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Manoel de Barros: Sou fuga para flauta e pedra doce

Manoel de Barros: Sou fuga para flauta e pedra doce

Manoel de Barros: Sou fuga para flauta e pedra doce.

Me abandonaram sobre as pedras infinitamente nu,
e meu canto.
Meu canto reboja.
Não tem margens a palavra.
é nuvem neste invento.
Minha voz é úmida como restos de comida.
A hera veste meus princípios e meus óculos.
Só sei por emanações por aderência por incrustações.
O que sou de parede os caramujos sagram.
A uma pedrada de mim é o limbo.
Nos monturos do os urubus me farreiam.
Estrela é que é meu penacho!
Sou fuga para flauta e pedra doce.
A me desbrava.
Com águas me alinhavo.

__ , no livro “Arranjos para assobio” (1980)

ANOTE AÍ:

MANOEL DE BARROS 

Poeta pantaneiro nascido em 1916. Teve o bioma por grande tema. Definiu sua arte como vanguarda primitiva. Encantou-se em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, em 13 de novembro de 2014, aos 97 anos de idade.

barros-elfikurten-com-brfoto: elfikurten.com.br

SOBRE A TERRA PANTANEIRA DE MANOEL DE BARROS

O Pantanal é a maior área alagadiça de água doce do .

Seus  176,2 km2 da planície pantaneira são inundados pelos afluentes do Rio Paraguai e servem de habitat para 650 espécies de aves (colhereiros, garças, tuiuiús).

No Pantanal vivem 80 espécies de mamíferos (ariranhas, macacos, onças, etc.), 260 tipos de peixes (dourado, piauçu, piraputanga) e 50 espécies de répteis (jacaré, tartaruga, sucuri).

As terras pantaneiras fazem parte do Pantanal, bioma com 250 km2, situado no sul de Mato Grosso, do Mato Groso do Sul, norte do Paraguai e leste da Bolívia.

Manoel de Barros: Sou fuga para flauta e pedra docefoto: pantanalecoturismo.tur.br


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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