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Memória de uma infância na floresta: “Minha mãe me ensinou a ler e fazer contas nas noites sob a luz da lamparina”

Memória de uma infância na floresta: “Minha mãe me ensinou a ler e fazer contas nas noites sob a luz da lamparina” –

Por:  Pedro César Batista

Vivi até os 7 anos em uma casa de taipa, dentro da floresta, distante mais de 20 km da cidade mais próxima.

Minha mãe me ensinou a ler e fazer contas nas noites sob a luz da lamparina. A maior alegria era quando meu pai trazia refrigerante grapette ou guaraná garoto.

Nosso fogão era a lenha, onde se assava pacas, tatus, viados e cotias. Sempre estava em brasa. No pequeno riacho, com suas límpidas águas, recebíamos da natureza a garantia de ter água para beber ou banhar.

Ali passava boa parte do tempo pescando lambaris, quando não estava correndo atrás de bichos, brincando com meu carneiro ou subindo em árvores, saboreando cajus de todos os tipos, cores e cheiros.

Na noite, adorava contar estrelas, vê-las caindo no infinito. O tempo passou. O mundo novo chegou, em todos os lados há eletricidade e crianças convivendo com celulares e luzes artificiais. Criança sempre acreditei em Matinta Pereira e Curupira, minha diversão era garantida ao ouvir estórias nas noites enluaradas.

Agora resta a desilusão, com tantas mentiras se tornando verdades para crianças e adultos. Com minha mãe, meu pai e meu irmão vivemos um bom tempo na floresta, que deixou seus cheiros e sons marcados em minha alma, sempre me fazendo recordar os roncos da onça, o barulho da ventania, o som das árvores cantando na madrugada e o inconfundível perfume de terra molhada nas manhãs.

A imagem pode conter: 1 pessoa, atividades ao ar livre
ANOTE AÍ:
Este belíssimo relato sobre os primeiros anos de vida vivida na floresta é do jornalista, escritor e poeta Pedro Cesar Batista. Nós o encontramos na página do jornalista no Facebook:  Pedro César Batista As fotos são do acervo pessoal de Pedro César Batista, também extraídas de sua página no Facebook.

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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