Miçangas

Miçangas

Por Carlos Castelo/Brasil 247

Chios

O marido não roncava, grunhia. Ela tentou protetor auditivo, não funcionou. Fone de ouvido, nada. Uma madrugada, em desespero, calafetou os ouvidos com cera quente. Os guinchos seguiam impedindo-a de dormir. Divorciaram-se. Agora, sofre de insônia por excesso de silêncio.

Protesto
Posso ser um extinto, tudo bem. Todas as metodologias científicas apontam que os dinossauros não existem mais. Posso não ter direito a um presente, nem a um . Mas ao passado, ah, a esse tenho direito, sim. Portanto, dizerem que eu não estava lá quando, sei lá quem, acordou – é correto? É justo? Não, não é. Ninguém pode roubar o de ninguém. Posso estar soterrado, mesmo assim, não vou permitir que cuspam na minha cronologia. Eu estava lá, sim. Quem disse que não atire a primeira rocha! Dinossauro, presente!

Tenho 50 toques para contar uma atroz. Um dia em…
Ginástica

 
– …você pega esse seu braço e encosta no outro braço. Isso. Agora faz o mesmo com as pernas. Encosta uma na outra. Ok. Então pega a outra perna e cruza sobre elas. Não! A outra perna . É. Por último: desencosta os dois braços e, com os outros dois, se dá um abraço bem gostoso. Aí!

Lágrimas
– Não aguento mais esse nhem-nhem-nhem. Vai ou não vai?
– Calma, você sabe que é sempre assim.
– Devo estar cansado do ofício…
– Olha lá! Parece que agora vai. Ele gritou.
– Sei não, ela parece mais assustada do que…
– Não! Ele esmurrou a mesa. Tá enchendo de secreção!
– Xinga ela, xinga logo!
– Xingou! Vai transbordar, anda, salta!
– Aaaaaahh!
Labirinto
– Morreu do quê?
– Cana.
– Nunca vi beber.
– Perdeu-se no canavial. Quando acharam, urubu já estava pinicando.
Última Tentativa
– Acabou.
– Se eu disser uma coisa, você muda de ideia?
– O quê?
– Falei que meu nome era Jandir. Na verdade, é Josafá.
– O que muda?
– Você acabou com o Jandir, não com o Josafá.
Fórum
– …a senhora então bateu com um castiçal na nuca de seu marido?
– Foi, seu juiz.
– Por alguma razão?
– Ele trabalha em telemarketing, doutor. Passa o dia inteiro me telefonando. Me lembra de pagar conta, de aniversário de parente distante, de pegar menino na , até de que vai chover. É de enlouquecer!
– Absolvida.
Código
Ao ficarem nus, estranhou. Impresso em cima do sexo havia um QR Code.

Este artigo não representa a opinião da e é de responsabilidade do colunista.
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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