobre as ações e conquistas governamentais, dá maiores esperanças de que o México terá um exemplar governo do povo e para o povo.
O México inicia uma nova era para toda a América Latina, preenchendo as lacunas que deixa o Brasil com o governo de Bolsonaro, abrindo as portas aos médicos cubanos, e reforçando o BRICs junto aos russos e chineses. E o México não ficará só: a Rússia de Putin já avisou que não permitirá a intervenção militar na Venezuela.
Os discursos de Obrador aparecem no cenário histórico, uma semana depois, como um encerramento de chave de ouro do I Fórum Internacional do Pensamento Crítico da Clacso en Buenos Aires (19/23 novembro). O México abriu a porta das conclusões práticas do que fazer – após reflexões e o balanço autocrítico sobre o fracasso das esquerdas diante do avanço da direita na América Latina.
I Fórum Internacional da Clacso
O Fórum da Clacso, ao reunir milhares de acadêmicos intelectuais e líderes políticos da esquerda latino-americana e europeia, congregou (como tantos outros Encontros internacionais) experiências mundiais, além do debate de formação política de milhares de quadros dos partidos de esquerda e movimentos sociais, essencial nos tempos que correm. Não faltando faixas e cartazes por “Lula Livre” que deram o tom maior do Fórum, contou com uma das conferencistas mais esperadas, a ex-presidenta Cristina Kirchner, ao lado de Dilma Rousseff, Boulos e Manuela do Brasil.
Cristina Kirchner numa explanação de enorme estatura de uma dirigente política chamou a refletir sobre a superação de velhas instituições de poder (Legislativo, Executivo e ), criadas na revolução francesa, que não respondem às necessidades de poder popular dos nossos tempos. Vários líderes políticos como Garcia Linera (vice-presidente da Bolívia), Juan Carlos Monedero (intelectual espanhol) e Juan Grabois (dirigente da CTEP da Argentina, e amigo do Papa Francisco), analisam e chamam a conformar esse novo poder, sem o qual não há chances de controlar governos progressistas ou revolucionários para que avancem e não retrocedam.
Os debates não descartaram à tática das alianças políticas, mas reforçaram a necessidade de independência dos movimentos populares com projetos e organização próprios. Cristina apela à não segregação  e estigmatizações de esquerda contra a direita; algo que gerou polêmica, mas deu-se a entender que não se refere tanto às lideranças e partidos políticos, mas à base social, ao povo que não foi resgatado do campo da direita (dos anti-abortistas, dos anti-corrupção, dos apartidários, e apolíticos) que estão nos bairros, sem referencia organizativa da esquerda, envenenados pela igreja evangélica, pelos fake-news e mídia hegemônica (como ocorreu no Brasil), que não deixam de ser vítimas de um sistema nefasto, neoliberal e individualista.
A esquerda não soube ganhar essa base; resta-lhe o desafio de estigmatizar menos e conscientizar mais. Tarefa árdua que Lula da Silva realizou nas últimas caravanas pelo país.  Como reiterado por alguns, não se deve desprezar o papel do Partido no controle dos governos progressistas. Mas, ao mesmo tempo é preciso construir um Partido-Movimento. Sem movimento o Partido morre. Por isso, o México com Obrador sinaliza uma esperança para o Brasil, se o seu clamor por uma participativa do povo, superar a democracia representativa e parlamentar para garantir o cumprimento dos 100 pontos e reconstruir um novo México livre e soberano.
Fonte: Pátria Latina


 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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