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Nas ruas, estudantes e professores cobram revogação

Nas ruas, estudantes e professores cobram revogação do atual modelo do ensino médio

Herança de Temer, novo ensino médio fragiliza educação brasileira, afirmam entidades

Por Mídia Ninja

Professores e alunos fizeram, no final da tarde desta quarta-feira (22), uma manifestação na capital paulista contra a atual política do ensino médio, implementada pela Lei 13.415, de 2017, conhecida como o novo ensino médio. O ato ocorreu em frente ao Museu de de (Masp), na Avenida Paulista. Todas as faixas de trânsito de veículos no local foram ocupadas pelos manifestantes.

“A nossa pauta é, sobretudo, pela revogação da farsa do novo ensino médio. Porque entendemos que, na prática, ela significou a fragmentação das disciplinas que são componentes curriculares que nos dão a formação geral, que dão uma sólida formação básica”, destacou a presidente da Apeoesp, Izabel Azevedo Noronha, a Bebel.

“Na verdade, esse novo ensino médio diz o seguinte: você estudante, você estuda o que você gosta. Se você gostar disso, então você escolha isso aqui para estudar. Mas a vida não é assim. A vida é feita de desafios e um grande desafio é ter esta formação geral”, acrescentou em entrevista para a Agência Brasil.

Para ela, os adolescentes, muitas vezes, não têm ainda a capacidade de escolher as disciplinas apropriadas que devem ou não estudar. “Eles, de certo modo, vão ser influenciados para escolher aquilo que o capital quer que eles escolham. A gente sabe que o jovem de 15, 16 ou 17 anos, muitas vezes, não tem ainda formação para fazer a sua escolha de forma adequada”.

A estudante Luiza Martins, da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes), disse que o novo ensino médio faz a qualidade da formação escolar diminuir e não proporciona uma formação completa aos alunos.

“A gente quer brigar pela revogação imediata do novo ensino médio. Ele acaba com o nosso sonho de ingressar na universidade, acaba com a nossa perspectiva de uma escola de qualidade, que nos ofereça uma formação completa como ser humano. Dentro da escola que a gente aprende a revolucionar nossa sociedade”, disse.

A manifestação também reivindicou a implementação do piso nacional dos professores em São Paulo; a revogação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC); e o cumprimento das aulas de trabalho pedagógico em local livre escolha.

O ato foi organizado pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) e contou com a participação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo (Sinpeem), da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (UPES), e da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES). Estiveram presentes ainda deputados do PT e do Psol.

O novo ensino médio

A atual política do ensino médio foi aprovada em 2017, no governo de Michel Temer, com o objetivo de tornar a etapa “mais atrativa”, implantar o ensino integral e evitar que os estudantes abandonem os estudos. Com o modelo, parte das aulas deverá ser comum a todos os estudantes do país, direcionada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Na outra parte da formação, os próprios alunos poderão escolher as disciplinas para aprofundar o aprendizado.

Na semana passada, o ministro da Educação, Camilo Santana, reconheceu que o novo ensino médio precisa ser corrigido. “Já identificamos que há necessidade de correções, necessidade de um bom debate. Porém, acho que é do processo democrático, até porque o ensino médio já está em andamento na sua implementação, [acho que] é importante ouvir as entidades, os especialistas da área, os estudantes, professores, para que a gente possa, com muita responsabilidade, tomar decisões. Nosso grande objetivo é garantir qualidade, um bom ensino médio para os estudantes jovens do Brasil”, disse.

Por que é preciso revogar o novo ensino médio?

Em sua coluna na Mídia NINJA, Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, listou 10 motivos que justificam a revogação do modelo atual. Os motivos fazem parte de uma carta aberta em defesa da revogação da reforma do ensino médio.

Esta carta conta hoje com o apoio de mais de 300 entidades do campo educacional, com representação de todo o país de professores, trabalhadores da educação, estudantes, pesquisadores, orientadores educacionais, dirigentes, conselheiros, entre outros.

10 motivos contra o modelo atual do novo ensino médio:

1) Fragiliza o conceito de Ensino Médio como parte da educação básica, assegurado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), na medida em que esta etapa deixa de ser uma formação geral para todos. A incorporação do Ensino Médio na educação básica foi uma conquista recente do processo de democratização, e ainda não consolidada. Diante de um ensino secundário historicamente elitista, estratificado e propedêutico, a integração do Ensino Médio à educação básica foi uma medida importante para democratizar esta etapa, juntamente com a garantia de oferta de ensino noturno adequado às condições dos estudantes trabalhadores e da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) – ambos negligenciados pela Lei 13.415/2017;

2) Amplia a adoção do modelo de Ensino Médio em Integral sem assegurar suficientes para garantir condições de acesso e permanência dos estudantes, excluindo das escolas de jornada ampliada estudantes trabalhadores e aqueles de nível socioeconômico mais baixo, bem como estimulando o fechamento de classes do período noturno e da EJA;

3) Induz jovens de escolas públicas a cursarem itinerários de qualificação profissional de baixa complexidade e ofertados de maneira precária em escolas sem infraestrutura. Evidência disso é o de Lei 6.494/2019 que tramita na Câmara dos Deputados e visa alterar a LDB, propondo o aproveitamento “das horas de trabalho em aprendizagem para efeitos de integralização da carga horária do Ensino Médio até o limite de 200 horas por ano”. Mais uma vez, o que se propõe é a interdição do acesso qualificado ao conhecimento científico, à arte, ao pensamento crítico e reflexivo para a imensa maioria dos jovens que estudam nas escolas públicas, e que respondem por mais de 80% das matrículas do Ensino Médio no país;

4) Coloca em risco o modelo de Ensino Médio público mais bem-sucedido e democrático do país: o Ensino Médio Integrado praticado pelos Institutos Federais de Educação, e . Trata-se de um modelo que adota cotas sociais e raciais de ingresso desde 2012 e que apresenta resultados excelentes em avaliações de larga escala como o PISA. Seu centro organizador é a integração entre uma Formação Geral Básica fundada nos princípios do trabalho, ciência, cultura e tecnologia e a Educação Profissional de Nível Técnico. A Lei 13.415/2017 rebaixa a educação profissional à condição de “itinerário formativo”, dissociando a formação geral básica da educação profissional;

5) Aumenta consideravelmente o número de componentes curriculares e acentua a fragmentação. Uma das justificativas para a Reforma do Ensino Médio era justamente a necessidade de diminuir o número de disciplinas escolares obrigatórias. Contudo, a implementação da Reforma nos estados vem realizando exatamente o contrário. Embora existam variações entre as redes estaduais, no estado de São Paulo – a título de exemplo – o 2º ano do Ensino Médio em 2022 possui 20 componentes curriculares;

6) Desregulamenta a profissão docente, o que se apresenta de duas formas: 1) construção de itinerários formativos que objetivam a aquisição de competências instrumentais, desmontando a construção dos conhecimentos e métodos científicos que caracterizam as disciplinas escolares em que foram formados os docentes, desenraizando a formação da atuação profissional; e 2) oferta das disciplinas da educação profissional por pessoas sem formação docente e contratadas precariamente para lidar com jovens em ambiente escolar. Tudo isso fere a construção de uma formação ampla e articulada aos diversos aspectos que envolvem a docência – ensino, aprendizagem, pedagógico, gestão democrática e diálogo com a comunidade;

7) Amplia e acentua o processo de desescolarização no país, terceirizando partes da formação escolar para agentes exógenos ao sistema educacional (empresas, institutos empresariais, organizações sociais, associações e indivíduos sem qualificação profissional para atividades letivas). Uma das dimensões desse problema é a possibilidade de ofertar tanto a formação geral quanto a formação profissionalizante do Ensino Médio a distância, o que transfere a responsabilidade do Estado de garantir a oferta de educação pública para agentes do mercado, com efeitos potencialmente catastróficos para a oferta educacional num país com desigualdades sociais já tão acentuadas;

8) Compromete a qualidade do ensino público por meio da oferta massiva de Educação a Distância (EaD). A experiência com o ensino remoto emergencial durante a pandemia da Covid-19 demonstrou a imensa exclusão digital da maioria da população brasileira, que impediu milhões de estudantes das escolas públicas de acessarem plataformas digitais e ambientes virtuais de aprendizagem. As mesmas ferramentas utilizadas durante a pandemia estão agora sendo empregadas pelos estados na oferta regular do Ensino Médio, precarizando ainda mais as condições de escolarização dos estudantes mais pobres;

9) Segmenta e aprofunda as desigualdades educacionais – e, por extensão, as desigualdades sociais –, ao instituir uma diversificação curricular por meio de itinerários formativos que privam estudantes do acesso a conhecimentos básicos necessários à sua formação, conforme atestam pesquisas comparadas que analisaram sistemas de ensino de vários países; e

10) Delega aos sistemas de ensino as formas e até a opção pelo cumprimento dos objetivos, tornando ainda mais distante a consolidação de um Sistema Nacional de Educação, como preconiza o 2014-2024 (Lei 13.005/2014).

“Diante das evidências – empíricas e científicas –, não há como defender esta reforma. Ainda, ela é equivocada em sua base – como já mostramos – e em sua origem e forma de elaboração: criada em institutos e fundações de cunho empresarial, descoladas completamente da comunidade educacional, e por meio de uma medida provisória, mecanismo verticalizado. Não há, portanto, remendo que solucione o tamanho do problema”, conclui Andressa Pellanda.

Fonte: Mídia Ninja. Foto de capa: Fernando Frazão/Agência Brasil. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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